Capítulo 24

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Kyle entrou pelas portas abertas da prisão e deu seu primeiro passo para o mundo exterior, assim

que as portas e fecharam logo atrás dele. Elas tinham se fechado com muita força, Kyle percebeu, como

se quisessem mesmo se livrar dele, tirar-lhe a alegria. Era o último insulto daquela instituição impiedosa,

daqueles guardas sádicos, que tinham feito de tudo para maltratá-lo ao longo dos últimos cinco anos.

Mas ele não ia deixar que nada o incomodasse agora. Agora, pela primeira vez desde que ele podia se

lembrar, ele estava do outro lado daqueles portões, do outro lado da torre de arame farpado. Agora, pela

primeira vez, ele não tinha que responder àqueles cretinos. Ele era um homem livre. Livre. Mal podia

acreditar.

Kyle sorria de orelha a orelha, respirando o ar fresco de outubro, saboreando como era a sensação

de estar do lado de fora. Era incrível não ter que ouvir seus companheiros presos gritando e gritando,

reverberando ao seu redor, o tempo todo. Não tem que temer por sua vida. E acima de tudo, pensou,

quando ele se virou lentamente e olhou para os guardas atrás dele, não tem que dar satisfação a

ninguém. Muito menos aqueles porcos.

Kyle abriu um largo sorriso ao levantar lentamente seu dedo médio direito para o guarda de pé, a

poucos metros dele, perto do portão.

No passado, este guarda teria tomado sua batuta e espancado Kyle e jogado-o na solitária. Mas

agora, não havia nada que o guarda pudesse fazer. Agora Kyle era um homem livre, um cidadão íntegro,

assim como qualquer outra pessoa.

Bem, talvez não tão íntegro. Mas, novamente, Kyle nunca fora. Desde jovem, ele tinha prazer em

torturar pequenos animais, em judiar de seus colegas de classe, em bater em pessoas mais jovens do que

ele. Era tudo devido, os psiquiatras diziam, ao seu pai abusivo, que havia espancado Kyle tão forte e por

tanto tempo que, um dia, quando Kyle finalmente crescera e estava grande e forte o suficiente, ele

espancara seu pai de volta. Esse foi o dia em que seu pai partiu – e ele nunca mais o vira de novo.

Mas a essa altura, o estrago já estava feito. Kyle tinha 16 anos, já era enorme para um menino de seu

tamanho, quase dois metros de altura, com ombros tão amplos como um tronco de árvore, e forte o

suficiente para bater em seu de um metro e oitenta sem dó. Depois daquele momento, Kyle nunca mais

olhou para trás. Os 16 anos levando surra haviam infundido nele uma fúria insaciável. Ele teinha que

liberá-la no mundo.

Para todos os lugares em que ele olhava, ele via um alvo. Altamente paranóico e sensível demais, ele

imaginava que as pessoas olhavam para ele, insultavam-no, estavam prontos para abusar dele da mesma

forma que seu pai o tinha feito. E ele atacava. Ele batia nos outros antes que eles pudessem chegar perto

dele, merecendo ou não. Ele deixou um grande rastro e, quando ele chegou aos 19, já tinha estado

dentro e fora de dezenas de centros de detenção juvenil.

Agora, aos 35 anos, Kyle era um condenado convicto. Ele havia passado mais tempo de sua vida

atrás das grades do que fora delas, e fiel ao sei jeito, ele já estava pensando no seu próximo crime. A

próxima loja que ele poderia roubar. O próximo policial com quem ele poderia brigar. A próxima

garota que ele poderia atacar. A próxima luta de bar que ele poderia entrar. Sua necessidade para a

violência era insaciável – e os últimos cinco anos só tinham deixado-o pior.

Kyle pensava que, aos 35 anos, ele ainda tinha, pelo menos, mais 30 bons anos pela frente para

infernizar. Quando chegasse aos 65, ele imaginava, se não estivesse morto, ele se aposentaria, ou

encontraria uma maneira de sair com um estrondo. Pena que não havia nenhum plano de previdência

para os criminosos, ele pensava.

Kyle começou a descer pela estrada de cascalho, havia um gingado novo em seus passos, ele ia

levantando poeira enquanto andava. Entrou na agitada Rota 99 e caminhou pela sua beirada. Carros

passavam zunindo e, com isso, ele sorriu e estendeu um polegar. Claro que, quando os faróis

iluminavam seu rosto cheio de cicatrizes, refletiam sua cabeça calva, ninguém se atrevia a parar.

Mas isso só o fazia sorrir ainda mais. Ele tampouco teria parado para si. Ninguém era tão estúpido.

Kyle não queria realmente uma carona de qualquer maneira. Ele só gostava de assustar os outros.

Talvez ele causasse um pouco de pânico ao coração de algum motorista, talvez no coração de alguma

mãe e seus filhos. Ele sorriu ainda mais com o pensamento, zombando de um Volkswagen Beetle que

passou por ele.

Seu destino real era na mesma rua, um pequeno bar que ele se lembrava de anos atrás. Era o local

perfeito para conseguir uma bebida e começar a causar confusão. Talvez ele pudesse dar uma surra em

alguns moradores e desavisados, talvez, se ele tivesse sorte, poderia encontrar algumas meninas para

aproveitar.

Pete. Esse era o nome do bar.


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