3 - A descoberta

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"Não são os mortos que sofrem mais com a sua morte, mas sim os seus amigos e familiares".

Claro que, aqui, parecia o meu avô (que já morreu) a contar piadas: ele esquecia-se sempre de algo, tal como, de certa forma, eu esqueci-me de certos pormenores. Eu saltei logo do meio (ou início, se o quiserem considerar assim) para o fim (ou meio, se também considerarem desta forma). Contando com o que é relevante para a história, ainda temos mais meio capítulo (por aí... nem sequer sei se chega aí).

Eu ainda estava cá fora. O alarme (que eu tinha que me avisava que eu tinha que dizer ao meu chefe que o tempo já tinha acabado) tinha tocado e eu entrei no edifício, que ainda estava bastante escuro. Olhei para o relógio que tenho no meu telemóvel, apesar de saber as horas a partir do alarme. Eram 09:44. Olhei para a piscina. Ele não estava lá. Pensei que ele estivesse submerso, mas não. Vocês já sabem o que aconteceu.

Hm, fazendo agora uma pausa da narração, não percebo um detalhe que tenho na minha faceta de escritor... Porque é que estou sempre a repetir a mesma coisa, vez após vez? Já devo ter dito desde o início desta história (outra vez, depende de vocês; não sei muito bem o que consideram o início, o fim e o meio) no mínimo dez vezes que ele estava morto, mas de formas diferentes. Por muito subentendido que esteja, está lá. Até pareço que sou uma pequena voz na vossa cabeça que diz: "Não se esqueçam: ele está morto!". Ainda ficam a pensar que sou um psicopata.

De qualquer maneira, acho melhor continuar com a história. Aposto que vocês estão a gostar...

Entrei nos balneários, a pensar que se calhar hoje seria o dia. O dia em que o meu chefe me iria surpreender, já se tendo começado a preparar. Infelizmente, não. Acabo sempre por tentar ser positivo, mas às vezes parece que ser pessimista resulta melhor.

Se pensarmos bem, até podemos concluir que, ao ter a certeza que o pior vai acontecer, quando acontece algo só um pouco melhor, ficamos felizes. Acho que até faz muito sentido. Quem não concordar 'tá no seu pleno direito, mas esta é a minha forma de ver a vida.

Continuando... Quando constatei que ele não estava lá fui chamá-lo, mas primeiro tirei a camisola de lã. Lá dentro estava um calor horrivelmente quente (não; haveria de ser um calor frio). Abri a porta e vi-o. Vi-o a flutuar lá, cabeça de baixo da água, braços abertos e pernas submersas. O sangue retirava a calma que o azul transmitia, substituindo-a por uma desconforto total, que prejudicava imenso a atmosfera.

Ao início não reagi; estava chocado. Ele até podia ter inimigos, mas não esperava que ele aparecesse morto.

Quando recuperei do meu choque principal, avancei para o corpo. Não toquei em nada nem saltei para a água. Sempre tinha visto naqueles programas do C.S.I. que nunca se deve alterar nada na cena do crime. Apenas tirei o meu telemóvel e liguei para o 112. Do outro lado da linha, a voz calma dizia:

- 112, qual é a sua emergência?

- Eu... Eu encontrei... o corpo do meu chefe...

- Consegue-me dizer onde é que está?

- Estou... numas piscinas privadas de São Cosme. - eu ainda gaguejava.

- Na Rua dos Pinheiros?

- Sim...

- Já enviámos uma viatura para o local. Como medida de segurança, saia do local.

- Ok. Obrigado. - disse eu, terminando a chamada.

Tentei sair de lá o mais rápido possível. Cheguei mesmo quando eles chegaram: às 09:49.

O primeiro polícia (ou inspetor [nunca soube muito bem como se designa e quais são as diferenças entre os diferentes nomes]) que chegou ao local era tudo menos o que eu esperava. Eu conhecia-o. O seu nome era Carlos, e ele era um dos meus melhores amigos. Claro que depois de eu lhe ter posto uma escuta, tudo foi ao ar. Quando ele me viu, disse-me logo:

- Samuel? - olhei para ele. Ainda estava de costas mas já sabia quem era. Aquela voz era única.

- Carlos...

- O que estás aqui a fazer?

- Eu descobri o corpo. -respondi-lhe.

- Estás bem? - perguntou-me ele.

- Sim, mas...

- Olha, sem querer parecer rude, eu não tenho todo o tempo do mundo. Depois vamos beber uma cerveja a qualquer sítio.

- Posso ir com vocês? - Ele suspirou e disse, pausadamente:

- Sim. Tens luvas?

- Vou buscá-las.

Fui até ao carro e tirei um par de luvas que tinha na mala. Estava entusiasmado. A investigação ia começar.

Água fria ou quente?Onde histórias criam vida. Descubra agora