4 - Água por todo o lado

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"Um momento de silêncio vale mais do que dez nos quais se fala... Bem, nem sempre."

Voltei logo que consegui para a beira dele, para podermos começar a investigação. Não a queria atrasar. Já era gentil dele me ter deixado acompanhar a investigação, mas agora ter de esperar por mim sempre que chegasse mais tarde? Aí era abusar da sua generosidade.

- Já está? - perguntou ele quando eu cheguei.

- Sim. Desculpa pelo atraso... - Ele sorriu.

- Não faz mal. - Ele fez uma pequena pausa no seu discurso e depois voltou a falar: - Onde é que encontraste o corpo?

- Por aqui... - Acelerei o passo para poder ficar à frente e depois, sem ne virar, perguntei: - O médico-legista ainda não chegou? - Eu já tinha reparado que na pequena "equipa" de pessoas que estavam (ou deviam estar) a investigar o crime faltava uma.

- Ele vai chegar atrasado.

- Hm... De repente parece-me que não demorei assim tanto tempo. - Ele riu-se e eu sorri. O seu riso fez eco no balneário. E depois veio um silencio constrangedor que demorou 17 segundos (não contei exatamente, ok? Não sou assim tão maníaco com o tempo). Um silêncio constrangedor e desconfortável. Um silêncio que parecia congelar todos à sua volta, para assim ninguém o poder matar, abrindo a boca.

Felizmente, as portas que davam para o local de crime rangiam... e não era pouco. Parecia que estavam a estalar os dedos à nossa frente a dizer "Acorda!". E acordámos mesmo. Eu já ia começar a avançar, todo convencido, até que ele me pôs a mão no peito e disse-me:

- Vamos definir umas regras: não tocas em nada, não falas a não ser que falem para ti e não interferes com a investigação de qualquer maneira.

- Ok, pai... - disse eu, sarcasticamente.

- A sério. A partir do momento em que entramos aqui as brincadeiras acabam. Isto é o meu trabalho, e é bastante sério.

- Ok. Desculpa. E não tens de te preocupar. - Claro que aqui ainda não tinha planeado a escuta...

Continuei para a frente e obtive a imagem toda. Não havia assim muito mais: tirando a água por todo o lado, não havia mesmo nada que já não estivesse presente nos outros dias.

- Quem é ele? - perguntou um polícia que já se estava a tentar fazer útil.

- Ele descobriu o corpo. 

- Quer que eu o interrogue? - O meu amigo nem respondeu. Apenas levantou a mão, como se estivesse a dizer "Esquece" e depois disse:

- Alguma pista até agora? 

- Bem, tirando a arma não temos nada. 

- E estas pegadas?

- Acho que são dele. - disse o polícia apontando para mim.

- O que é que eu tinha dito? - Carlos começou a levantar a voz.

- Ok, desculpa. Eu saio daqui. - disse eu. Dirigi-me à porta quando ela se abriu. Era o médico-legista. 

- Desculpem o atraso. - disse ele, ignorando-me. Olhou para o corpo e depois perguntou: - Vamos tirá-lo da água.

- Claro. - disse Carlos. O corpo foi retirado da água, molhando tudo ainda mais. Eu afastei-me um pouco para não ficar mais molhado e depois o médico-legista começou com a sua análise:

- Parece que ele foi afogado... Tem grandes quantidades de água nos pulmões. Só depois é que foi alvejado. Mas claro que terei que fazer o exame primeiro.

- Ok. Como é que ele se chamava? - perguntou-me Carlos.

- Pedro Alves. 

- E onde é que estavas durante o tempo todo em que ele esteve sozinho?

- Porque é que est... Oh. - disse eu, quando percebi o motivo da questão. - Pensava que confiavas em mim, por isso não percebo porque é que achas que eu estou a mentir. Eu não o matei.

- Eu sei, mas quando prenderem o assassino o advogado de defesa vai perguntar porque é que nós não sabemos onde é que tu estavas.

- Eu estava lá fora a ver coisas no meu telemóvel.

- Alguém pode verificar isso? - perguntou-me ele, calmamente.

- Sei lá! Deve haver alguns registos telefónicos. - Peguei no telemóvel para lhe mostrar mas ele disse:

- Nós vamos ver isso. - Voltei a por o telemóvel no bolso. - Entretanto... - ele ia continuar mas foi interrompido por um barulho que parecia ser uma daquelas placas de piscina. 

Eu, ignorando todos os meus instintos, fui o primeiro a ir ver o que se tinha passado. Apesar do meu amigo ter dito para eu não ir, eu fui, até que o assassino (ou a assassina) pegou num ferro e bateu-me na cabeça com ele. Eu berrei mas desmaiei depois. Mesmo assim, a última coisa que vi foi ele (ou ela) a pousar o ferro no chão e a começar a fugir.


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