Capítulo 2.

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    Sou interrompida dos meus pensamentos quando Miriam bate na porta da cabine do banheiro. Aos gritos, ela pede para corrermos, antes que o professor note nossa ausência. Ela abre a porta desesperada e começa a gritar. Problemática. O professor pode não notar nossa ausência, mas com esses berros, ele com certeza sentirá falta de alguma coisa, ou alguém.     

Ela me puxa pelo braço, o que o deixa um pouco vermelho, mas nada irrelevante, e me empurra para fora do banheiro, em direção ao corredor. Em meio a essa correria, me deparo com um novato. Parece ter a mesma idade que eu. Ou talvez esteja se transferindo. Bom, isso não é da minha conta.

Tropicamos e quase caímos.

-Miriam, diminui o passo. Um minuto não fará diferença, como você disse. E me solta que você está me machucando. –Apesar de ela não ser tão forte, a vermelhidão continua.

-Seria de muita ajuda se você, ao invés de fazer escândalos – eu sou a que faz escândalos, ok? Não é a Miriam. Eu mereço. – corresse mais rápido. Você parece uma lesma morta!

Não compreendo o motivo de tanta irritação. Foram somente alguns poucos minutos. Mas pela sua expressão facial, coisa boa não estava acontecendo.

-Ok, eu corro mais rápido - *respiração ofegante* - mas me explica por que estamos correndo tanto, já que foram somente poucos minutos? –insisto pela resposta.

Miriam não explica, só continua correndo.

Me sinto um pouco idiota por não saber de nada, mas ao chegarmos na sala de aula e deparamos com o relógio de pulso do professor, indicando nove horas, eu me desespero. Mais de vinte minutos se passaram e ficamos a aula toda fora da classe. Isso não é culpa minha, porém, também é de minha responsabilidade.

Não digo que a demora foi problema meu. Fico calada até ouvir os gritos do professor. Passamos pela sala como cachorrinhos obedientes, somente ouvindo sermões e promessas de advertências que nunca são realizadas. Todos da classe nos olham com seus olhos esbugalhados, contendo a risada. Isso já é humilhação.

-Como punição, vocês virão aqui no sábado para repormos a aula! – Miriam levanta a mão para argumentar, mas imediatamente, o professor a corta. –Nada de reclamações. A única pessoa que deve estar reclamando sou eu. Pois sou EU que tenho que vir à escola sem ao menos saber vocês, dondocas, virão. – Meu sangue começa a esquentar. Mas não de medo ou apavoramento, mas de ódio. Carlos percebe que estou tensa, então, para tentar me acalmar, passa a mão em meu ombro, me relaxando um pouco.

Carlos é um grande amigo meu. Ele é muito bonito. Negro e alto. Um pouco velho, é o que aparenta, mas tem a mesma idade que todos da sala. Suas notas são invejáveis. Além de dar aula de música aos sábados, ele é um grande amigo nas horas vagas.

-Está tudo bem? – Ele sussurra.

-Já esteve melhor. Mas vou ficar bem.

Penso em me levantar e manifestar, porém, sou cortada pelo sinal. O que na verdade é um alívio, pois não sabia o que dizer.

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Pego meu lanche e me sento junto aos "Saod", que são os que "Se acham oficialmente demais". São pessoas de um grupinho em que a Miriam insiste em ficar. Pessoas que tem de tudo, e querem ainda mais.

Engulo minha comida e não falo com ninguém. Forço algumas risadas e só, enquanto a minha amiga se diverte contando sobre a aula anterior de uma maneira distorcida.

Hoje é pizza, a famosa e maravilhosa, quarta da pizza. Meu dia predileto. As merendas são sempre gororobas, então quando é pizza, eu faço de tudo para não faltar.

Eu só fico perto dessas pessoas do saod para zelar a reputação da minha colega, afinal, sua reputação não é lá das melhores. Todas da mesa não gostam da Miriam, isso é fácil de saber, mas eu gosto de ver minha amiga interagindo, então não interrompo. Quando criança, ela comia terra e o coco de seu falecido coelhinho Puppy. Sua mãe adora tirar fotos, e sempre que Miriam estava no "seu momento", a mãe dela resolvia pegar a câmera fotográfica para registrar o momento. Até que numa exposição escolar, deveríamos escolher algum retrato da infância. Como Miriam tinha se esquecido, telefonou para casa para que sua mãe lhe pudesse trazer, porém, ela acabou pegando, justamente, a foto em que Miriam estava comendo terra do parquinho da praça. Foi bem constrangedor.

As garotas da mesa só falam de roupas e garotos, por isso, vou para meu cantinho, comentar no meu "diário" virtual, mais conhecido mundialmente como Twitter.

A coisa que eu mais gosto no Twitter é que você se conecta com diversas pessoas, no mundo inteiro. Um sistema tecnológico incrível. Tenho uns cem mil seguidores, e sempre interajo com eles, o que é bem divertido. Quando você está animado, triste, emburrado, com raiva ou todos os tipos de humor da humanidade, essa rede social é perfeita para que você possa desabafar – coisa que eu faço toda hora – ou se alegrar. Além de ficar por dentro de tudo, você também pode ganhar o follow dos ídolos. Não é incrível?

Fico esperando a Juliet – minha amiga desde o fundamental, que teve que se mudar por causa do emprego dos pais – acessar internet. Como ela não pode me visitar e eu a mesma coisa, só conversamos através das redes sociais. O que eu acho mais fácil, porque você pode colocar muitos emojis sorridentes sem nem mesmo estar rindo. E, como a pessoa não saberá, isso não será problema.

Enquanto Juliet não esta online, eu vou para o YouTube dar uma checada nos vídeos novos. Pego meus fones no bolso e começo a ver um vídeo que não curto muito, mas assisto só para passar o tempo.

É lei na escola a proibição de celulares, tablets ou qualquer aparelho digital. Por sorte, sou uma garota ligeira e não me preocupo com isso. Sempre que algum funcionário aparece, eu rapidamente enfio meu Iphone no bolso e saio como se nada estivesse acontecendo. Como o colégio não permite telefones, eu sempre utilizo o meu 3G, que, vou confessar, é péssimo. Porém, como não tenho outra opção, a única escapatória é essa.

Faltam oito minutos para o próximo sinal - que indica aula de biologia, que eu adoro – e até agora Juliet não deu as caras. Espero mais um pouco, e fico orgulhosa por isto porque minha amiga entra no exato momento.

Falamos sobre tudo. Música, comida, bandas e tudo mais. Pergunto quando irá me visitar, e como sempre, sua resposta é "não sei". Já estou acostumada com isso, só pergunto para não perder o hábito.

Quanto estamos falando sobre um assunto não tão agradável (namoradinhos), o sino bate. Suspiro e falo baixinho:

-Salva pelo gongo.




GeorgiaWhere stories live. Discover now