O beijo

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Como esperado, conversamos... Fui relutante no começo, mas devo admitir que ele era insistente. Com jeitinho, foi conseguindo com que eu falasse.
Me senti vulnerável, ninguém conhecia minha vida, nem mesmo Melany. Mas ter com quem conversar era maravilhoso, libertador. Não sabia que era tão bom e nem que seria tão fácil conversar com alguem, ainda mais um homem.
Acredito que tenhamos ficado horas conversando, pois quando me dei conta, a lua brilhava no céu estrelado.
- deuses, ha quanto tempo estamos aqui?
- e isso importa?
- sim, Liz ia falar comigo depois que falasse com Quiron sobre... - me calo.
- sobre...?
- não sei se devo falar...
- ah vamos, você me contou tanta coisa. Acho que mais isso não há problema. A menos que seja alguma missão...
- o que? Não, não tem nada a ver com o camp, tem a ver comigo... - viro o rosto.
- então já sei, quer entrar em contato com seu namorado...
- oi? - o olho, confusa - que namorado? Ta doido?
- ué... Vai me dizer que não namora...?
- eu tenho cara de quem quer relacionamento?
- pode ser uma maneira de afastar as tentações...
- tentações?
- claro... eu sou irresistível...
Comecei a rir, e logo perdi o controle, eu estava gargalhando. Droga, nunca ri tanto na vida, e nem foi tão engraçado. E de repente, eu me senti boba.
- irresistível? Você?
- deve haver um motivo pra você ter rido tanto,e além disso, fica me olhando a todo momento e nem me jogou daqui de cima quando peguei sua mão.
- não sabia que queria aprender a voar... Posso fazer isso agora - digo sorrindo, com uma sobrancelha arqueada.
- primeiro, não obrigado, e segundo, não acho que faria isso comigo.
- e por que não? E não diga que é incrível, pois não é isso...
- por que somos amigos...- disse com simplicidade e encolheu os ombros.
Definitivamente, de todas as respostas que eu esperava, essa era a última. Virei o rosto e abaixei a cabeça. Ele me olhou.
- hey...
O olhei e percebi que ele estava sorrindo.
- sim?
- somos amigos... Não somos?
- parece que sim... - disse meio hesitante e fui virar o rosto de novo, mas ele colocou a mão em meu queixo e me fez olha-lo.
- por que faz isso?
- i-isso o que? - Corei ao sentir a suavidade de seu toque, era gentil.
- por que foge?
- eu não estou fugindo.. - tentei virar, mas ele continuou me segurando.
- está sim... Você tenta afastar as pessoas, tentou afastar a Liz, mas de alguma forma a Liz te conquistou. Sou observador, Elsa, pude notar que você tentou afasta-la, mas é quase impossível não gostar da Liz quando ela está determinada a fazer amizade. Quanto a mim, você não se poupou, você usou seu arsenal de grosseria, ouso dizer que quase desisti.
- e por que insistiu?
- porque... Não sei... Você despertou meu interesse de uma maneira que nenhuma outra garota fez antes.
- isso não faz sentido... - me soltei e virei o rosto, ciente de que estava meio vermelha ainda, maldição, não estava certo.
- não... Nem um pouco...
- então...?
- só aceite ta bem?
- já percebi que quando coloca algo na cabeca, ninguém tira. Também sou observadora.
- exatamente. E agora me diga, o que a Liz tem que falar com Quiron sobre você? Já me disse que sua familia adotiva morreu, e não tem ninguém... Não posso imaginar mais nada...
- quero ser caçadora...
Ele parou e me encarou. Ficou me olhando por um tempo, como quem tenta entender o que acabava de ouvir.
- quero ser cacadora - repeti.
- e por que raios você quer isso? - era impressão minha ou ele pareceu desapontado?
- porque não tenho motivos para não ser....
- isso só comprova que não namora...
- já disse que não namoro Jack.
- achei que estivesse bricando... - virou para a frente.
- achei que havia notado que não tenho muito senso de humor.
- notei...
- o que foi?
- sei lá... Só não esperava... - ele vira para mim e percebo que estava chateado - sabe tudo de que vai abrir mão?
- sei... De algo que nunca tive, e acredito que nunca terei...
- como pode ter certeza? Você nem permite que as pessoas se aproximem de você, como vai se apaixonar?
- mas quem disse que eu quero me apaixonar?
- todos devem se apaixonar...
- eu não quero...
- não... Você tem medo, é diferente. Tem medo de se apaixonar...
Me calei... Quis dizer que ele estava errado, quis chama-lo de mentiroso e dizer que eu não precisava me apaixonar. Mas, muito dolorosamente, percebi que ele tinha razão. Desviei o olhar.
- ninguém amaria um monstro...
- concordo, mas não vejo nenhum monstro aqui...
- está falando com ele... - o olho
- não, vejo apenas uma garota que foi incompreendida durante a vida. Uma garota com um grande potencial, mas tem medo. Uma garota que quer abrir mão da felicidade, por medo de sofrer...
Eu fiquei chocada. Como ele ousava dizer aquelas palavras para mim? Quem ele achava que era? Mas, de alguma forma, eu sabia que ele estava certo, mas não disse nada.
- por favor Elsa, tire essa ideia da sua cabeça...
- não...
- então pense bem antes de fazer esse juramento, ta bem?
- ta bem, mas antes me responde uma coisa, e quero sinceridade...
- o que quiser, é só perguntar...
-por que? Por que esse interesse em mim? Você nem me conhece....
- porque eu vejo potencial em você. É mais do que acredita. E alem disso, todos devem aproveitar a vida, principalmente nós, os semideuses. Nossa vida já é horrível, monstros atrás de nós, pais que nos ignoram, pessoas que nos tratam como se fossemos aberrações... Sei como é, e você também sabe. Só não acho justo você abrir mão de uma vida só por medo...
- mas eu vou viver muito tempo...
- e de que adianta uma longa vida sem amor?
- parece filho de Afrodite...
- não... Talvez seja convivência com a Liz... Ela é doida, não sei como não te passou esse sermão todo...
- nem eu...
- então...?
- eu.. Eu prometo que vou pensar... Ta bem?
- e quando se decidir..
- será o primeiro a saber...
- perfeito - ele sorri, se levanta, limpa a poeira da roupa e das mãos e estende a mão para mim... Pego e me levanto com sua ajuda.
- obrigada... - fiz menção de soltar sua mão, mas ele me segurou com firmeza, me olhou como se me desafiasse a solta-lo e começou a caminhar em direção aos chalés...
Quando chegamos a uma área aberta, parei e soltei minha mão. Ele me olhou como se perguntasse o por que eu havia feito isso..
- sou novata, se eu chego num dia e no dia seguinte me vêem de mãos dadas com um cara, vou ficar mal falada.. - sorrio.. Ele retribui e diz.
- dessa vez, está perdoada... Vamos, vou leva-la ao seu chalé...
- certo...
E lá fomos nós em direção ao meu chalé. Ainda estava meio calada depois de tudo o que ele havia me dito, pensando em cada palavra e o odiando por ter razão. Acho que ele percebeu que eu estava pensando no que disse, pois não interrompeu o silencio, o que eu achei no mínimo gentil.
Enfim chegamos na frente do meu chalé. Não era boa com despedidas... Como se da tchau a um amigo? Até logo? Falou ae brow?
- então, senhorita Elsa Watson. Tenha uma ótima noite... - fez novamente uma leve reverência, não pude deixar de sorrir.
- obrigada, Jack Frost, um ótima noite também - fiz também uma leve reverência, como aquelas princesas toscas faziam, me sentindo completamente idiota, e me endireitei de novo - bem... Até breve, acho...
- espera...
- sim?
- só tenho mais uma coisa a dizer...
- já não falou bastante hoje?
- deixe de ser chata e escute... É algo sobre mim...
- certo, diga...
- preparada?
- estou... - digo revirando os olhos.. Ele se aproxima um pouco e sorri.
- eu amo desafios... - pisca para mim e me da um beijo no rosto - até breve.. - se vira e sai, antes que eu possa responder...

A caçadoraOnde histórias criam vida. Descubra agora