Ester

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A vida é curiosa, engraçada e, no caso dos semideuses, é geralmente trágica. Achava que eu havia passado por muita coisa durante minha vida, mas me escapou o fato de que eu não sou a única semideusa do mundo.
No dia seguinte, pensei em evitar Jack, mas apesar do acampamento ser enorme, não havia possibilidade de evita-lo, então simplesmente não o procurei. Tirei a roupa de dormir e coloquei um jeans e a camisa do acampamento, prendi o cabelo e comecei a ir em direção ao refeitório, mas fui atropelada por um javali logo que passei perto do chalé 5.
- PIP OLHA O QUE VOCÊ FEZ! - ouvi uma garota gritando de dentro do chalé, correndo em nossa direção com a expressão furiosa. O javali se encolheu e soltou um grunhido baixinho, e continuou em cima de mim, parecia que estava tentando se esconder. Fiquei ali sentada no chão com um mini javali em cima de mim e uma garotinha brava.
- moça você tá bem?
- ah.. Estou... - disse, meio confusa, tentando entender a confusão.
- esse Pip, sempre fugindo na hora do banho.. - emburrada, se abaixa e pega o javali no colo. Ela era uma garotinha corpulenta, meio musculosa, cabelos pretos e olhos castanhos escuro. Ficou me olhando de uma maneira curiosa - não vai levantar?
- ah sim.. - me levantei e tirei a poeira da roupa, ainda a olhando - por que queria dar banho em um javali?
- ué... Já tentou dormir com um javali fedido? É horrível, principalmente quando ele cisma de dormir em cima da sua barriga. Não é nada legal..
- e por que ele dorme com você? - estava confusa, afinal, javali é um animal selvagem, o que raios ele estava fazendo ali com ela?
- ele é meu bebê... Né Pip? - o abraça forte e ele solta uns guinchos baixinhos.
- ah sim - sorrio - como se chama?
- eu sou a Ester - ela diz e escreve o nome mo ar com a mão livre. Depois me olha - filha de Ares - quando diz isso, seus olhos brilham de orgulho.
- aah.. Então você é a garotinha que deu uma pedrada em Jack? - rio
- ele é burro, não pode ficar distraido no meio de uma luta. Tudo por causa de uma menina.
- é você está certa, não pode mesmo. A propósito, me chamo Elsa, sou filha de Quione.
- a tia da neve? - me olha com curiosidade.
- sim.. A tia da neve... - sorrio, era tão fácil lidar com crianças.
- aaaah que legal, você faz neve também? - sim.. Quer ver?
- QUEEEROOO...
- tudo bem - rio ao ver sua carinha e faço nevar.
A expressão dela ao ver neve foi incrível, não ha nem palavras pra dizer. Ela estava tão encantada que largou o javali no chão e tentou pegar a neve, e eu fiquei ali, a observando.
- Ester, vamos comer alguma coisa?
- Ahn? Ah vamos, eu to morrendo de fome...
E fomos ao refeitório, conversando. Quer dizer, ela falando o tempo todo sobre Pip, o quanto ela gostava do acampamento e que a comida era perfeita, mas nada era melhor que a panqueca de sua mãe. Então chegamos e começamos a comer, a menina comeu muito, mas muito mesmo, fiquei até com medo de ela ter indigestão, mas ela disse que estava sem muita fome. Achei melhor não comentar, então mudei de assunto.
- então Ester, sua mãe não se preocupa por você estar aqui? Com vários semideuses mais velhos, você lutando com monstros..?
- mamãe não tem como falar nada - ela abaixou a cabeça com um ar triste... - ela não tá mais aqui.. Ela.. Se foi...
Então, ela começou a me contar que sua mãe havia casado com um homem bruto, que a tratava muito mal, e sua mãe era uma pessoa boa, cuidava dela, não ligava por ela ter problemas de temperamento forte e nunca reclamou dela ter sido expulsa de varias escolas. Então, depois da quinta escola que foi expulsa, sua mãe passou a educa-la em casa, mesmo com as implicâncias do padrasto. Quando foi seu aniversario de 8 anos, sua mãe fez uma surpresa, comprou um bolo para ela e a chamou na cozinha. Mas o padrasto ficou muito bravo, pois eles não tinham muitas condições e ficava gastando com a monstrinha, sua mãe discordou e disse que ela merecia, que estava aprendendo a se controlar e que ela era uma boa garota. Só que a discussão começou a passar dos limites, eles brigaram muito e ele avançou em cima de Ester, mas sua mãe entrou na frente e deu um basta, disse que nunca ele iria encostar um dedo sequer na sua filha, que bater nela era uma coisa, mas bater em Ester era bem diferente. Então ele saiu dali, furioso, batendo os pés, sua mãe a olhou e garantiu que tudo ia mudar e que ele nunca mais ia interferir em suas vidas. Só que ele voltou com um taco de beisebol, sua mãe a olhou e disse para ela sair dali, mas ela ficou petrificada. O padrasto começou a bater na mãe dela e ela ficou sem reação, não conseguiu se mover, só conseguiu olhar, e quando ele parou de bater nela, ela já estava morta. Então Ester perdeu o controle e foi pra cima dele, ela diz que só se lembra de ficar muito vermelha e de bater muito nele. Então o deixou desacordado e deu um ultimo adeus para sua mãe e saiu de lá, sem nem olhar para trás.
Fiquei chocada, como uma criança podia ter passado por tudo aquilo e ainda sorrir? Ela realmente era mais forte do que aparentava, ela não tinha apenas força física, era realmente uma guerreira.
Quando ela terminou de falar, pude ver que ela estava triste e tentava esconder as lágrimas, não queria que eu a visse chorando. Então eu a peguei no colo e comecei a acariciar sua cabeça, e ficamos ali por um tempo, ela chorando e eu tentando acalma-la.
Após um tempo ali, ela melhorou e voltou a comer, parecia um furacão comendo, e não pude deixar de sorrir. Pronto, uma garotinha de 12 anos me conquistou, havia feito uma nova amiguinha.
Quando terminou, me olhou e perguntou o que eu ia fazer, e quando eu disse que ia treinar, seus olhos brilharam e ela implorou para que eu treinasse com ela. Comecei a rir e disse que tudo bem, desde que ela não me matasse, mas ela já não estava mais ouvindo, levantou em um pulo e me puxou para a arena para treinar com ela, dizendo que quase ninguém queria treinar com ela por causa da força dela, e em um treino com seu irmão, ela ganhou uma cicatriz porque ele furou o pulmão dela. Tentei processar aquela pequena informação, ela dizia sobre a cicatriz como se fosse um prêmio, fiz uma nota mental de que eu teria que tomar cuidado ao lutar com ela, e, cedo demais, descobri que tinha razão ao pensar nisso e percebi também que logo eu iria visitar novamente a Nathaly. infelizmente, eu tinha razão.

A caçadoraOnde histórias criam vida. Descubra agora