Pinheiros, 16 de agosto de 2011.
Hospital Metropolitano. 17h12.Isabel's POV
– Eu tô bem, mãe. – Prometi, encostada na parede do corredor.
– Mas você tem que me ligar, Isabel! – Dona Clara estava uma fera. E eu estava pouco me lixando. – Eu vou ligar para os pais do Bê e...
– Não chama ele assim, mãe.
– Eu chamo do que quiser, ele é meu genro! – Revirei os olhos.
– Ele não é seu...
– Cale a boca, Isabel Alves! – Eu detectei autoridade em seu timbre, então resolvi obedecer. Minha cabeça estava doendo e havia sido um dia tão, tão cheio... – Até quando você vai negar? Você e o Bernardo se amam! Chega de toda essa palhaçada que você o faz passar, menina. Ele é um moço de família e tão, mas tão bom. Por favor, Bel... Não brinque mais com ele. Ou você quer, ou você não quer.
Meu suspiro reverberou por todo meu corpo, espelhando o quão sensível eu estava.
– Eu estou cansada, mamãe. Eu preciso voltar para o quarto, ver como Bernardo está. – avisei.
– Nós vamos para aí daqui a pouco. Eu só vou esperar o seu pai chegar do trabalho.
– Eu já disse que não há necessidade. – Avisei com cautela. – Chame os pais do Bernardo, porque ele vai querer vê-los. Eu ainda tenho que conversar com o médico sobre o estado dele, de qualquer forma.
– Vê? – Mamãe me chamou a atenção. – Você morre de amores por ele, minha filha.
– Eu estou preocupada. – A corrigi.
– Sim. – Ela concordou, o que me surpreendeu. – E aposto que trocaria de lugar com ele, se pudesse...
Só de lembrar de como foi difícil ver os médicos tentando reanimar o corpo dele, eu estremeci. Ninguém deveria passar pelo que o Bernardo passou. Parecia tão dolorido, tão ruim. E ele ainda não tinha acordado, o que era muito preocupante. E pensar que eu poderia ter evitado tudo se não fosse tão briguenta...
– Eu trocaria. – Confessei. – Eu com certeza trocaria de lugar com ele.
– Oh, minha Bel... Você está tão tristonha.
– Eu preciso ir, mãe.
Larguei o telefone público e me encaminhei até o elevador, indo para o andar em que Bernardo havia sido internado. Logo depois de conseguirem reanimá-lo, ele sofreu complicações respiratórias e precisou ser entubado. Eu fiquei sem chão. Quando tudo pareceu melhorar, mais uma coisa surgiu e voltamos à estaca zero. Odiei vê-lo pálido, quase sem cor, tendo que sobreviver por causa de tubos e soros intravenosos. Eu só queria voltar ao início do dia e dizer que o deixaria fazer todas as listas que quisesse fazer.
E a vida, a porcaria da vida era tão imprevisível. Era pra ser só mais uma discussão boba entre nós, daquelas que durava algumas horas e então evaporava. Mas ali estávamos, num hospital, depois de sofrer um acidente.
– Isso tudo é tão assustador, Bê... – Eu murmurei, sentando-me na cadeira ao lado da cama. – Eu só queria que você acordasse e fizesse algum comentário idiota sobre o meu cabelo.
São Paulo, 23 de dezembro de 2010.
Shopping Iguatemi. 18h56."– Deixa, Bel? – Bernardo me cutucava na cintura repetidas vezes. E eu revirava os olhos repetidas vezes.
Parei de andar, cansada daquela carinha de coitado me encarando tantas vezes, e imobilizei suas mãos.
– Não. – Respondi.
– Por que não? – Ele deixou de sorrir para franzir o cenho. Se ele fosse esperto, teria feito essa carinha mais cedo. Eu com certeza cederia. Adoro testas franzidas.
– Porque natal é pra passar com a família. – Expliquei o óbvio.
– Exatamente. Sua mãe me considera da família.
– Meu pai não. – Sorri, adorando o ódio que meu pai tinha de Bernardo. – E meu pai é o homem da casa.
– Isso não é empecilho. – Bernardo falou, me fazendo soltar suas mãos. Elas, ao invés de voltarem a me cutucar, abraçaram minha cintura. Gostei daquele carinho, então enlacei meus braços em seu pescoço. – Eu vou conquistar seu pai.
– Você não precisa fazer isso. Não é meu namorado.
– Porque você não quis. – Acentuou, bufando. Eu ri, confirmando. Haviam sido dois pedidos extremamente românticos e extremamente negados. De alguma forma estranha, ainda estávamos enrolados aos lençóis um do outro. Eu não entendia como, mas estava com Bernardo. Não era sua namorada nem nada do tipo, mas não conseguia ficar com outros caras. Ele era... suficiente. Por enquanto.
– Vou falar isso de uma forma que você entenda. – Avisei, tomando uma expressão séria no rosto. Os olhos azuis dele me encararam com atenção. – Você não vai passar o natal comigo.
– Urgh!
– Não faz "urgh" pra mim!
– Faço o que eu quiser. – Bernardo era uma criança. Não era possível. – É só o natal, Isabel! O que tem de mais em passar o natal com seu... hum...
Eu sorri maldosamente e o afastei, dando um passo para trás.
– Viu? – Pedi. – Nós não somos nada. E eu só passo o natal com pessoas que significam alguma coisa pra mim.
E me virei, tornando a andar pelo corredor do shopping. Nós já havíamos ido ao cinema (pra ajudar a lista Filmes Em Que O Sangue Parece Ketchup) e havíamos comido no Mc Donald's, o que preenchia a cota de Bernardo do meu dia. Eu não precisava ir pra casa dele hoje, precisava? Ainda mais pra ficar ouvindo sobre passar o natal com ele.
Tudo bem, então eu tinha pegado um pouco pesado.
Parei de andar, respirando fundo antes de dar meia volta e voltar correndo para onde o havia largado. E Bernardo estava lá, com os braços cruzados, fuzilando-me com os olhos enquanto eu me aproximava.
– Você não vale o chão que pisa. – Declarou.
– Eu sei. – Colei nossos corpos, pegando com força em seus braços e dando-o um selinho duro e rápido. – Eu sinceramente sei. – Frisei, espalmando minhas mãos em sua bochecha, olhando-o com uma intensidade que eu nunca sabia de onde surgia. Aquela era a hora em que eu queria um beijo e ele estava magoado demais para me dar. – Me agarra, Pazzini. – Pedi, baixinho, contra sua boca. Acariciei sua barba por fazer com carinho, selando minha língua levemente por seus lábios. – Por favor.
Bernardo, como o homem educado que sempre foi, não tardou em acatar ao meu pedido.
E, Deus, como eu adorava aqueles beijos. Ele botava toda a raiva que eu o fazia passar nas próprias mãos, apertando meu quadril e cintura como se dependesse daquilo. Me beijava forte, duro, intensamente. Eu quase via estrelas, ficando úmida só com um toque da língua dele. Mal sabia ele o tanto de vezes que eu o tinha provocado só para ganhar um beijo daqueles...
– Eu ainda vou passar o natal com você. – Ele disse, maroto, ao que mordeu meu lábio inferior.
Rolei os olhos.
– Se você quer um surto de cólera o problema não é meu... – Dei por ombros, sentindo-o rir levemente contra minha boca.
– O que eu posso fazer? É o preço de estar com você, ovelhinha negra."
VOCÊ ESTÁ LENDO
Tudo de Mim
Short StoryEspontâneo. É assim que Isabel definiria seu relacionamento com Bernardo. Tudo havia acontecido de forma repentinamente natural. O mais estranho era que, mesmo após todo esse tempo, eles ainda continuavam juntos. "Entrelaçados aos lençóis um do o...