Pegando o ônibus

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Eu, Tomás, não vou deixar meu mundo desabar sem obter algumas respostas. No ponto de ônibus, estava pronto para ir com o motorista sem rosto, ver Léo ou qualquer coisa que não faça sentido. Não demora, logo chega, entro, não pago nada, apenas me sento numa poltrona ao fundo, desgastada com o tempo, sem olhar para o homem no volante. A noite estava fria, com meu casaco ainda fazia frio, dormente meus dedos... Onde estarei indo?

O rumo que o ônibus seguia, ia de mato à casas abandonadas, parques de diversões destruídos, lagos obscuros com uma nevoa pesada, deprimentes cenários em que a natureza sobressai o homem e suas construções. Um sentimento de desordem me ocorreu, onde foram os passageiros? Espera, desde que eu entrei não havia algum!

Algumas placas de paradas passavam, mas com o tempo, começou a não fazer sentido, mostravam números invertidos, incompletos, estranhos símbolos, o que significa isso? De repente aparece um número de celular numa delas, rapidamente este mesmo acaba tocando no meu aparelho, levei um susto na hora que percebo que tem os mesmos dígitos. O que está acontecendo? Calma, preciso de calma, não posso perder o controle. Respiro um pouco e clico no botão de atender. Atendo e a ligação vem com uma interferência:

"___Olá Tomás, volte para nós, sinto sua falta!"

___Quem está falando?

"____Sou eu, estou aqui, do seu lado!"

Eu sinto minha mão ser pressionada mesmo com o celular na mão e no ouvido:

___O que você quer?

"___Não vou te abandonar, te amo!"

Quando me dei conta era a voz dele, Léo, "te amo" ...Eu não estou bem mesmo, nem percebi sua voz, aquela que várias vezes me acalmou durante dores do passado. Logo o ônibus dá uma guinada com muita força, eu olho pela janela e vejo um túmulo, o dele. Levanto com muita pressa depois de ter caído com a freada, vou até o motorista e ele diz com o rosto virado para que eu não possa ver devido a escuridão, ou porque não tem uma face?

___Última parada!

Olho pra fora e vejo um cemitério, o que estou fazendo dentro de um? O ônibus estava dentro daquele lugar onde eles descaçavam, uma cova havia sido aberta, para mim? Parecia profunda, o que vou fazer? Quando decido voltar para dentro e falar com o senhor motorista, o que eu vejo me faz me tremer todo. Ele estava enferrujado, todo quebrado, a um minuto atrás ele estava bem, o tempo passou rápido e eu não percebi? A natureza dominou mais uma construção do homem...Minha sanidade! Começo a me agachar e começo a chorar... Se controle Tomás, se controle! Que agonia desse lugar.

Eu dou uma olhada um pouco em volta e nada mais de anormal aconteceu, tudo bem, tomo forças nas pernas meia calejadas, agora vou ver o tumulo. Léo..., eu preferia ter morrido contigo, é muita dor. Minhas lágrimas não param, na verdade nunca pararam, só as guardei...Ali parecia tão profundo, mas era o lugar que ele fora enterrado, eu decidi entrar, senti cheiro de mortos e flores nas lápides perto daqui, senti algo sólido em meus pés, havia algo no fundo do buraco, o caixão dele, eu o abri. Seu corpo não estava lá, apenas havia uma seringa, o que? Isso está muito confuso!

Sai dali com ela na mão, uma lembrança me veio à cabeça quando eu estava em seu velório: "Eu estava tão triste como agora e segurando a mão de alguém, eu parecia quase desacordado por não acreditar que ele se fora, eu ia desmaiar"

Há sangue dentro dela, ele estava doente? Sim, claro, era leucemia, tanta dor que estuou revirando que estava me esquecendo disso.

Eu pego a vacina e enfio no meu braço, e injeto, peço que eu morra pra não passar mais por isso, que coagule meu sangue, que eu sangre, se infecte com uma doença, sei lá. Logo perco a respiração e desmaio, justamente no tumulo de Léo, senti por alguns segundos como se fosse seu perfume...Aroma dopante, tão familiar, estava muito cansado para tentar lutar...Lutar para que? Que seja meu fim nesse cemitério de pessoas que um dia andaram nessa mesma terra que irá agora me engolir, alimentar de minhas entranhas.

De alguma forma, eu comecei a sonhar, será que nossa morte é um sonho também? Vi meus pais chorando muito, será que é realidade, me encontram aqui nas últimas, neste estado nesse túmulo?

Léo...Eu te amo, adeus...

Ouço ao longe muito fracamente alguém entrando em desespero, pedindo pra eu voltar:

"___Tomás! Volta! Tomás!"

Parecia um desespero caótico, quando eu levo um choque tão forte que a primeira vez eu escuto as pessoas mais claramente, mas logo parece enfraquecer novamente, parece tão bom me deixar ir, sensação de libertação e eu estou cansado de lutar, me deixem ir, vou me juntar a Léo...

Um segundo choque ainda mais forte me fez respirar com tanta vontade, que meu peito inspira violentamente, que acordei no tumulo, sem ninguém, levantei assustado, olhei em volta como se não entendesse. Cadê as pessoas? Sai correndo dali quando subi do buraco. Vi o ônibus inteiro me esperando, não estava estagnado pelo tempo e a sua companheira, a natureza. Entrei imediatamente e o motorista sem rosto agora tinha um rosto, só não sei de quem era. Isso nem importava mais. Quero ir embora.

Logo estava na estrada, passando pelos mesmos lugares. Eu liguei para o número de Léo...caixa de mensagem.

Qual seria a próxima explicação ou lugar que eu vou encontrar? Tudo está estranho, pego um cigarro e fumo, o motorista não havia pronunciado nenhuma palavra depois que entrei, um silêncio absoluto, apenas o motor da máquina. Ele estaciona na parada onde eu estava antes, olhei no relógio já com meu cigarro sendo amassado pelo meu sapato. Cinco da manhã, acho que preciso dormir um pouco, meu dia foi uma gama de sentimentos e acontecimentos bizarros. Chego em casa e tudo estava bastante quieto e calmo, parece que estou sozinho, quem sabe nessa loucura toda eu realmente não esteja?

Caio na cama desarrumada e parece que estou bem melhor, quem sabe, seja lá o que tinha naquela agulha com sangue, só espero que a morte seja breve, já chega de tantas dores por hoje. Desligo a luz do meu quarto...




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