Capítulo 17

610 8 0
                                    

---------------------

— Gosto de sonhar porque alivia os pés cansados de só andarem na terra — respondeu Lília.
Tampinha, continuou acariciando a parede da casa cor-de-rosa..

— Gonzaga era filho e neto de brasileiros. Como naquele tempo não havia universidade no Brasil, estudou em Portugal, onde foi juiz em uma pequena cidade. Voltou para o Brasil quando estava com trinta e oito anos. Vinha ser juiz em sua própria terra.
— Trinta e oito anos?
— Era um sujeito alto, bonitão, sonhador.. — tampinha suspirou. — juiz poeta, romântico, um homem que se preocupava muito com a sorte do povo. Naquele tempo, o Brasil vivia achatado pelos mandos da rainha de Portugal, D. Maria, a louca, sabe? Minas sempre foi a terra do ouro, e Portugal estava cobrando o quinto, isto é, um imposto atrasado. Quinto porque, de tudo que se produzia aqui, uma quinta parte devia ser entregue, obrigatoriamente, à corte portuguesa..
— Eu sei — disse Lília.

Enquanto a amiga ia dizendo aquilo, Lília olhou para a casa. Tentava imaginar o juiz observando a igreja, bem à frente, que, naquele tempo, estaria sendo construída. "será que ele dava umas olhadas para as garotas que passavam pelas ruas? Como tudo deveria ser diferente naquele tempo!"

— como juiz, Gonzaga sabia como o povo estava sofrendo — continuou tampinha. — Ai, começou a fazer poesias criticando a tal situação. Escreveu cartas chilenas, um protesto contra o mandonismo português. Naquela época, tinham de fazer tudo dissimulado ou o sujeito já preso como traidor. Gonzaga precisou chamar as cartas de chilenas porque, se as chamasse mineiras, acabaria na cadeia! Onde já se viu um juiz, o representante da rainha, criticar a própria rainha?
— É..
Tampinha deu um profundo suspiro e revirou os olhos.

— Ela estava com dezesseis anos quando viu o juiz pela primeira vez. Imagine só o impacto: uma adolescente sonhadora, bonita, de cabelos trançados, começando a conhecer o mundo e, de repente.. Tchantararam! — lá estava ele, imponente, de pé, os olhos faiscantes, em sua elegantíssima casaca de veludo azul-marinho, colete de seda, gravata de renda!
— Ela quem? — perguntou Lília, admirada.
— Maria Dorotéa Joaquina de seixas..
— Ah!
— menina, foi amor-coisa-de-louco! Imagine só: garota da mesma idade nossa de repente, dá de encontro com o homem da sua vida! Não é para o coração disparar? Se é! Pense em você virando a esquina e topando com o... O... Qual é o artista que faz o seu coração dar pinotes?
— Jhony deep — respondeu Lília, pensativa.
— eu prefiro Paul Newman, ai, aqueles cabelos grisalhos me dão um arrepio! Então, pra repartir já gostos, vamos imaginar a gente  topando assas "coisas" ali paradas, olhando, sorrindo... E esperando. Meu deus, derrete até chumbo!
— acho que derrete mesmo! — concordou Lília.

A ladeira da saudadeOnde histórias criam vida. Descubra agora