—Me falaram que ela estava sem os olhos.
—É, eu soube— Jack respondeu ao parceiro, que teimava em manter o olhar fixo no volante. Ele, porém, via-se acendendo, com um fósforo, o cigarro que pendia em seus lábios, mais preocupado em observar as calçadas vazias da cidade.
Embora tivesse que forçar a vista para suportar o vento intenso soprado em sua face. Detestava tanto carros sem capotas, havia avisado a Oz. No entanto, teimoso como o sujeito era, ignorou as dicas dele. Logo, Jack fazia questão de usar isso ao seu favor, como de costume. Ou seja, soprava a nuvem de fumaça de tal modo que esta fosse diretamente para o rosto do amigo, que respondia tossindo irritado, toda vez.
E foi exatamente o que acabara de fazer.
— E isso não te deixa alarmado?! — Oz indagou, coçando a garganta, surpreso com a reação casual do detetive, estacionando o veículo em cima da calçada.
—Já são dez anos nesta profissão. Se eu fosse ficar alarmado com cada psicopata que me aparece, teria enlouquecido no primeiro mês — concluiu, com um sorriso ladino, abrindo a porta sem muita delicadeza.
— Boa, arranque a porta do carro que compramos não tem nem um ano...
—Relaxa, Ward — caminhou livremente, desmerecendo o mártir material do parceiro que, por sua vez, o seguiu às pressas para não perdê-lo de vista, contratempo frequentemente enfrentado pelo pobre homem.
Jack jogou a guimba no gramado. E, ao pisar com o sapato de couro, sentiu as mãos pesadas de Oz em seu braço, pressionando o tecido de seu terno:
— Valeu por me esperar!
—Disponha — finalizou com sarcasmo.
É complicado dizer há quanto tempo os dois se conheciam. Talvez dois, ou três anos, no máximo. Porém, quando se trabalha sob a pressão constante de vida ou morte, a intimidade não demora muito para se manifestar.
E esse era o caso de Jack Johnson e Oz Ward.
Caminharam por alguns metros, em uma rua basicamente deserta, sob o céu cinzento de segunda-feira. As calçadas esmirradas da cidade abrigavam somente meia dúzia de casais embriagados, apoiando-se um no outro para não irem diretamente ao chão, cena que Jack gostaria muito de testemunhar, obviamente.
Poucos carros seguiam pelo asfalto, o ar estava limpo, sem aquele aroma de poluição atmosférica invadindo às narinas dos pedestres.
O caso da vez tinha um nome imponente: Marjorie Montgomery. Ela morreu domingo, dia três de outubro de mil novecentos e trinta e cinco. De acordo com o delegado, foi encontrada por um funcionário do circo, hoje pela manhã.
Ela era conhecida como A bailarina. Quem a via dançando, afirmava nunca ter visto nada mais gracioso, o que não passava um exagero descarado, é claro. Marjorie, definitivamente, possuía um dom que poucos tem, quer dizer, uma característica: A beleza. Se a mulher dançava bem? Pode-se dizer que sim. Contudo, não é muito normal que bailarinas tenham tanto sucesso assim, principalmente se o ritmo da dita cuja é ao som de música clássica sendo tocada por um péssimo pianista.
É um fato que Jack passara as últimas horas confabulando sobre as informações obtidas:
-Bailarina, fama.
-Beleza, loucura.
-Marido, ciúmes.
Quando o morto é uma celebridade, o investigador subitamente já refletia sobre os suspeitos, afinal, não era muito difícil imaginar os possíveis responsáveis. Se não tratava-se de um obsessivo homicida, o crime ou seria passional, ou seria suicídio. E, aparentemente, eles poderiam cortar a última opção.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Entre Tangos & Tragédias
Mystery / ThrillerEm 1935, a bailarina mais famosa de Nova Orleans foi encontrada morta. Marjorie Montgomery estava com o tule branco ensanguentado, e montada no carrossel próximo à atual localização de seu circo, o Guadolomon. Os olhos verde-esmeralda foram rouba...