Capítulo 24 - Piloto Automático

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Jack e Dana acostumaram-se à escuridão.

Haviam optado por se esconder no quarto minúsculo da pensão que Dana residia. Era abafado e sombrio; pouquíssimos raios de sol atravessavam pelas persianas; sempre fechadas.

E para eles, o tempo simplesmente não passava. Eles fugiam dele; os dias escorriam, mesclando-se ao próximo, sem qualquer diferença entre o que ontem fora e o que o amanhã seria. Jack e Dana não saíam do lugar. Estavam constantemente deitados, um de frente para o outro. Identificavam-se pelos toques sutis, seus dedos percorrendo cada traço do rosto alheio, pouco a pouco permitindo que se conhecessem.

À noite, quando tudo escurecia, eles se levantavam. Tomavam banho, e escapavam aos bares da redondeza. Bebiam ao que seus corpos conseguiam aguentar; a embriaguez aproximando-os cada vez mais, dia após dia; a melancolia sendo trocada, noite após noite.

Beijavam-se calorosamente em becos vazios; depois das danças agitadas que protagonizavam madrugada adentro. Dessa forma, o vazio era escondido. Tanto um, quanto o outro sabia que ele continuava a existir, mas sempre que ele ameaçava se manifestar, Jack e Dana se submetiam a mais um drinque, a mais um toque, a mais uma dose daquele vício crescente ao qual estavam decididos a não se esquivar.

Mas em determinada noite, a quinta ou sexta dentro daquele ciclo intenso e perigoso, Dana Hill despejou seus olhos aos de Jack Johnson por mais tempo que o habitual. Não os afastou. Enquanto pôde, ousou sustentar aquela troca profunda.

Eles haviam acabado de retornar à pensão. A madrugada aproximava-se de seu fim, e o céu começava a clarear. A luz que entrava era pouca, apesar de intensa. Ela escapava em finos retângulos que se desenhavam sobre o papel de parede, decifrando o que a penumbra tornava incompreensível.

A luz invadiu os olhos dele. Dana compreendeu, que até aquele instante, não os tinha visto durante o dia — não de verdade; atentando-se ao esmaecer suave que o azul turquesa fazia ao chegar à pupila; à forma que eles brilhavam, tão intensamente que seu corpo exausto se acendia ao examiná-los. Eles eram reluzentes.

Adormeceu submersa naquela sensação de serenidade. Cada emoção que sentia reinava sobre a anterior. Ela estava determinada a não se permitir se  impregnar com nada, concentrada e obstinada em permanecer oca; prestes a ser preenchida pelo que o destino quisesse lhe oferecer.

Mas quando seus olhos fecharam, tudo o que viu foi o mar. Mares sob o céu do verão, parecendo tentadores ao amanhecer.

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— Ei...

Jack escutou um sussurro delicado retirá-lo da penumbra de seus sonhos. Abriu os olhos vagarosamente; a visão turva identificando os cachos ruivos ao redor do rosto de boneca de Dana Hill. Eles caíam ao redor do detetive, capturando-o para mantê-lo sob o controle das grandes e suntuosas íris azul-claras.

— Bom dia — balbuciou ele, ainda sonolento.

Dana sorriu, beijando-o na bochecha. Ela cheirava ao perfume dele combinado com sabonete; havia acabado de sair do banho.

— Vamos fazer algo diferente hoje? — perguntou ela, sentando-se sobre os pés e colocando parte do cabelo atrás da orelha.

Jack suspirou, piscando rapidamente para despertar. Em seguida, apoiou-se nos cotovelos para conseguir encará-la.

— Diferente em que sentido?

Dana ajeitou seu roupão e levantou-se da cama, caminhando em direção à janela. Ela subiu as persianas devagar, revelando o vibrante começo de tarde de sábado que conduzia a cidade.

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