Capítulo 5

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   Depois de uma hora a conduzir finalmente a velha quinta apareceu na minha vista. Parece uma quinta normal com plantações e alguns animais, mas não o é. Quem me interessa é o seu dono. Michael Etum, aparenta ser apenas um homem normal de 50 e poucos anos mas de normal não tem nada. De certeza que ele me ouviu chegar mas não se incomodou em parar o que fazia e de me vir receber. Mas sem problema pois rapidamente o encontrei no celeiro a alimentar os cavalos que começaram a ficar violentos e inquietos assim que me aproximei. 

-A que devo esta desagradável visita? - pergunta Michael com toda a calma possível mas com um expressão de ódio no rosto ao ver-me. 

-Nem um "Olá "? Que rude. -Gozei

-Vai direta ao assunto. O que podes tu precisar de mim? - pois o que posso eu, filha do reino das trevas, precisar dele, um ex guerreiro da legião da pena? Ele já foi um anjo. Um anjo do lado de Deus. 

-Informações. - continuei ao falar ao ver a expressão de desentendido no seu rosto. - Já ouviste falar da Ordem do Fogo? - 

-Rumores apenas, nada que tu já não saibas. Dizem que um grupo de revoltosos se está a virar contra o teu pai. Ter aquela profissão de certo faz muitos inimigos. -Agora foi a vez dele de gozar com a situação. 

-Inimigos esses que acabam sempre mortos. Ninguém consegue fazer frente ao meu pai e sair a ganhar. Por isso querido Michael, tens a certeza que não sabes de mais nada que me possa ser útil? Como é que tu, que tens um grande ódio ao meu pai, pode recusar por exemplo uma oferta destes revoltosos? Como posso ter a certeza que tu não és um deles? Nesse caso teria que te matar. 

-Não passas de uma criança que não sabe de nada! Por muitos motivos que eu tenha contra o teu pai, ele não merece a minha atenção. Não quero saber dele nem de quem o odeia. - aproximasse de um dos cavalos e começa a penteá-lo para o permitir relaxar . - Deixei essa vida. Já não deposito a minha fé em ninguém. O teu pai matou todos os meus amigos e deixou-me viver para eu poder sofrer para sempre com isso, e Deus não o impediu. Nem sequer me deu a honra de poder tirar a minha própria vida. Ambos são homens desprezíveis. Por eles só sinto pena. - e por momentos naqueles olhos de um homem cansado eu vi a verdade. Ele é melhor homem que Deus e o Diabo juntos. 

-Pelo menos uma pessoa teve juízo no meio desta história toda. -referi-me a ele. - Está descansado, não desconfio de ti. E se quiseres posso fazer-te um feitiço que te protega de tudo o que não é humano. Não serás atacado por nenhuma das partes. 

- Achas que é isso que eu quero? - pergunta-me olhando-me nos olhos - Se realmente queres fazer algo por mim, faz o que o teu pai não teve a misericórdia de fazer. - e nesse momento eu soube o que ele me estava a pedir. - Mata-me. Eu sei que não és como o teu pai. Pelo menos não ainda. Ninguém irá saber que foste bondosa para comigo. Por favor. 

  Ele pega na minha mão e leva-a a sua cabeça. Não consegui conter as lágrimas. Este homem mostrou ser mais digno que qualquer outro que eu já conheci. Foi traído e abandonado por todos os que já amou e obrigado a viver com isso. Ao fim disto tudo ele não quer vingança, ele só quer poder morrer para parar com a sua vida por tortura. Sem dizer nada, assenti positivamente sabendo que se falasse provavelmente a minha voz iria falhar. O brilho que apareceu nos seus olhos sabendo que ia morrer mostrou a alegria e a paz que ele sentia. Antes de eu lhe tirar a vida ouvi-o a  dizer as suas últimas palavras, eram minhas e sobre mim :

- Não te tornes neles. 

   O seu corpo sem vida caiu-me aos pés. Agora estava sozinha naquela quinta, apenas eu e as minhas lágrimas. Como é que um breve diálogo me deixou neste estado? Eu devia de estar a espalhar maldade e crueldade neste planeta mas será que são eles que estão a espalhar algo em mim? Eu não sou assim. Não o posso ser. O caminho de volta à cidade foi inteiramente para me recompor. Eu estou aqui numa missão. Ser má. Nada mais que isso. 

   Já era de noite quando decidi ir para o meu apartamento. De tudo o que vi durante o dia na cidade, nada foi mais estranho do que vi à porta do meu apartamento. Oliver estava encostado à porta a dormir no chão. Esqueci-me completamente dele. Temos pena. Será que ele não se cansa? Passei por cima dele e abri a porta fazendo-o cair para dentro do meu apartamento. Acordou com o impacto mas eu não liguei.

-Podias ter-me acordado de forma menos violenta. - reclama ao levantar-se do chão.

- O que raio fazias à minha porta? - Depois do dia de hoje não tenho paciência para tentar ser simpática.

-Eu disse-te que te ia ajudar.

-Eu acho que ainda não percebeste uma coisa: eu não preciso de ajuda. Eu trabalho sozinha. Não há nada que tu me possas ajudar. É bom que voltes à tua vida e esqueças que eu existo. 

-Mas Sarah... - não o deixei acabar.

-Mas Sarah nada. Sai! Isto não é um pedido, é uma ordem. Não me obrigues a magoar-te. - apontei para a porta ainda aberta. Ele pareceu ainda tentar me responder mas desistiu.

- Como queiras! - soou derrotado mas irritado ao mesmo tempo. Saiu e deixou-me sozinha. Finalmente.








A filha do Diabo. ✔Onde histórias criam vida. Descubra agora