Naquele dia, a batalha havia terminado. O momento de verificar as baixas chegara e, mesmo não sendo responsabilidade do Capitão-general, Donato fazia questão de cumprir com esse ritual. Tanto fazia se os homens que ali jorravam sangue fossem os dele ou os do oponente. Vitória ou derrota? Não importava. Seu mundo, seu quadro estava predestinado a guerrear até o final dos tempos. O poder ditava o jogo e excitava-o. A sensação de dever cumprido dominava seus sentidos a cada rosto sem vida que suas botas pisoteavam.
Vida! Você tem vida.
As palavras do antigo mestre ecoavam em sua cabeça. Somente após a sua morte, Donato conseguiu entender o que ele lhe falava. Não existia, mas vivia. Essa descoberta fez toda a diferença.
Donato sentiu-se vigoroso, capaz de ir além e expandir seus horizontes de dominação. Seguiu as orientações do mestre e se impôs. Nenhuma criatura ousou ir contra ele ou contra suas ordens quando o viram aniquilar parte de um mundo ao destruir um quadro. Ele, apenas ele, era digno de tal conhecimento. Num estalar de dedos, podia extinguir qualquer quadro que julgasse necessário.
Donato dominava Picta Mundi. Todos o temiam.
O medo é melhor que a idolatria.
Não queria aceitação, queria obediência. Porém, a presença de familiares do mestre poderia pôr tudo a perder. Não permitiria que reivindicassem Picta Mundi ou que o destruíssem. Ele era o único que tinha o direito de ter qualquer tipo de influência no mundo. Lutaria com todas as suas forças e armas, sendo capaz de absolutamente tudo para obter êxito.
— Misericórdia, senhor... — disse uma voz fraca.
Donato parou de caminhar quando escutou o lamento. Ele olhou ao redor, tentando identificar de qual lado vinha o som.
— Senhor...
O vento trouxe a voz da esquerda e para lá andou, sem cuidado algum, pisando nos corpos como se fossem pedaços de troncos espalhados na relva. Viu uma mão se erguer com dificuldade, revelando quem clamava por misericórdia. Ele se aproximou e reconheceu o uniforme do seu exército.
— Me ajude...
O homem tossiu sangue, sujando ainda mais as vestimentas.
— Estou... muito... ferido... — implorou.
Donato observou-o. Mesmo que amputasse aquela perna gravemente ferida, o homem poderia ser salvo, se agisse naquele exato momento. Não daria tempo de voltar ao acampamento e ordenar que alguns homens tirassem o ferido dali. Ele mesmo teria que carregá-lo de volta, arrastando-o por mais de um quilômetro.
— Prestarei assistência — Donato anunciou, solene.
Ele viu o sorriso deformando o rosto do infeliz. Nos olhos, a esperança de vida. Então se abaixou. O homem esticou os braços, num gesto esperançoso por um apoio para se levantar; mas Donato não o tocou. O homem percebeu e suas sobrancelhas se uniram em desconfiança.
A espada de Donato tilintou ao deixar a bainha e atravessou silenciosamente o coração do moribundo.
— É assim que tenho que agir. — Donato puxou a espada de volta. — Sem piedade, quando mais esperam por ela.
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Picta Mundi
FantasyA vida da jovem Letícia virou de cabeça pra baixo após a morte de Raul, seu pai. Até mesmo o colégio onde estuda, o renomado Dippel - um reduto de jovens prodígios, perdeu a pouca graça que tinha. Mas as coisas começam a mudar quando descobre que o...