XXIX. Não vai me mandar pro inferno no seu lugar.

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Música indicada: Someone you loved

Seria loucura demais contar aos meus pais que conheço um anjo? Pensava ela. Ainda não tinha aberto os olhos, mas escutava sua mãe rezando ao lado da cama quase vinte e quatro horas por dia. Pelo menos achava isso, já fazia um dia que ela estava ali? talvez estivesse com a noção do tempo alterada. Deitada na cama do hospital e coberta de curativos, Eloísa se perguntava o que tinha acontecido desde que apagou dentro do carro prestes a pegar fogo. Será que cheguei a me queimar? Assustava-se ao pensar. O fato de seus pais estarem ali era ótimo, mas o motivo não. Eles com certeza iriam querer respostas sobre o acidente e, notou, havia se tornado a pessoa sem respostas.

Quando finalmente conseguiu abrir os olhos, não era sua mãe que estava lá. A garota com os olhos castanhos mais intensos que El conhecia quase deu um pulo para trás. Ela queria tanto contar toda a verdade para a Melissa que seu coração doía em pensar que não podia. Ela não entenderia. Ninguém entenderia. Os médicos entraram e a menina apagou novamente. Quando acordou, os cabelos marrons de Mel estavam sobre seu braço direito e ela teve que mexê-lo um pouco para chamar a atenção da garota que parecia dormir. A menina levantou sus olhos cobertos por óculos e sorriu, mostrando o aparelho.

Apenas encarava Melissa quando seus pais atravessaram a porta e ela não conteve o choro. Estava extremamente feliz em vê-los. Seu pai usava seu terno preto e estava com os olhos castanhos claros cheios de lágrimas, os fios grisalhos brilhavam com a luz do sol que entrava pela janela do quarto atrás da cama da garota. Sua mãe tinha olhos inchados e fungava quando foi até a filha. Eles a abraçaram juntos, o que era bem estranho de se ver nos últimos meses. Ela se preocupou apenas em manter os olhos fechados e senti o calor que transcendia pelos dois em sua direção.

Se existem diversas formas de dizer eu amo você, aquele abraço certamente era uma delas. O cheiro do perfume forte e marcante do pai, o jeito que sua mãe lhe acariciava os cabelos. Fazia tanto tempo que ela não se sentia minimamente segura quanto naquele instante. Seus irmãos entraram correndo no quarto, seguidos por um enfermeiro. Eles pararam confusos ao ver a irmã sendo abraçada A mãe repreendeu, soltando Eloísa e ela choramingou, não queria que a mulher se afastasse e segurou sua mão. Suzane chamou os dois até a cama com um gesto e o enfermeiro se foi. Ela os colocou sobre a cama e eles abraçaram a garota, que gemeu quando um deles esbarrou em seu braço.

Ela havia ficado três dias desacordada e a carteirinha da faculdade foi o que ajudou a identificá-la, mas Eloísa se lembrava com plena certeza que não estava com nenhuma identidade na hora do acidente. Não existia mais nada com ela, nem mesmo sua bombinha, que depois foi levada pelos pais. As horas passaram e o dia logo foi embora, seus pais não pediram explicações, ao contrário do que esperava, mas ela sabia que isso não duraria para sempre. Estava pensativa, não queria dormir, mas também tinha medo de ficar acordada. Sua mãe quase implorou para ficar com a filha, mas cedeu a Melissa, que ocupou a cadeira ao lado de Eloísa.

A garota queria ir para casa, desejava fingir que nada daquilo tinha acontecido e que ela não tinha sofrido um acidente tão terrível de carro porque estava fugindo de... demônios e indo atrás de uma lança... de diamante, com um anjo e um fugitivo do inferno. Se pensasse muito, ficaria louca. Infelizmente, sabia que não tinha muitas opções. Eloísa não tinha como simplesmente sair fora, mesmo que não tenha escolhido entrar em momento algum. Mas, havia tentado raciocinar sobre o dia do acidente e, de todas as conclusões, apenas uma era coerente: foi deixada. Lupita e Enzo tinham desaparecido quando mais precisou deles e ela não conseguia entender.

— Eu sinto muito — sussurrou outra voz depois que Melissa saiu e estava se aproximando

— Vai embora — pediu, sua garganta doía e sua voz saiu rouca. Sentia o vento que veio da janela minutos antes fechada. Seu coração não acelerou e ela não sentiu medo, sabia muito bem quem era. Já cansada de todos os rodeios que sabia que ele daria.

FUGITIVOS DO INFERNO 01 - Ciclo Da Era [COMPLETO]Onde histórias criam vida. Descubra agora