I - Zoe

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A emoção da caçada,o vento batendo no rosto, a presa em fuga por sua vida, era sempre uma luta pela sobrevivência, entre o necessário e o direito à vida.
_Sinto muito, mas ou levo você pra casa ou teremos sopa de rabanetes outra vez...
O gamo me olhou como que duvidando da minha coragem, ele parecia desdenhar da minha mira, movendo-se em zig-zag entre os arbustos, mas não poderia saber que aprecio desafios...
_Perdoe-me...mas, é necessário...

Retesando o arco ao máximo, mirei na nuca do animal. A flecha encontrou em poucos segundos seu alvo, fazendo-o cair inerte ao chão.
Isso foi o que aconteceu! Nada mau para um início de dia!

A vida em Haloway estava cada vez mais difícil, os animais, assustados, talvez com algum grande predador,  migravam para as planícies de Áven e não nos restaram muitas opções de caça. O último inverno nos custara a vida de dois bravos homens, soterrados por uma avalanche enquanto buscavam suprimentos. Um deles, foi Télix, sua esposa deu à luz, ao pequeno Laos, logo após a entrada do frio, foi difícil para Alina manter viva a criança com tão poucos recursos na aldeia. Os alimentos eram racionados e aquilo que cada família conseguia guardar, era decisivo entre viver e morrer. Havíamos planejado melhoras para o armazenamento quando fomos surpreendidos por uma mudança brusca de temperatura como se o inverno resolvesse que era hora de chegar. Télix foi aventurar-se para além dos limites seguros de Haloway, na tentativa de aumentar as chances de enfrentar o rigoroso frio invernal e ver crescer seu filho.
Quando Ágabus e Télix não retornaram, sabíamos que aquele seria um dia de sombras...
Ainda aguardamos durante três dias, mas foi em vão. A dolorosa missão de dar a notícia coube a Melênios, o ancião.
Há muito tempo nosso povo luta para superar cada obstáculo, seja ele natural ou...não.  Após a grande e terrível guerra que varreu a humanidade,os sobreviventes migraram, buscando lugares onde pudessem recomeçar, povos de todas as línguas e nações se misturaram, hoje não há raças distintas, somos todos um só, melhor assim, as diferenças mataram quase todos nós.
Nossa tribo é composta de vários clãs, cada um serve de alicerce a um delicado equilíbrio, mantido por um código de honra que é passado de geração a geração.
Meu pai, Seth Geller, faz parte de uma linhagem de sacerdotes, homens de fé, e antes dele meu avô também era...eles lutam, tentando preservar os ensinamentos e não deixar que sejam esquecidos, na esperança de que a humanidade olhe outra vez para além das montanhas em busca do Criador de todas as coisas.

A tristeza de Alina só era amenizada ao doar seu leite para afugentar a fome do pequeno Laos. Suas lágrimas ainda a acompanhariam até a primavera, até podermos resgatar os corpos dando-lhes um sepultamento digno.
Hoje faz exatamente um ano que realizamos a queima dos corpos. O pequeno Laos está forte e corre toda a aldeia, seu corajoso pai teria orgulho dele.

Nossa aldeia ficava protegida por uma floresta e tínhamos a água fresca do rio Acbor.
Isso facilitava nossa permanência e manutenção na região, poucos se atreviam às grandes viagens migratórias, isso garantia um pouco de tranquilidade, estranhos não apareciam por essas bandas desde que meu pai um jovem recém casado, cheio de sonhos...

Às vezes fico tentando imaginar como seriam as outras aldeias, se é que existiam...como seriam seu povo? Seriam cultivadores como nós?
Meu pai sempre aconselhava os jovens da nossa tribo a não tentarem ir além dos limites de Haloway. Dizia...não entrem em caminhos, que voltando, tragam junto de si o mal...

O clã dos guerreiros tinha a incumbência de fazer a proteção de todos. Entre eles havia um jovem chamado Zofar, ele acha que não sei ficar longe de encrencas... e vive tentando ser minha sombra, não preciso que me protejam.

Somos cerca de cento e cinquenta e três almas em Haloway, de origens variadas, chineses, ingleses, gregos, islandeses e canadenses. Meu pai é descendente de gregos, minha mãe canadense e eu...eu sou apenas halowee.
Respeitamos a cultura de cada clã, desde que os costumes não sejam danosos  para nossa tribo.

Não existe nenhuma restrição a casamentos entre diferentes clãs, aliás, a liberdade é um dos nossos maiores tesouros...
Ah! E não somos "índios", ou seja, criaturas primitivas, vivemos civilizadamente, procuramos preservar os conhecimentos passados pelos mais velhos, sabemos o quanto havia de tecnologia no passado, que agora tornou-se inviável, na verdade tudo que o mundo foi um dia, se perdeu, talvez pra sempre...

Meu nome é Zoe Geller, tenho 18 anos e meio, alguns acham que já estou na idade de casar, só não sei por que isso tem tanta importância...afinal, eu não farei falta  ao povoamento da terra ,existem muitas garotas que só pensam nisto, que elas se casem!
Eu sempre tive a sensação de que de repente tudo poderia mudar.
Estava certa.

O Despertar da LuzOnde histórias criam vida. Descubra agora