XXXIII-Zoe

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Ao despertar, só havia uma cadeira a seu lado com uma toalha de algodão sobre ela. A água ainda estava morna quando saiu da tina. Vestiu-se e comeu apenas as frutas, de tudo que tinha naquela bandeja.
As servidoras  não retornaram.

O livro sobre o suporte atiçou sua curiosidade...era um volume bem grande escrito a mão, sua capa de couro tinha delicados detalhes de arabescos recortados de forma habilidosa...conhecia aquela língua, quando era criança uma velha senhora chamada Abigail, lhe ensinara. O som de sua voz melodiosa recitando versos que falavam de seu povo e contavam da glória do passado, quando reis governavam em nome do Criador de todas as coisas..._Elohim...!_disse, lembrando-se de como aquela palavra fazia arder seu coração...as canções...nada em sua aldeia proibia aquela mulher de falar, mas ela sempre preferira manter-se afastada, como se vivesse em um mundo à parte.

Mais tarde veio a saber, muito idosa, Abigail, era a única sobrevivente de uma grande família, não gostava de mencionar a perda de seus entes queridos.
Mas, ao ver uma garotinha de lindos olhos de céu, sorriu novamente, deixando a melancolia que até então fora sua prisão, do lado de fora de seu velho coração, e passara a ensinar-lhe tudo sobre o grande passado de seu povo...e o Deus invisível...
Três anos inteiros...foi o tempo que desfrutaram uma da outra, até que se foi...
As lembranças retornaram como sucessivas ondas, as histórias, canções e versos, voltaram enchendo sua alma, como se houvessem permanecido adormecidas em algum canto da sua alma! Não houvera uma só vez em que não ansiara ouvir outra vez aquelas canções e os versos...mas, a morte de sua querida amiga, levara também  um pouco de si...

Zoe leu cada palavra e reconheceu as histórias ali descritas...horas se passaram sem que se desse conta._Raboni...rs..era assim que ela o chamava..._recordou-se, com saudade_Adonai...!
Ao terminar a leitura teve a sensação de que alguém a chamou, mas estava só. _Onde estariam os outros?...Kalel..._pensou,_ certamente estariam bem, não havia motivos para preocupação, afinal, ninguém ali lhes faria mal.
_Sim!_respondeu, pois ouvira outra vez seu nome._quem está aí?
Haviam duas portas na câmara onde estava, uma delas, foi por onde entrou, a outra estava oculta por um tecido muito delicado que pendia desde o alto, até tocar o chão, como um véu finíssimo, exatamente igual ao do traje que lhe reservaram...uma lamparina acesa estava presa por um gancho, pegou-a e passou pela segunda porta. Não sabia explicar porque, mas sentia que deveria seguir em frente. A temperatura dentro da montanha era agradável, as tochas iluminavam o trecho onde agora passava, tratava-se de um salão, uma outra passagem levava à uma escada, decidida a descobrir quem a chamara, subiu. Era semelhante uma serpente que enrolada enrosca-se num tronco, assim era a escada que alcançava o coração da montanha. Subindo sem parar, finalmente chegou em mais um salão, mas esse era diferente...havia uma abertura no topo, por onde podia passar a luz da lua, _...Anoiteceu e só agora percebi..._pensou.
_Quem está aí?_perguntou uma voz vinda de uma parte mais afastada de onde parara.
_Meu nome é Zoe...perdoe-me por perturbar seu descanso...
_Você não perturba...na verdade demorou a vir e por pouco não nos encontramos...já está chegando minha hora de partir...
_Desde que aqui cheguei,  ouço que estiveram à minha espera...como pode ser isso?_disse aproximando-se.

_Há muito tempo...foi-me confiado algo... que deveria passar para você quando chegasse a hora...
Temi que não estivesse aqui no momento da minha partida...mas como sempre... Aquele que a tudo mantém sob sua palavra, não falhou em trazê-la até aqui para cumprir o que predisse...
_Perdoe-me...a senhora é Hadassa?
_Oh! Minha criança...há muito não ouço este nome!...assim me chamavam quando minha pele era tão fresca e jovem quanto a sua...hoje sou apenas a Anciã...
A velha senhora estava em sua recãmara coberta por peles, aparentava ter mais de cem anos,,,seu semblante transmitia a mesma serenidade do homem que os recebera.
_Aproxime-se minha jovem...sente-se aqui!_disse tocando o lado de sua cama._...espero que ainda saiba ler nossa língua, que os anos não tenham apagado de sua memória tudo que Ele plantou..._disse entregando um pergaminho._...coma criança, no rolo está escrito a seu respeito...pois não há mais tempo...assim como não há mais luz em meus olhos...o mal cegou o coração dos homens...e apagou neles a chama que os unia ao Criador.
O rolo feito de papiro, assim como o livro que esteve lendo, trazia um texto em aramaico, uma antiga língua...o texto falava de um antigo povo que adorava o Deus invisível, que os homens rejeitaram, perseguiram seu povo, matando a muitos...isolando-os...na tentativa de apagar a memória do seu nome...quase toda sua história foi perdida e aqueles que se atreviam mencioná-lo eram hostilizados, até que a terra se calou e não mais clamou nem fez menção de seus feitos...mas, uma profecia foi deixada como uma centelha pronta para iniciar um grande incêndio.

_O rolo fala de mim...? Mas, como pode ser?!_perguntou confusa.
_Não se preocupe minha querida...apenas leia..._falou amorosa.
E com o coração em sobressaltos, começou a ler..._"Farei brotar da terra uma como figueira temporã suas raízes serão fortes e seus galhos lançaram renovos de si por toda terra e os filhos da alva cantarão novamente cânticos de exaltação ao seu rei e os filhos dos homens dele se lembrarão para lhe render glórias por sua bondade, pois sua luz outra vez será manifestada entre eles! As trevas já não lhes impedirá, seus braços despojarei de força e no seu laço os prenderei por toda eternidade, quando outra vez sua voz nos montes ouvir meu nome clamar, farei que caiam todos os seus grandes e não mais existirão. No meu Monte as vozes dos arpistas cantam a vitória dos inocentes, como pequeninos recém nascidos correm sedentos ao colo de seu pai, assim será aqueles que por seus corações retornarem a mim..."

O Despertar da LuzOnde histórias criam vida. Descubra agora