XII-Kalel

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Zofar foi um dos homens que levaram o estranho até a casa dos Geller. Agora estava diante da janela de Zoe tentando imaginar o que acontecia la dentro, já que sabia onde ele passaria a noite.
O ciúme consumia seu coração e lhe tirava o sono, pensando que talvez fosse um espião...um malfeitor foragido... Ainda levaria um bom tempo até que desistisse de montar guarda e voltasse à sua própria casa.

Zoe olhava pela janela enquanto via Zofar se afastando depois de ficar parado embaixo de sua janela olhando fixamente em sua direção.
_Até quando confundirá seus sentimentos...?_pensou, lamentando o que ele pensava sentir.
Nesse instante o estranho agitou-se na cama. Sua mãe a previnira a respeito da possibilidade do doente começar a delirar.
Ele estava suado, e balbuciava palavras desconexas, seus lábios mexiam trêmulos...pronunciando um nome...
_Quéren!..Quéren...não! Malditos! Soltem!
_Calma! Você está seguro aqui..._disse com firmeza, mas brandamente, aplicando sobre a testa dele um pano molhado para baixar a temperatura.
Havia lágrimas em seus olhos enquanto balbuciava aquele nome feminino...uma expressão de dor retorcia seu rosto.
_Deve ser alguém que ele ama, mas o que terá acontecido? Quem fez isso com você?_pensou.

O estranho voltou a adormecer, a respiração ficando leve e compassada, mas continuava febril. Não era a primeira vez que cuidava de alguém ferido, na verdade sempre ajudou sua mãe a cuidar dos doentes e feridos em caçadas. Mas, desta vez, algo naquele estranho tocava profundamente seu íntimo, como se já o conhecesse...

Estava deitada na rede sem sono, já era hora de trocar o curativo.  Aproximou-se silenciosamente, pegou o pano limpo e embebeu-o na mistura que sua mãe preparara, estava pronta para aplicar, mas com um movimento rápido o estranho segurou seu pulso com força. No quarto fracamente iluminado,  não saberia dizer quem estava mais surpreso.
_Quem é você?_perguntou Kalel com os olhos semicerrados, sua voz rouca, soava desconfiada, e havia um tom de fúria que não compreendia.
_Meu nome é  Zoe, agora solte-me, está tudo bem, está seguro aqui, só queremos ajudar...
_Quéren...vamos! Não há mais tempo...
O estranho, apesar de estar de olhos abertos, ainda delirava. Preso  numa espécie de pesadelo, confundia realidade e sonho.
_Não sou Quéren, solte meu braço, vai ficar tudo bem.
Olhando direto em seus olhos, ele pareceu despertar, mas voltou a deitar-se, exausto pelo esforço.
Alguns minutos e ele largou seu pulso, parecia-lhe custoso deixar aquele contato.
Então, limpou e refez o emplastro, acomodando-o outra vez nos lençóis.

Ele permaneceu quieto o resto da madrugada, preocupou-se, levantando algumas vezes pra checar se o paciente respirava, manteve-se em alerta e  viu o dia amanhecer.

Apenas quando sua mãe entrou em seu quarto com uma nova mistura de ervas, relaxou e fechou os olhos, permitindo que o cansaço a dominasse, adormeceu.
Algum tempo depois, ainda sonolenta, ouviu uma voz grave e imediatamente lembrou-se do estranho deitado em sua cama...

_Obrigado... por tudo. _disse Kalel com a voz rouca.
_Não me agradeça, Zoe é quem passou a noite ao seu lado._disse sua mãe terminando de servir a sopa ao paciente._A propósito, como podemos chamá-lo?
O estranho fez uma careta e levou a mão à cabeça, como se estivesse com dor.
_Lamento por isso...tenho algo que pode aliviar._disse pegando uma pequena raiz_Mastigue isso, vai se sentir melhor, logo estará novo em folha. Agora, descanse, ainda é muito cedo, durma e recupere suas forças._ disse saindo.

Sua mãe tinha uma grande capacidade de acalmar aqueles que estavam convalecendo sob seus cuidados.
Não havia dor que persistisse por muito tempo diante de seu profundo conhecimento sobre remédios naturais.
Todos na aldeia recorriam aos seus conhecimentos.

O estranho tossiu, provavelmente por causa da raiz. Aproximando-se da cama, apanhou água.
_Tome isso,_disse oferecendo o copo. _vai ajudar a engolir.
_Obrigado, aquela senhora...
_Minha mãe, Zaira.
_Sim...ela disse que você cuidou de mim durante toda a noite, pensei que estivesse sonhando...eu fiz isso..._disse ele tocando seu braço marcado.
_Não sabia o que estava fazendo, esteve delirando a maior parte do tempo.
_Você cuidou de mim, e eu agradeço machucando-a..._disse ele em tom de lamento.
_Não sinta-se mal por isso. Estou acostumada a ajudá-la, minha mãe cuida de todos que precisam, desde uma simples dor de barriga à uma perna quebrada.
_Hum...arh..._gemeu Kalel, levando a mão ao ferimento.
_Você precisa descansar...não fale mais.
_Seu nome...é bonito...
_Você... sabe o meu nome?
_Há outra jovem...nesta casa, além de você?
_Não, só eu mesma...
_Então..você deve ser Z...seu nome é...Zoe..
_Sim...rs...é. E o seu...?
_Kalel...me chamo...Kalel..._disse ele baixinho, fechando os olhos, adormecendo em seguida, ainda estava fraco. E a raiz tinha propriedades sedativas que serviam como um analgésico natural.

_Kalel...rs..._repetiu pra si mesma.
Olhando aquele rosto adormecido, agora, à luz do dia, dava pra ver cada detalhe dos traços fortes e bem feitos...a barba por fazer dava-lhe um ar rude, mas as palavras gentis demonstravam o contrário. Seus olhos azuis tinham um ar triste_...Talvez esteja assim por causa de Quéren...talvez seja uma mulher..._pensou estranhamente incomodada.

O Despertar da LuzOnde histórias criam vida. Descubra agora