Capítulo Nove

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Nos conhecemos quando eu tinha nove anos.

Embora eu não me lembre a mamãe vivia contando que ele estava brincando com seus amigos no parque e eu pedi pra brincar junto, ele não deixou, é claro... então eu chutei seu joelho e o fiz chorar.

Minha mãe e sua vó eram amigas, nos víamos quase todas as tardes depois daquele dia... e mesmo achando aquele parque completamente sem graça, eu continuava indo porque sabia que iria encontrá-lo lá.

Depois disso nos tornamos melhores amigos, saíamos juntos pra brincar, estudar, almoçar... Vivíamos juntos o tempo inteiro.

Era engraçado como antes daquele dia ele sempre esteve presente na minha vida, mas eu nunca tinha me dado conta disso.

Seu pai e sua mãe nunca mereceram o título de "pais", era estranho o porquê disso tudo, mas sua mãe só podia engravidar uma vez, ela fez diversos tratamentos pra isso e o sonho da sua vida era ter uma filha mulher... e então, veio o Gael.

Isso foi a frustração da vida deles, e desde que nasceu foi sua vó quem o criou.

Nossas famílias eram completamente desestabilizadas, e talvez por isso nossa amizade tenha sido uma das melhores que eu já tive em toda minha vida.

Quando fiz onze anos, nossa amizade fugiu dos horizontes do parque. Quando sua mãe ia visita-lo, e meu pai chegava bêbado em casa, fugíamos até a ponte Golden Gate.

Não íamos muito longe, mas ficávamos por horas sentados em um espacinho para pedestres naquela ponte. Vezes chorando, rindo, ou apenas em silêncio.

Era como se... Em todo mundo, aquele fosse nosso lugar, o lugar em que podíamos estar juntos, sozinhos, longe dos problemas, dos dramas, de tudo.

Naquele lugar podíamos ser quem éramos de verdade, só nós dois.

Quando meu pai morreu anos depois, eu fugi de casa porque não aguentei ver minha mãe chorando, não consegui encarar aquilo... o único lugar na qual pensei em ir foi pra ponte, e logo depois o Gael me encontrou.

Percebi que aquele era o nosso lugar, toda nossa história foi baseada ali... E agora ele vem me dizer que quer retornar ao lugar em que há tantas lembranças. Tantas coisas vividas que sei que nunca mais vamos viver.

— O que?! — Perguntei me afastando. — Você não pode sumir assim e voltar impondo ordens em mim, Gael eu...

— Liza, só calce a porra do tênis e vem comigo. Não estou pedindo pra me obedecer, estou mandando. — Ele disse sério apontando pro tênis jogado no chão.

Franzi o cenho espremendo os olhos.

Pensei em protestar e dizer que não, mas precisávamos conversar, acertar todas as coisas e aquela era a única forma de fazer isso.

Calcei meu tênis sob seu olhar e desliguei a tv.

— Tá frio, pega sua blusa. — Ele disse e revirei meus olhos fechando a porta e o ignorando . — Não diga que eu não avisei.

Saímos na rua movimentada. Estávamos em silêncio. Não havia o que ser dito... quer dizer, haviam muitas coisas a serem ditas, mas ele não se manifestou e mesmo que um nó tivesse se formado na minha garganta, eu iria esperar que ele começasse.

Chegamos no começo da Golden em menos de quinze minutos. O vento batia muito forte, e devido ao horário era quase impossível conversar, já que buzinas e carros faziam um barulho enorme.

A neblina começava a assentar no horizonte e encarei aquela paisagem sentindo meu corpo reconhecer cada centímetro daquele lugar.

Quanto mais meus pés me levavam para o lugar onde ficávamos, mais meu coração parecia acelerar...

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