Onde está minha Mãe?

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As lembranças da minha família eram turvas e distantes. Lembro-me de como nossa rotina era pacata e sempre se repetia, dia após dia. Tenho lembranças do sorriso alegre de minha mãe, sempre radiante, refletindo em seus olhos escuros. Do seu jeans desgastado e as camisetas. Sempre a achei descolada demais para uma mãe. E eu era orgulhoso por ter a mãe mais legal do mundo. Meu pai estava sempre ocupado com sua oficina e durante as noites ele geralmente não estava em casa. Eu não sabia o que ele fazia que precisasse sair depois do jantar. E algo me dizia que era o único.

— É apenas trabalho, querido. – dizia minha mãe com um sorriso singelo. — Agora, vá para cama.

Quando os gêmeos vieram morar conosco, fui preenchido por uma sensação de que a família estava completa. Mesmo Tyson sendo um pouco recluso. Era bom ter irmãos. Os almoços de domingo se tornaram sagrados, era o único dia da semana em que usávamos a sala de jantar – onde só fazíamos nossas refeições aos domingos e datas comemorativas.

Desci as escadas correndo, passando pela enorme sala vazia e entrando na cozinha, onde minha mãe preparava torradas e bacon. Eu acordava mais cedo aos domingos para ajudá-la a preparar o almoço. Envolvi sua cintura com meus braços finos, pressionado o rosto contra seu corpo.

— Bom dia, querido. – sua voz soava como melodia. — Gosta de torta de pêssego?

— Não vai ter bolo? – a fitei com meus grandes olhos escuros, sem esconder meu descontentamento. — Você prometeu.

Seus cachos em tons escuros de loiro caíram sobre seus ombros. Ela depositou duas torradas e duas fatias de bacon em grande prato branco. Seu corpo esguio ficou a minha frente, seus dedos finos, como os meus, tocaram meu rosto e ela exibiu os mais perfeitos dentes brancos.

— Achou mesmo que eu iria me esquecer do bolo de aniversário do meu bebê?

— Mamãe, não sou mais um bebê. Vou completar dez anos! – disse orgulhoso.

— Tudo bem, jovenzinho. – ela passou as mãos pelo meu cabelo. — Precisamos ir ao mercado comprar velas e chantilly.

— Aí vamos poder fazer o bolo de chocolate? – meus olhos brilharam enquanto fazia a pergunta.

Ela concordou com um aceno, antes de beijar o alto de minha cabeça.

Fizemos o bolo naquela tarde de domingo. À noite nos reunimos para cantar parabéns, meus pais permitiram que eu convidasse Liz para o jantar e comer um pedaço de bolo comigo. Em seguida, meu pai saiu como de costume.

Essa foi uma das últimas boas lembranças que tive com minha família reunida. No ano seguinte as coisas mudaram. A união foi desaparecendo aos poucos, sem que eu percebesse o motivo. Não realizávamos nossas refeições em família, para falar a verdade era raridade ter mais de duas pessoas a mesa da cozinha. Nunca mais utilizamos a sala de jantar. Nem mesmo em datas comemorativas. As discussões entre meus pais eram frequentes, e quando as coisas saiam de controle, os vizinhos ligavam para a polícia. Tyler me levava para o seu quarto, trancava a porta e tapava os meus ouvidos para não escutá-los.

— Você quer ouvir alguma estória? – perguntava meu irmão, nos cobrindo com minha manta.

Seu cabelo louro tinha um tom escuro, que caia sobre sua testa por está um pouco cumprido - o que significava que já estava na hora de corta -. Seus olhos castanhos claros me fitavam, enquanto as mãos grandes cobriam meus ouvidos, abafando os sons que vinham do andar de baixo.

— Não quero ouvir porcaria de estória nenhuma. – disse, frustrado. — Quero saber o que está acontecendo. Por que ninguém me diz nada nessa casa?

No Limite do DesastreOnde histórias criam vida. Descubra agora