Eu olhei no espelho. Franzi profundamente as sombrancelhas, e depois as alisei. Levantei um canto de minha boca, depois abaixei o outro canto. Levantei minhas pálpebras e depois deixei-as cair. Mostrei minha língua. Suspirei. Meus olhos tinham começado a mudar levemente, conseguia ver uma vaga cor castanha na iris, mas o vermelho ainda era bastante visível. Isto ia ser difícil.
Carlisle tinha me mantido bastante isolado durante quase um ano. Tudo que tive como companhia era o piano e livros. Quantias infinitas de livros, colecionadas por Carlisle. Haviam livros que eu nunca tinha ao menos ouvido falar. Absorvi cada palavra, inclusive os livros de medicina. Eu podia ler tão rápido, aprender mais rápido ainda, em uma velocidade cegante. Ainda assim, ficava entediado.
E então, estava na hora de me aventurar lá fora. Carlisle tinha feito planos para eu reinvidicar os bens de minha família. De alguma maneira ele tinha convencido as pessoas apropriadas de que eu tinha sobrevivido a epidemia e que estava me recuperando todo esse tempo. Quando eu lhe perguntei, ele disse, " Os humanos vão acreditar no que você lhes falar.". Isto aliviou um pouco minha culpa, eu não era o único que estava mentindo.
Você está pronto, Edward?
Eu podia ver Carlisle no espelho, em pé na entrada. Curvei minha cabeça e me apoiei contra a pia do banheiro.
"Na verdade não, " murmurei. "Me lembre novamente como é a história."
Como seu médico, eu te tenho mantido sob meu cuidado pessoal pelos últimos dez meses. Considerando que seus pais faleceram, você é o único restante para reinvidicar a herança. Claro que, a única razão para a qual fazermos isso é para que você possa ter o que quiser de sua antiga vida.
"E por que estamos fazendo isto hoje?" Eu olhei para ele no espelho, e ergui uma sobrancelha.
"Porque hoje", ele sorriu largamente, "está nublado."
Nós estávamos andando rua abaixo rumo a minha casa. E quero dizer andando mesmo. Carlisle tinha que caminhar ao meu lado com uma mão em meu ombro todo o tempo. Primeiro, para ter certeza que eu mantivesse o ritmo humano, e segundo, porque eu estava fingindo ser cego. Usei pequenos e redondos óculos de sol, para que assim ninguém pudesse ver meus olhos vermelhos.
Carlisle tinha falado 'manso' com o advogado que estava controlando os negócios de minha família. Ele era um dos sócios de meu pai. Era um pouco perturbador descobrir que os pensamentos dele eram tão diferentes às suas palavras faladas. Ele me ofereceu seus pêsames, dizendo que a morte de meus pais foi uma grande lástima. Enquanto em sua mente, ele se alegrava pelo ganho do controle da firma de advocacia que a morte do meu pai lhe permitiu. Todos os humanos eram assim tão mesquinhos?
Eu tinha decidido não vender a casa, não podia dizer o porque, e talvez nunca saberia. A única coisa que podia ter certeza era o senso de família que a casa representava, e eu não podia deixar isso partir. Assim, a casa iria permanecer em meu nome, sendo cuidada pelo escritório de advocacia por tempo indeterminado.
Então ali estávamos, dentro da casa que parecia familiar mais e ainda assim diferente para mim. Trabalhamos de forma eficiente, Carlisle e eu, recolhendo tudo o que eu queria manter comigo. Ele dizia do outro lado da casa, Você deseja manter as jóias da sua mãe? E eu respondia em nada mais do que um sussurro, ele conseguiria ouvir cada palavra.
Etiquetamos as caixas, decidindo quais deveriam ser enviadas a nós e quais permaneceriam lá. Tudo levou uma hora. Satisfeito com nosso trabalho, deixamos a casa pela parte dos fundos, cruzando o vasto e verde gramado. Naquele momento, as nuvens se abriram e um raio de luz solar acariciou Carlisle. Eu congelei. Carlisle se virou.
O que foi, Edward?
Sua pele estava brilhando, eu podia ver toda linha, cada superfície. Olhei para minha mãos na luz do sol, minha pele estava brilhando também.
É o que nós somos, ele disse, congelados no tempo.
Fascinante e aterrorizante ao mesmo tempo. Respirei profundo e acenei com a cabeça para que ele continuasse andando.
O vampiro conduzindo o cego, bem cômico na verdade. Entrelaçamos através de um mercado local cheio de pessoas gritando suas auto-promoções. Eu cortei o fluxo de ar para meus pulmões, como Carlisle havia me dito, para bloquear todos esses cheiros humanos. Fechei meus olhos brevemente, tentando controlar o volume de seus pensamentos.
"As melhores e mais frescas flores que você poderá encontrar!" gritou uma grande mulher em um vestido cinza. Elas estavam frescas ontem, mas as pessoas não compraram, oh não. . . então eles as compram hoje. . .
"Peixe! Compre seus peixes aqui!" Meu primo me falou semana passada que meus preços são ultrajantes. . . para inferno com ele, eu tenho uma família para alimentar. . .
Eu não pude deixar de me perguntar se existia tal coisa como um humano que fosse fiel às suas palavras. E me perguntei também de suas reações. As multidões pareciam não perceber que estavam se abrindo entre nós como o Mar Vermelho. Mas ninguém sequer deu uma segunda olhada, com excepção de alguns: Que belo homem ou Que pena que ele é cego, um rosto tão lindo, e em seguida estávamos fora de suas mentes. O que lhes causava que nos ignorasse tão depressa?
"Eles nos temem, " eu concluí em um sussurro.
Sim, entretanto eles não estão cientes de seus medos. O instinto humano declara que eles devem manter distância, mas eles não sabem disso em um nível consciente.
"Por quê?"
Eles são nossa presa natural. Mas, e ele deu ênfase nessa palavra, escolhi não ver a humanidade de tal maneira.
Os detalhes de nosso disfarce se tornaram muito mais complicados para mim. Estávamos nos escondendo em plena vista, era um paradoxo fenomenal.
"Como voce vê os humanos então?"
Como uma lembrança de minha fé.
"Fé?"
Sim, acredito que se eu puder manter minha sensibilidade em respeito a humanidade, talvez minha alma será julgada baseada nisso.
"Sua fé é absoluta?"
Sim. E a sua?
Naquele momento queria acreditar muito nele . Eu sabia o que ele estava dizendo, ele acredita que temos almas. Que poderíamos proteger nossas almas ao sermos mais humanos. Não podia concordar e não conseguia dizer nada mais desse assunto.
Porém mais do que qualquer outra coisa, eu queria me afastar dos humanos.
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Verde, Vermelho, Dourado.
FanfictionEssa é a história dos primeiros anos de Edward como vampiro. Desde a sua vida na europa, quando foi atingido pela gripe espanhola até a sua união com Carlisle Cullen e os demais membros da família Cullen.