Quando você se foi - pausado

Capítulo 7

Meu primeiro encontro de verdade com você aconteceu cerca de três semanas após àquela festa. Depois de tantos olhares e pensamentos, descobrimos uma amiga em comum, que acabou servindo como cupido, apresentando-nos.
Até que finalmente, depois de tanto sairmos com outras pessoas, conseguimos um tempo só para nós. Para ser sincera, a primeira vez que saímos não deu muito certo. Não conseguíamos encontrar nenhum assunto em comum, tudo que eu amava você odiava e vice-versa. Tanto que por um momento cheguei a me perguntar se você não estava apenas brincando comigo:
- Brigadeiro?
- Eca, odeio! E peixe?
- Ah, não sou muito fã... Gosta de dançar?
- Sou péssimo dançarino. Que tal esportes?
- Não, sou muito preguiçosa para isso.
Nossa conversa foi baseada em desencontros e falta de afinidade. Mas como falam por aí, "os opostos se atraem" e nós, com o tempo, provamos para todos que essa frase de fato se aplica à realidade. Tínhamos pouquíssimas coisas em comum, mas conseguíamos fazer dessas poucas coisas motivos para nos encontrar.
Depois de alguns encontros e saídas com amigos, descobrimos que compartilhávamos o amor pela arte, seja ela na forma de música, pinturas, livros ou qualquer outra coisa. Apenas amávamos contemplar a capacidade da mentalidade humana de criar.
Após sabermos disso, as coisas começaram a dar certo. Fomos a um museu alguns fim de semanas depois, a um show após algumas semanas e aos poucos nossos encontros artísticos começaram a ficar mais frequentes e fomos construindo uma amizade baseada em críticas sobre músicas e combinações de cores de um quadro.
  Depois de alguns meses, nossas conversas começaram a ir além das artes, passei a confiar mais em você para assuntos pessoais, como brigas com amigos e até problemas dentro de casa.
  Um tempo mais tarde, você começou a frequentar minha casa e chegou a ter amizade com a minha mãe, no fundo sempre soube que havia algo além da nossa amizade profunda. No fundo, sempre estive apaixonada por você em segredo, apenas esperando o momento em que você percebesse isso também.
  Até que finalmente um dia você percebeu.
  Na noite de ano novo, exatamente um ano depois da noite que te vi pela primeira vez, fomos em uma festa naquele mesmo lugar. Mas dessa vez, dançávamos e aproveitávamos juntos com nossos amigos a virada do ano.
  Até que, como de costume, os fogos começaram e eu fiquei ali maravilhada olhando para cima, com você ao meu lado. Enquanto olhava, você chegou mais perto e me abraçou e assim ficamos, sem falar nada, sem ao menos olharmos um para o outro, apenas abraçados, curtindo o momento e olhando para os fogos.
  Quando o show acabou, voltei lentamente a cabeça, sem graça e sem saber para onde olhar com você assim tão perto de mim. Olhei primeiro para frente, onde nossos amigos estavam, depois para o chão, sem graça, até que finalmente olhei para você, que também estava olhando para mim. Dei um sorriso tímido e soltei com uma voz aflita:
  - Fogos são tão bonitos né? Como um espetáculo no céu.
  Você apenas me olhou e riu, sem dizer nada, me deixando com ainda mais medo de ter falado a coisa errada. Até que soltou:
  - Você me faz rir atoa, gosto disso.
  Fiquei rosa, vermelha feito um pimentão. Ninguém nunca havia falado aquilo de mim, não sabia como reagir, o que falar, e na realidade, não precisei, porque logo você continuou a falar.
  - Tenho esperado muito para falar isso, gostaria de ter um momento especial. Mas, desde que te vi logo ali, há um ano atrás, minha vida tem se tornado uma bagunça. Você apareceu discreta, com um vestido manchado e fez manchas em todo meu coração. Desde aquele dia, venho pensando em arrumar desculpas para te encontrar, para te ver, te conhecer. A realidade é que você veio e fez uma bagunça aqui dentro e, desde então, venho pedindo diariamente para que essa bagunça nunca se organize.
  Não foi preciso dizer mais nada, segundos depois, estávamos nos beijando, o beijo mais calmo e sincero que tive em toda minha vida.