No dia seguinte, acordei já pensando em como dizer a Felipe toda a confusão que se passava em minha cabeça, ou em como não dizer.
Mesmo após um dia maravilhoso como aquele, eu lembrara de você antes de dormir e não fazia ideia de quando isso pararia de acontecer. Tinha medo de tudo, de nada, de me envolver, de tudo isso nunca passar.
Chequei o celular, esperando novamente as duas mensagens de "bom dia" que havia recebido no dia anterior. Mas, para minha surpresa, naquela manhã apenas minha mãe se lembrara de mim.
Não receber uma mensagem do Felipe influenciou mais do que pensava no meu dia. Ao mesmo tempo que me sentia aliviada por não ter que explicar a ele toda a confusão que se passava na minha cabeça e coração, me sentia vazia, como se aquela mensagem significasse mais uma perda, uma derrota.
Ao contrário do dia anterior, que o sol parecia brilhar mais forte, naquele dia, era como se ele não se importasse em aparecer. As nuvens preenchiam todo o céu, complementando meu humor confuso.
No trabalho, não conversei com muita gente e ansiei pela hora do almoço. De tempos em tempos checava meu celular à espera de alguma mensagem ou ligação, mas ninguém além da minha mãe pareceu se lembrar de mim naquela manhã.
No horário do almoço, fui pra casa, e mesmo sem fome me obriguei a engolir uma salada. Deitei na cama na companhia de uma boa música e esperei o tempo passar.
No meio de uma de minha músicas favoritas, o toque da guitarra foi subitamente interrompido pelo toque do meu celular, me causando uma raiva momentânea. Pausei o som, apesar de não estar nem um pouco afim de falar com qualquer pessoa naquele momento.
Peguei o celular e assim que li o nome que aparecia na tela, meu coração acelerou.
- Oi Felipe, tudo bem? -atendi desconfiada
- Oi Bi, tudo e vc?
- Também!
- Desculpe não ter mandado nenhuma mensagem hoje, juro que queria conversar com você depois do dia maravilhoso de ontem. - falou, me deixando feliz pelo comentário - Acontece que tive que acordar mais cedo que o esperado. O jornal me ligou as cinco da manhã me pedindo para cobrir uma notícia, parece que o repórter estava passando mal ou algo assim, e só consegui parar agora!
- Ah, sem problemas! - disse, ignorando a angústia que senti toda a manhã.
- Mas me fala, como passou de ontem? Dormiu bem?
Sua preocupação me trouxe outra pontada no coração, ele se preocupava, queria saber como dormi, o que sonhei, ou qualquer outra bobeira, se interessava em conversar comigo, não importava o assunto. Então, por um momento, esqueci tudo que havia pensado na noite anterior, eu gostava dele, gostava do modo em que se preocupava comigo, que me ouvia, e por mais que ele não fosse você, ele era importante para mim.
- Dormi sim, e você? - disse com um sorriso bobo no rosto. Era incrível como aquele rapaz me deixava em conflito comigo mesma.
- Também! Bianca, desculpa mas agora vou ter que desligar, o trabalho me chama, tenha um bom resto de dia, a noite conversamos mais! Beijos. - falou após algumas vozes gritarem seu nome ao fundo.
- Sem problemas! Bom trabalho! Beijos. - respondi e desliguei.
Levantei já mais animada para voltar ao trabalho e para faculdade a noite. Era incrível como ele conseguia mudar meu humor tão rápido.*
Cheguei no prédio cansada após a faculdade. A chuva tinha molhado minhas calças as deixando ainda mais pesadas e eu andava com dificuldade carregando uma porção de livros e fichário nas mãos. Desastrada como era, mal consegui abrir a porta do elevador e quase deixei tudo cair ao selecionar meu andar. "Respire Bianca, tente chegar viva até o final de semana!" - repetia mentalmente.
Quando cheguei no meu andar, Felipe estava em frente à sua porta, levando o lixo para a lixeira do andar.
Ao me ver, correu até a lixeira, deixou o saco e veio em minha direção, oferecendo ajuda para carregar meus livros enquanto tentava me cumprimentar. A confusão de mãos que aprontamos acabou resultando em alguns livros no chão, que logo Felipe abaixou para pegar. Sozinha já era desastrada, com ele então, tudo piorava.
Quando conseguimos nos ajeitar, dividindo os livros em nossos braços, agradeci Felipe e pedi para ele me seguir até minha porta. Em uma manobra peguei minhas chaves na bolsa pesada que se estendia do lado esquerdo do meu corpo e abri meu apartamento.
Entrei com os livros que estavam comigo, deixando-os sobre o balcão e voltei para pegar os que estavam com Felipe. Apenas quando estávamos com as mãos vazias conseguimos conversar.
- Parece que alguém pegou chuva- disse Felipe sorrindo e apontando para minhas calças. Só então lembrei que estava toda molhada, em uma situação bizarra, tentei disfarçar e dar uma ajeitada no cabelo sem ele perceber.
- Nem me fale, estou encharcada!
Ele começou a rir da minha situação, fazendo piadinhas com minhas calças molhadas e com minha maquiagem, que só então percebi que estava toda borrada. Aproveitando da situação de maturidade zero, fui em sua direção e o abracei, molhando- o também. E assim ficamos por um momento, rindo um do outro, abraçados no meio do corredor. Não desejei estar em nenhum outro lugar do mundo.
Ele olhou para baixo, nos meus olhos e eu fiz o mesmo, movi meu rosto para cima me deixando frente a frente com ele. Ficamos assim por um instante, até eu resolver falar:
- Como foi seu dia? Deu tudo certo na reportagem de última hora?
- Deu sim, ainda bem. Esse tipo de coisa sempre acontece, apesar de ser encarregado do entretenimento, sempre acabo recebendo ligações relâmpagos para socorrer notícias sem repórter. Mas, fazer o que, tudo pelo trabalho. - disse ele dando de ombros e me soltando um pouco. - Mas mudando de assunto, você fica tão diferente com o cabelo molhado. - falou, e tocou no cabelo que estava apoiado em meus ombros.
- Pois é, essa chuva atrapalha toda a vida. Impossível ficar apresentável com um temporal desses. - falei em tom brincalhão, tentando esconder o meu nervosismo com seu toque.
- Nem me fale! Fazer externas com esse tempo é desastre na certa!
- Imagino! Bom, por mim ficaria mais tempo conversando com você, mas preciso muito de um banho e de uma boa noite de sono. - disse, me despedindo.
- Ahh, então tá, boa noite! - falou Felipe, me abraçando novamente.
Virei-me e entrei no meu apartamento mais uma vez. Tomei um banho, e deitei na cama. Peguei o celular para mandar boa noite para minha mãe, e confesso que me surpreendi ao receber uma mensagem também do Felipe.
" Boa noite, até amanhã"
"Boa noite, até" - respondi e fui dormir, com um sorriso no rosto, evitando pensar em qualquer coisa que me remetesse ao passado. Talvez já fosse hora de mudar.
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Quando você se foi - pausado
RomancePerder alguém que se ama nunca é fácil, mas Bianca vai mostrar, nesse romance incomum, cheio de saudades, que é possível se recuperar de uma grande perda. Por mais difícil e doloroso que seja, sempre haverá um outro alguém, uma outra esperança. ...