Capítulo 6

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Lynn acordou de um sono que parecia ter durado umas poucas horas e percebeu que estava sozinha na cama. Estava relutante em levantar, mas as coisas que tinha de fazer naquela manhã de sexta invadiram sua mente como uma enxurrada que a empurrou para fora da cama. Tomou uma ducha rápida, se olhou no espelho e disse para si mesma – Pensa na Lizzy.

Por mais que tudo em sua vida não estava nem um pouco agradável, ela não podia se esquecer de sua filhinha de apenas dois anos. Ela não tinha culpa de sua vinda ao mundo. Na época em que engravidou, Lynn pensou em aborta-la milhares de vezes. Ela não estava preparada para ser mãe e ainda não se sentia preparada... que modelo de mãe ela teve de sua própria mãe? Por mais que ela quisesse lembrar de sua avó, não conseguia. Sua avó tinha sido uma mãe para ela mas depois que faleceu, tanta coisa ruim aconteceu que Lynn não conseguiu guardar o que havia aprendido dela, pelo contrário, se tornou como a própria mãe... relaxada, ignorante, irritada, e revoltada. A única diferença era de ter se casado e formado uma família... mas mesmo assim, por dentro, Lynn ainda se sentia a mesma pessoa, o espelho de sua mãe.

A casa precisava urgente de uma faxina, de novo. As mesmas coisas toda semana, todos os dias, a mesma rotina, a mesma prisão. A vontade era de fugir, desaparecer, começar uma outra vida, num outro lugar, longe de todo mundo que a conhecesse...

Lynn abriu a porta do quarto da menina e viu que ela dormia tão profundamente... melhor não acorda-la. Fechou a porta com cuidado para que o ruído do aspirador de pó não a acordasse. Ligou o aparelho na tomada e começou o trabalho...o barulho ensurdecedor do equipamento era, de uma forma estranha até relaxante. Como se o resto do mundo tivesse sido desligado e seus problemas pudessem ser sugados com toda aquela sujeira – Devia fazer isso mais vezes – pensou. Mas era muito cansativo.

Finalmente sentou na bancada da cozinha e enumerou tudo o que precisaria fazer no restante do dia: fazer o almoço, lavar as roupas, arrumar os quartos, lavar o chão da cozinha...será que aquela casa era um dos fardos que ela teria de carregar para o resto de sua vida?

O fato de Carl ter ido trabalhar mais cedo sem sequer falar com ela e não se preocupar em ligar para saber como ela estava, a incomodava um pouco, mas dava para entender... afinal, ela o afastou na noite anterior. O relógio marcava duas horas da tarde e ele não fizera um mísero contato. Hesitou alguns segundos antes de pegar o telefone e ligar para o escritório mas não aguentou... precisava falar, mesmo que fosse qualquer besteira, precisava ouvir sua voz, quem sabe aquela saudade que tinha dele não era o amor que pensava ter se acabado?

– Posso falar com o Sr. Stafford, por favor?

– Pois não, quem gostaria? – A voz era estranha... muito sexy para uma secretária.

– É a Lynn, sua esposa.

– Olá Lynn! – A moça da voz sexy exclamou, um pouco alegre demais.

– Han...sim...quem fala?

– Eu sei, é que Mary Johnson falou tanto sobre você que é como se eu a conhecesse. Desculpe a intromissão, mas espero que possamos nos encontrar um dia! Eu sou, Anna, a nova secretária do Carl.

Que estranho, pensou Lynn. Ela chama o seu marido e patrão pelo nome como se tivesse intimidade com ele. Diferente da Mary, a outra secretária de Carl...

– Onde está Mary?

– Ela foi promovida para um outro departamento aqui no hospital. Eu fiquei no seu lugar, já estou trabalhando aqui a quase uma semana.

– Ah, sim. – Lynn fingiu saber. Anna percebeu o desconforto.

– Foi bom falar com você Lynn, vou passar a chamada, aguarde um momento, por favor.

Depois de alguns minutos da mesma música irritante de sempre, Lynn começou a se arrepender de ter ligado.

– Sim Lynn, como estão as coisas? – Ele parecia ocupado e isso a desanimou logo de cara.

– Só queria saber se você tem notícia que horas seus pais vão chegar nesse fim de semana para eu me programar por aqui...

– Eles ainda estão esperando a minha confirmação se podem vir ou não né... depois da nossa última conversa, achei melhor não confirmar...

– Ué, se não for agora, vai ser outro dia mesmo... melhor organizar tudo de uma vez... vou fazer as compras então.

– Certo, então me avisa se precisar de alguma coisa, eu provavelmente vou chegar em casa um pouco mais tarde do que o normal hoje, espero que não se importe.

– Não tem problema, eu vou estar ocupada de qualquer maneira. Vejo você mais tarde então. Ela desligou o telefone.

Carl tentou dizer adeus mas Lynn já tinha desligado. Ficou pensativo...

Ele havia dado a Lynn mais do que muitos maridos jamais deram a suas esposas e, no entanto, ela não parecia apreciar nada. Será que seus pais irão perceber o estado de seu casamento? Sua mãe com certeza iria notar, ela observava as coisas com tanta precisão...ele estava perdido!

– Carl, posso entrar? – Anna intrometeu seus pensamentos.

– Oi Anna, que posso fazer por você?

– Eu só estava pensando... tem alguma coisa que eu possa fazer por você? Ela questionou com um olhar estranho.

Que tipo de pergunta é essa? – Carl pensou. Forçou sua memória...será que tinha dado esse tipo de liberdade para essa secretária que começou há cinco dias?

– Obrigado por perguntar, Anna. Mas no momento não há nada.

Estaria ela atrás de um aumento ou algo assim?

– Sabe, Carl, quando eu cheguei para trabalhar neste hospital, eu sempre vi você passar pelo corredor do segundo andar e me perguntava como seria trabalhar contigo – Sorriu, fingindo timidez.

Ela já estava tomando um assento na frente dele e cruzando as pernas, antes que ele pudesse pensar, subiu discretamente o vestido rosa que revelava um pouco demais de suas pernas. Continuou...

– Comecei a te admirar desde a primeira vez que te vi...tinha essa menininha com câncer, e você gastava tempo para brincar com ela todos os dias durante toda sua estadia naquele mês antes de morrer...eu sabia que você não precisava estar lá. Isso foi muito inspirador para mim.

Ela o encarava, os grandes olhos emoldurados por um quilo de maquiagem sequer piscavam.

– Bem...nós fazemos o que podemos, eu quero dizer, você sabe...você sabe como os hospitais são para as crianças.

É bom mencionar que você tem uma filha Carl... pensou ele.

– Eu sempre imagino o que seria para a minha filha passar por algo assim, por isso não penso duas vezes em ajudar essas crianças.

Carl começou a fingir procurar um papel em cima de sua mesa. Ele não se sentiu bem com a sua postura diante dele...

– Eu gostaria de encontrar um homem como você um dia... disse Anna.

As dúvidas de Carl agora se foram quando ela cruzou as pernas para o outro lado, sorrindo e jogando seus cabelos ruivos para trás.

– Tenho certeza de que você vai encontrar alguém, Anna, basta ser paciente.

Ele se levantou e foi até a porta para abri-la para dar o recado desagradável que ela estava passando de seus limites.

– É melhor eu voltar ao trabalho agora...eu só queria que você soubesse, sei lá, na verdade...provavelmente sua esposa te admire ainda mais...Estou aqui para o que precisar de mim.

Carl sabia exatamente o que ela quis dizer com esse último comentário, mas preferiu não alimentar esse tipo de pensamento...era tentador, mas mesmo que seu casamento não estivesse indo bem e Anna fosse jovem e atraente, não estava interessado em mais um problema em sua vida. Talvez fosse melhor ir para casa mais cedo hoje e deixar o resto dos afazeres para outro dia...

Amor em RuínasOnde histórias criam vida. Descubra agora