Capítulo 8

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                                                                                    Marina

Conhecer melhor a ONG me deu o gás que precisava para retomar a minha rotina. Foi muito bom ver tantas pessoas especiais se dedicando a pessoas que nem conheciam, sem julgar o motivo de terem ido parar na rua, e sim tentando amenizar um pouco suas duras realidades.

Vânia me permitiu conhecer todos os trabalhos desenvolvidos pela instituição e não determinou como deveria ajudar, deixando isso à minha escolha.

— A gente mora no Brasil, né? — ela havia falado — As pessoas demoram para confiar, porque tem muita gente picareta. Costumam achar que só buscamos dinheiro, e que quando o conseguimos, nem repassamos. Porém, costumo dizer que às vezes o tempo que você doa, o sorriso que oferece, o trabalho que se dispõe a fazer é tão importante quanto uma contribuição em dinheiro, porque é algo que vem do coração e não se dá para quantificar. É óbvio o que nos mantém de portas abertas é o dinheiro, afinal, vivemos em uma sociedade na qual ele é o combustível que move tudo. Porém, para as relações pessoais, o maior tesouro é um pouco de empatia, que está em falta em muitos corações. Se nós colocássemos mais no lugar dos outros, cometeríamos menos julgamentos, menos injustiças e entenderíamos de verdade a noção do amor ao próximo... Desculpe-me, a pregação. É que relmente sou apaixonada pelo que faço.

— Não se desculpe, foi muito importante ouvir isso de você.

Não menti, porque realmente o que disse ficou em minha cabeça. Só não voltei à ONG todos os últimos dias em que ficaria em casa, por conta das inúmeras visitas que recebi. Além dos meus pais e das minhas fieis escudeiras, não foi surpresa, quando o Flávio apareceu.

Dizer que o clima estava estranho, seria pouco. Chegou a me lembrar nossos primeiros encontros, os dois tímidos, com muito receio de dizer algo errado. Fiz um gesto para que entrasse e ele agradeceu, entrando e sentando-se, exatamente no mesmo lugar de sempre.

— Ainda tenho a chave — falou, acredito que por estar tão incomodado com o silêncio quanto eu.

— É porque está muito recente... — minimizo, não me acomodando ao lado dele, como antes, mas sim na outra poltrona, bem distante. Se aquele sofá falasse, talvez deixasse algumas pessoas vermelhas — Ainda não tivemos tempo de verificar esses detalhes.

— Verdade — concorda e arruma o óculos de aro tão fino que nem parece estar usando. Eu que nunca reparava em homens de óculos, achei extremente sexy nele. Na realidade, costumava passar bem longe do tipo intelectual, achava-os muito chatos. Só que com o Flávio foi tudo tão natural, que nem tive tempo de pensar direito no tipo de homem que ele era — Como você está, Nina? Por que não esperou que fosse buscá-la? Por que não tem atendido minhas ligações?

Minha vontade é de rir, porém, com algum esforço eu me contenho.

— Quantas vezes você já terminou um relacionamento, Flávio? Quando a gente acaba, não quer ficar vendo toda hora, nem ligando, nem saindo junto. Será que não entende que isso é super confuso para mim?

— Puxa, diante do que aconteceu, achei que pudesse precisar de mim — o tom arrependido dele, faz com que me sinta mal — Não é porque terminamos que quero o seu mal. Fiquei preocupado, quer dizer, ainda estou, porque desde que tudo aconteceu, você tem me evitado.

— Estou bem, Flávio — omito apenas que fiquei com medo de andar sozinha à noite — Só sinto muito de não terem pego o responsável.

— Fiquei sabendo que aquele cara estava te ajudando — torce a boca levemente, o que deixa claro que é custoso para ele admitir que errou — Porém, quando é que ia pensar que um mendigo fosse bancar o herói? — como não respondo nada, ele muda de assunto. Fico aliviada ao perceber que a Bia não falou com ele sobre a delegacia — Sabe, não achei que fosse ser tão difícil quanto está sendo...

Um Abrigo para o Coração (Degustação)Onde histórias criam vida. Descubra agora