Num dia de aula bem normal, sem nada de interessante acontecendo, comecei a me desprender das explicações dos professores e a refletir sobre como eu perdi amigos verdadeiros ou potenciais amigos e passei a ter só colegas, colegas que eu tinha sorte de ter, que me cativavam bastante e que sempre podiam contar com a minha presença para participar de tudo e tirar fotos, apesar de não poder vê-las no mundo real, em resumo pensei como uma pessoa que criticava tanto o superficial acabou se divertindo tanto com sua própria superficialidade.
Um silêncio estranho passou a vagar sobre a escola e quando ninguém esperava, um estrondo enorme invadiu meus tímpanos quebrando meu transe de pensamentos, e um segundo barulho de passos frenéticos me indicou que todos estavam saindo rapidamente da sala, aprendi com tempo a identificar os sons, principalmente os rotineiros, então não ia ficar parado na sala para nada, segui a turma com a minha fiel bengala, que era daquelas que se "dobrava" em partes (portátil), paramos na escada onde todos da escola estavam, escutei de novo o mesmo estrondo, semelhante ao som de instrumentos tocando juntos como numa orquestra, aí lembrei vagamente que avisaram com antecedência sobre a surpresa de 10 anos do meu colégio que estava pronta para estourar mas sem uma data determinada.
A orquestra era apenas o começo, seguimos a festa ambulante pelos corredores da escola, um dia antes eu tinha realizado meu sonho de participar de fotos gigantes formadas por pessoas e tiradas do alto e foi ótimo, imaginava a foto bem bonita e adorava ficar olhando para ela deslumbrado na minha imaginação, com a passagem da banda fui deixar minha bolsa na biblioteca, ritual que tínhamos quando não tinha aula, fiquei só ouvindo o barulho e sentindo a felicidade do pessoal, minha professora estava até dançando, imaginei a cena e caí na risada, afinal a escola também era uma de minhas fontes de felicidade. Quando retornei para pegar o meu material, abri o zíper da bolsa para pegar o celular, e na pressa esbarrei numa garota, derrubando minhas coisas no chão bem em frente a biblioteca:
-Desculpa, você tá bem?! Perguntou ela com tom de preocupação e vergonha.
-Tô sim não foi nada.
- Eu posso ajudar?
- Não, já disse que tá tudo bem. Disse com certa irritação.
- Certo, você se vira bem sozinho, mas não é vergonha eu dar uma ajudinha. Disse ela me dando os últimos dois livros que faltavam.
- Obrigado pela ajuda, até mais. Respondi com um sorriso.
E assim nos conhecemos, não havia uma explicação lógica mas algo nela me atraiu muito, acho que foi a empatia que ninguém teria, ou o fato dela me ajudar como se eu fosse uma pessoa normal e não um coitado, nos dia que se seguiram a gente conversou muito, sobre tudo, a confiança só aumentava, quando a gente conversava pessoalmente eu adorava sentir o cheiro dela, me inspirava coisas boas, ela era minha guia, a única que eu confiava, a única que me consolava, era muito especial para mim, uma amizade verdadeira, num dia qualquer, ainda na progamação comemorando os 10 anos da instituição, tivemos um evento só nosso , a hilária; "A corrida do cup cake", foi assim:
"Na área de convivência da minha escola foram expostos cup cakes formando o símbolo que a representava, só que eu e minha amiga cansamos de esperar os fotógrafos tirarem milhares de fotos daquela coisa e fomos ao refeitório almoçar, uns dez minutos depois um pessoal da minha sala veio avisar gritando, que os cup cakes estavam acabando, nós corremos como se a escola tivesse sofrido um atentado, mas quando chegamos a decepção veio à tona, pois ainda tinha muitos bolinhos e demorou séculos para acabar completamente, além disso eles deveriam ser classificados como mera decoração pois estavam muito ruins, duros e sem gosto, inclusive muita gente só comeu a cobertura, os funcionários da limpeza devem ter se impressionado ao ver que no lixo havia apenas bolinhos sem cobertura, aqueles cup cakes eram exatamente como as pessoas hoje em dia excelente cobertura mas péssima massa".
Apesar de tudo foi um dos melhores dias da minha vida, consegui uma amiga para confiar, para me consolar e relembrar aquele dia eternamente.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Minha Dimensão Invisível
RandomA maioria das pessoas cegas tem uma "visão" diferente das demais pessoas, elas podem "enxergar" muito além do que bilhões de pessoas jamais saberão, no mundo delas, podem ser felizes e, muitas vezes, preferem estar nele do que conviver com o mundo...