Capítulo 02:

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Mauricio Lacaste


Me chamo Mauricio Lacaste, tenho vinte e quatro anos, e trabalho como assistente social do governo, também sou sócio majoritário de uma academia de musculação, natação e artes maciais; tudo isso na mesma academia. Sou filho único de uma mãe rica e um pai empresário milionário; mas nunca quis depender do dinheiro deles, e hoje graças ao meu próprio emprego e a academia, eu estou muito bem de dinheiro.

Eu não ganho muito como assistente social, é verdade, e esse é um dos motivos para que meu pai deteste tanto minha profissão. Ele gostaria que eu fosse um empresário como ele, que eu estivesse estagiando em uma das suas empresas —são muitas, pelo mundo todo— e me preparando para assumir os negócios da família já que sou o único herdeiro. Ou pelo menos que fosse um advogado renomado ou um médico de prestigio.

Mamãe por outro lado, é uma mulher maravilhosa. Ela não julga minha escolha, e assim como eu, não liga para o dinheiro. Ela adora crianças e como sou seu único filho, me mima como se tivesse cinco anos. Ela tentou ter outros filhos, mas não segurou nenhuma gravidez, e a única que segurou pós em risco sua vida.

Eu tive uma infância um pouco difícil: meu pai quase não parava em casa, estava sempre em alguma viagem ou reunião de negócios, ele vivia — e ainda vive — para suas empresas. Minha mãe esteve sempre comigo, ela me deu todo o amor que uma mãe maravilhosa pode dar, mas eu sentia falta do meu pai. Ele nunca estava comigo, e quando estava me fazia querer que não estivesse.

Ele brigava comigo, me julgava por ser tão apegado a minha mãe, desaprovava meus gostos e meus sonhos. Já deu para perceber que eu nunca fui o filho que ele queria. Quando eu tinha dezessete anos até me mutilei por isso. Não conto isso para ninguém, mas também não tenho vergonha; todo mundo tem uma fraqueza e lida com ela como pode. Eu não sabia lidar com meu pai, e mesmo quando queria agrada-lo, eu não conseguia.

No meu aniversario de dezessete anos, ele brigou comigo e disse que preferia não ter herdeiros a...

"— Passar minhas empresas para as mãos de um desnaturado, irresponsável como você!"

Ele deixou claro que amava mais seus negócios do que a mim, seu único filho. Naquela noite eu cortei meu pulso. Minha mãe me encontrou sangrando no chão do banheiro, e me prestou socorro. Ninguém, nem meu pai, nunca souberam daquilo. Foi então que eu procurei saber o que eu tinha feito, e descobri que em todos os lugares, em todas as classes, de todas as cores e raças, há adolescentes que por algum motivo se mutilam, se desprezam, se matam. E foi por esse motivo que escolhi ser assistente social e trabalhar diretamente com adolescentes.

Assim que eu pude, investi dinheiro na academia e me tornei sócio majoritário, e com os lucros dela deixei de depender do dinheiro dos meus pais. Saí de casa aos dezenove anos, tenho minha própria casa, meus carros, um emprego que eu gosto, e a academia que também me faz feliz. Pago minhas próprias contas, e divido meu tempo entre o trabalho, a academia —eu malho, nado e pratico alguns esportes como o Muay Thai — e agora vou ter que encontrar mais tempo para a faculdade de administração que vou recomeçar depois de ter trancado aos vinte anos, e um projeto novo que o governo criou.

Meu pai, porém, nunca desistiu de me transformar no filho que ele queria. Ele tentou de todas as formas, desde ameaças até uma secretaria da empresa sede, que tem a mesma idade que eu, e é linda. Nós namoramos, e eu quase caí na armadilha do meu pai, cego pelos caprichos do corpo e tive uma grande desilusão quando descobri que Luana estava comigo por um pedido do meu pai. Terminamos a quase seis meses e estou sozinho desde então; as vezes ela me liga, mas eu nunca atendo. Meu foco é o meu presente, o passado não tem nada de novo para contar.

Agora fui até a escola que está incluída no projeto, e a diretora me entregou uma ficha com fotos dos alunos da classe do segundo ano. Eu tenho que escolher um entre vinte e tantos, o que é uma pena, afinal todos mereciam esta oportunidade. Eu estava decidido a escolher o aluno mais necessitado, mas ao olhar a ficha uma foto me prendeu a atenção. Uma garota, de cabelos castanhos, olhar envolvente e um sorriso que se destacava de todas as outras fotos. Em baixo da foto havia seu nome: Lia Sales Mariel. E eu a escolhi sem pensar.

Aguardei na sala da diretora enquanto esta ia buscar a garota em sala de aula. Ouvi a porta se abrir e quando olhei na direção dela, a vi entrar. Uma garota meio baixa, usando calça jeans justa, tênis sneaker de cano baixo —eu entendo desse estilo dos adolescentes porque além de conviver com eles, também curto, e uso nos dias de folga como fins de semana e feriados. Eu gosto ué. — e uma blusa xadrez aberta mostrando uma regata branca e seios meio pequenos.

Não devia ter olhado para seus seios, eu sei, mas ela ainda é uma mulher, o que posso fazer se é da natureza do homem reparar numa mulher? Ela estava com o cabelo solto, exatamente como na foto, e a franja também caia sobre o rosto, cobrindo um pouco seu olho esquerdo. Ela me olhou espantada, franzindo um pouco as sobrancelhas delicadas, e depois mordeu o lábio inferior. Parou na minha frente, e jogou os braços para trás, prendendo as mãos nos bolsos da calça.

Eu fiquei um pouco nervoso, ela é linda, e esqueci por um segundo porque eu e ela estávamos ali. Eu era um assistente social, e ela era a minha escolhida; lembrei-me. Tratei de explica-la o porque estarmos ali, e não deixei de perceber a zombaria no seu tom de voz; assim como também não deixei de reparar que o som da sua voz era um timbre baixo, calmo e suave. Quase uma melodia clássica. E seus olhos eram castanhos, mas de um tom marrom como madeira; os castanhos mais bonitos e envolventes que já vi. Ela sorriu por um breve momento, quando zombava de algo que falei, e não pude deixar de notar, que seu sorriso era mesmo bonito, mesmo que por um breve momento. Ele nascia torto para a direita e depois se abria exibindo todos os dentes entre os lábios pequenos e rosados.

Fiquei surpreso quando ela recusou minha assistência; ela simplesmente me deu uma recusa, e saiu, me deixando falando sozinho. Que diabos aquela garota pensa da vida?! Peguei minha pasta, me despedi da diretora dizendo que precisava repensar minha decisão e fui para casa.

Quase não consegui parar de pensar naquela garota e em seu sorriso. Me peguei segurando a ficha e olhando para a miniatura de sua foto. Se ela realmente não queria aquela oportunidade, outra pessoa com certeza iria querer; o problema é que por algum motivo eu estava desapontado por não ser ela.


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