Parte 1 - Capítulo 3

14 1 0
                                    

Enquanto acordar cedo para uma garota de 14 anos que não seja Mônica venha a ser uma agonia, para ela, é um acontecimento e tanto. Ainda usava o pijama branco. Apertado. Com alguns poucos desenhos de figuras geométricas aqui e acolá. A cortina dançava e os fachos de luz adentravam perfeitamente sobre o edredom amarrotado.

Mônica sentiu o carpete felpudo em seus pés nus e um leve arrepio lhe percorreu a espinha. Não era frio. Estava quente. Mais um dia como outro qualquer na vida da carioca. Mas sempre tinha a sensação de que ao por os pés no chão, um buraco ia se abrir e ela seria tragada.

De pijama, onde a calcinha facilmente estava marcada, sendo engolida por uma boca logo ao lado da cama. Isso seria um pesadelo e tanto para outras garotas. Mas para ela, era o cotidiano. E se fosse apenas isso, já seria algo a ficar pensando ao longo do dia. Mas Mônica sabia que não era assim.

Calçou as pantufas e tão logo foi esticando-se em direção ao banheiro. A primeira missão do dia era tomar um banho. Manter-se acordada para fazer a mente funcionar de forma perfeita. Abriu a porta do box e deixou a água escorrer após um rápido movimento na peça de acrílico que imitava um cisne. A água saía com velocidade de um chuveiro grande, e que silenciosamente, transformava o minúsculo ambiente, em um mundo de névoa.

Lançou o pijama e a calcinha ao lado e entrou para ser molhada pela água que jorrava abundantemente. Ela não demorava a se banhar, mas às vezes, pensava em situações. Estranhas situações. Todas à envolvendo no banho. Gostava de fazer o sabonete deslizar com vontade em suas curvas. Como se fossem outras mãos que a estivessem cuidando de maneira íntima. Aquela bruma que fazia as paredes simuladas de vidro do box ficarem completamente brancas, em alguns momentos se mostravam como o túmulo que ela sonhava nas noites de Lua cheia. Não tinha medo, mas sentia atração por aquele sonho. Era sempre igual. Sempre no mesmo ritmo. Nunca mudava em nada. Ela gostava. Era como um pêndulo. Ou um ponto de equilíbrio. Ou mesmo de restauração de sua sanidade.

Deixava a água descer pelo rosto antes de passar as mãos. O cabelo comprido ficava pesado demais, pensava.

Olhou para baixo do umbigo e acima das coxas. Estava com a depilação em dia. Sentia-se bem em poder estar assim, lisinha. Sem um único resquício de pelos. Não achava que fosse uma forma de se mostrar sexy. Afinal, era algo que somente ela sabia. Tratava-se tão somente de higiene. E há poucos dias tinha feito a primeira depilação. Gostara do resultado. Achou-se mais feminina. Mais atraente. E engraçadamente, após a raspada, sentia-se nua enquanto andava entre outras pessoas. Mas isso passou com o tempo e a continuidade da lâmina entre suas pernas. A cada passada, ela saboreava o arrepio molhado que a fazia gemer. E morria de vergonha, em imaginar que alguém soubesse...

Seus pensamentos voltaram ao mundo real e os dedos estavam sobre os pequenos seios. A espuma descia pela fina cintura e sabia que já estava há muito naquela caldeira.

A água parou de correr e a toalha branca logo a envolveu. Saiu até à cama onde ao lado, na cômoda, um secador a esperava para fazer seu cabelo dar uma respirada.

Deixou a toalha cobrir a cadeira e sentou-se nua em frente ao espelho.

Mônica tinha um desejo de se olhar todos os dias. E se olhava sim. Mas, logo tornava a ficar vermelha e andava à passos lentos para o guarda-roupa. Tinha de ir à escola. Uma instituição de ensino que não era apenas tradicional, mas cara. E por isso fazia todo o possível para mostrar aos pais (e até a alguns colegas) que ela adorava estudar. Isso era uma verdade incontestável. Suas notas, desde o ensino fundamental, sempre foram altas. Nunca soube o que era algo abaixo de 9. Uma garota que mostrava o que era ter força de vontade. Mesmo quando ela em verdade, não tinha vontade alguma. Pois o Outro Mundo a ela chamava...

EscuridãoOnde histórias criam vida. Descubra agora