𝟎𝟎𝟗| 𝓙𝓾𝓼𝓽𝓲𝓬̧𝓪

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𝟗

Sete anos se passaram lentamente para Bernardo. Cada natal ou data especial que se passava era ainda pior sem Lívia presente, ainda mais vendo todos os prisioneiros receberem visitas de seus parentes e família, menos ele. Ficar encarcerado em um lugar cheio de criminosos era o de menos para ele.

E hoje finalmente teria sua liberdade de volta. Há sete anos atrás quando mostrou o vídeo que Lívia deixou falando que ele era inocente, a justiça alegou que ela ainda não estava no seu juízo perfeito para tomar decisões, que não tinha assimilado as coisas, por isso fez uma escolha tão desesperada e precipitada.

No Brasil, a eutanásia era um crime previsto em lei como assassinato, no entanto, existia um atenuante que era verificado no caso de o ato ter sido realizado a pedido da vítima, que reduzia a pena para reclusão de três a sete anos.

— Finalmente, seja bem vindo de volta. — Afonso falou assim que o portão da penitenciária abriu. Ele estava diferente de alguns anos atrás, parecia bem mais firme, másculo, forte e até com alguns cabelos brancos.

Afonso havia visitado ele durante todos os anos, várias vezes ao mês. A amizade entre os dois tinha se fortalecido bastante.

— Obrigado por me buscar, mas ainda não sei para onde eu vou. — Bernardo comentou entrando no pequeno carro de Afonso.

— Passei na sua casa ontem e deixei tudo em ordem. Está um brinco, nem parece que estava inabitável por tanto tempo.

— Achei que a prefeitura tinha colocado a leilão. — Bernardo observou a penitenciária ficar para trás pelo retrovisor enquanto Afonso entrava na estrada para a capital.

No caminho para casa de Bernardo, o mesmo encarou deslumbrado o mar diante de si. Passou tanto tempo preso na cadeia que já havia esquecido como a natureza era bonita. Como era divino as ondas se quebrando no horizonte azul.

— Eu posso...? — Começou a dizer enquanto apontava para a imensidão da praia. Ainda era cedo e a mesma estava praticamente vazia.

Afonso estacionou o carro perto da orla.

— Vai lá, irmão. — Afonso respondeu, deixando claro que iria esperá-lo no carro, dando total privacidade a ele. — Não deve ter sido fácil ficar tanto tempo longe disso. — Argumentou.

Bernardo concordou em silêncio, deixando o carro. Abarrotou a manga da sua blusa social até os cotovelos e deixou os sapatos ao lado do carro de Afonso.

Teve vontade de correr, mas se controlou e caminhou lentamente pela areia morna da praia em direção a água. Sentiu muita falta de fazer aquele trajeto. Lívia e ele costumavam visitar a praia pelo menos uma vez por mês. Ela amava aquilo ali.

— Posso te sentir em cada grão de areia desse lugar... — Bernardo sussurrou de olhos fechados, quando finalmente seus pés tocaram o mar. — Posso ver seu sorriso em cada onda que se forma nesse horizonte.

Bernardo sorriu quando sentiu uma brisa leve soprar o seu rosto, bagunçando levemente seus cabelos.

— Perdão, Liv... — Ele murmurou observando as nuvens se movendo lentamente no céu. — Perdão por prometer cuidar de você e não ter cumprido.

Ficou mais um tempo observando, mas logo se sentou na areia, a mesma que havia ficado abraçado ao lado dela tantas e tantas vezes, vendo o dia passar sob seus olhos.

Bernardo observava calado Lívia saindo do mar enquanto corria na sua direção. Ela era tão linda, às vezes ele ainda se pegava admirado por ela como se fosse a primeira vez.

— A água está uma delícia, Bê! — Lívia confirmou sorridente, torcendo os cabelos molhados com as mãos. Aquelas gotículas de água escorriam por todo o seu corpo. — Se eu fosse você daria um pulo lá.

Bernardo sorriu e estendeu os braços para ela.

— Depois eu vou, agora vem cá. — Puxou Lívia para o seu colo, enchendo-a de beijos pelo rosto.

— Aí amor, você está me sujando toda de areia! — Lívia reclamou fazendo bico, mas logo gargalhou alto, segurando o rosto de Bernardo e levantando para beijá-lo na boca. — Essa sua barba está pinicando.

— Shiii. Depois conversamos sobre isso, agora vamos só observar esse pôr do sol maravilhoso. — Bernardo apontou para o céu, onde o sol preparava para se pôr no horizonte.

— Nossa! — Ela exclamou deslumbrada, encarando o céu alaranjado diante deles. Aquilo era uma das suas coisas favoritas no mundo, observar o sol se pôr com a pessoa que mais amava. — Obrigada — Sorriu.

Bernardo a encarou confuso.

— Por sempre estar ao meu lado, dividindo esses momentos especiais... — Lívia sussurrou, virando-se para ele novamente. Bernardo acariciou a bochecha dela e lhe deu um beijinho de esquimó. — Eu nunca vou me esquecer disso. Nunca. — Negou com a cabeça, emocionada.

— Sabe, são esses pequenos detalhes que fazem eu te amar tanto. — Bernardo confessou, beijando-a apaixonadamente.

Lívia foi se separando dele lentamente e se levantou. Abriu os braços para cima e rodopiou na areia.

— Sorria, meu amor! — Lívia gritou de olhos fechados. — Porque um dia eu vou ser uma estrela e levar a minha dança para os teatros do Brooklyn, da Broadway. E é aí que eu vou começar a conquistar o mundo!

— Enquanto isso... você vai ser uma moça molhada. — Bernardo respondeu, levantando-se e a pegando no colo.

— O que está fazendo? — Ela berrou sacudindo as pernas enquanto Bernardo corria em direção ao mar.

— Te fazendo feliz! — Ele respondeu jogando os dois dentro d'água.

Bernardo suspirou enquanto voltava ao presente. Lívia teve seus sonhos interrompidos por um idiota que sequer prestou socorros a ela, era o mínimo que esperávamos de um ser humano.

— Eu vou fazer justiça a você... — Bernardo sussurrou com a voz embargada. — Nem que seja a última coisa que eu faça nesse mundo, mas eu vou fazer justiça.

Ficaria só mais um pouco e voltaria para o carro de Afonso, não queria atrasá-lo mais em nada. Olhou para o lado e avistou uma mulher caminhando na direção em que ele estava. Ela também parecia estar muito triste e melancólica.

Observou atento quando ela mudou de direção e caminhou confiante em direção ao mar. Bernardo esperava que ela não fosse fazer nenhuma besteira, mas aquele pensamento tornou-se impossível quando a viu se jogar de vez na água, começando a se afogar.

Correu para socorrê-la, jogando-se dentro do mar de roupa e tudo. Uma vida era muito valiosa para acabar daquele modo.

Assim que a deitou na areia, desacordada, começou a bombardear seu peito com as mãos, até que a mesma cuspisse toda água que engoliu.

Assim que a deitou na areia, desacordada, começou a bombardear seu peito com as mãos, até que a mesma cuspisse toda água que engoliu

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