𝟎𝟐𝟐| 𝓙𝓾𝓼𝓽𝓲𝓬̧𝓪

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𝟐𝟐

Bernardo olhava atento em volta da grande sala enquanto descia os últimos degraus da escada. Havia vivido tantas e tantas coisas ali, mas se desejava realmente reconstruir sua vida, precisava deixar aquele passado de dor para trás.

As malas com suas coisas estavam reunidas perto da porta, e no centro da sala algumas caixas de papelão empilhadas uma em cima da outra. Dentro delas estava absolutamente tudo que era de Lívia. Roupas, jóias, fotos, tudo. Tinha doído muito no seu coração escolher a opção de abrir mão daquelas lembranças dela, mas era preciso. As melhores recordações com certeza ele levaria na sua cabeça e no coração.

Bernardo decidiu não se desfazer completamente da casa, apenas alugá-la para alguma pessoa interessada.

Havia um papel colorido caído do lado de uma das caixas e ele rapidamente foi devolver ao seu local de destino, era um banner do último espetáculo que Lívia havia feito.

Ela aparecia sorrindo na foto enquanto fazia um dos seus típicos movimentos de dança. Sua roupa era exatamente da cor de sua pele e contrastava perfeitamente com a sua boca, pintada de um vermelho paixão. Era a cor favorita de Lívia.

Bernardo respirou fundo e deixou sua mente vagar para outra recordação, uma das mais recentes que ele se lembrava dela dançando.

Lívia mexia as mãos minuciosamente ao lado do corpo. Cada passo, cada detalhe, era realizado com perfeição. Aquela noite em especial, ela estava muito nervosa antes de coreografar no palco. Tinha descoberto que havia um homem importante no meio da arte lhe assistindo. Quem sabe não era um sinal de sua ida para Nova York em breve.

E mesmo ansiosa, ela estava espetacular no palco. Lívia sempre tivera brilho próprio, nunca precisou se apresentar em coletivo além das peças que fazia.

Naquela noite ela recebeu a proposta mais importante da sua vida. Foi convidada para se apresentar na Broadway. E ela teria aceitado sem hesitar caso não lhe exigissem uma ida imediata para os Estados Unidos.

Lívia estava a pouco dias de estrear seu último espetáculo, que duraria dois meses, e não queria abrir mão daquilo para um único em Nova York. Ela tinha gastado uma boa grana investindo naquele projeto e não desistiria assim de uma hora para a outra. Por isso rejeitou o convite.

"Ainda tenho muito tempo, meu sonho pode esperar mais um pouco", foi o que ela disse a Bernardo um mês antes do seu acidente. O acidente que praticamente havia lhe tirado a vida e a liberdade, que interrompeu o seu sonho.

Se Lívia soubesse o que aconteceria semanas depois, com certeza teria aceitado o convite, independente das exigências, e Bernardo nem se importaria de ficar para trás. Porque, com ela em Nova York, talvez o acidente não tivesse de fato acontecido e Lívia ainda estaria ali com ele.

Voltando ao presente, Bernardo piscou os olhos repetidamente e olhou uma vez mais para o banner em suas mãos. Em seguida, enrolou-o novamente e colocou em qualquer canto de alguma caixa.

Agora sem nenhum propósito aparente para sua existência, a dor pela perda de Lívia parecia ser ainda maior. Antes, Bernardo estava ocupado demais bolando a sua justiça contra Luiz, mas agora que ele finalmente tinha conseguido, a razão havia partido.

 Antes, Bernardo estava ocupado demais bolando a sua justiça contra Luiz, mas agora que ele finalmente tinha conseguido, a razão havia partido

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Em algum canto da BR 101, Bernardo observava pelo retrovisor a cidade que sempre morou ficando para trás. Estava aliviado por finalmente se livrar daquele sentimento ruim, que esmagava seu peito e o impossibilitava de seguir em frente.

Havia vivido muitas coisas bonitas naquela cidade, com ou sem Lívia. Mas tinha acabado. Acabou assim que injetou aquele veneno da eutanásia na veia de Lívia, tinha acabado assim que ela mesma havia desistido de viver.

No fim das contas, aquela história não foi sobre um amor perdido, foi mais sobre como saber viver a vida sem ele. Foi sobre a redescoberta de nós mesmos e de como encontramos forças para nos levantarmos.

Talvez não tenha ficado satisfeito com a história, porque por mais que queiramos muito, a vida estava longe de ser como um conto de fadas. Provavelmente, lamentou-se com o que Bernardo fez a sua esposa, pode até não entender, mas ele fez por amor.

𝓕𝓲𝓶

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