.Capítulo 8.

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A lanchonete não deu nenhum sinal de ataque, e por mais que temesse, não me contive em andar com firmeza.
Não havia nada nos corredores, e quando passamos por uma loja de conveniência, encontramos uma escada rolante parada.
Tirei a arma da cintura e, por segurança, fui na frente de Kay.
Descemos e seguimos pelo corredor a esquerda.
- Espera. - Kay parou-me em frente a uma loja de bebidas.
A Baco's Alley - uma loja feita com tijolos laranja e um letreiro dourado - estava com as luzes acesas e a porta entreaberta.
- Deve ter algo aí. - Neguei.
- Exatamente. Se sua história for real, ela deve querer que vejamos algo aqui. - Kay rebateu.
Andou até a porta e entrou, fazendo-me seguir o cheiro de confusão.
O interior estava desarrumado, sem as grandes pilhas de garrafas ou uma boa higiene, já que insetos andavam pela superfície mofada dos azulejos quebrados.
O chão estava grudento e vários tipos de garrafas estavam espatifadas no chão.
- Vê algo? - Kay perguntou, olhando as estantes.
- Não. - Neguei, olhando em volta; a arma ainda na mão. - Vamos embora.
- Espera. - Kay correu para o fundo da loja.
Alguns sons de vidro sendo chutado e ela gritou:
- Energético!
É voltou com vários dos vidros nas mãos.
Meu bolso já estava cheio e fazia muito barulho.
- É só? - Perguntei.
- Vamos ver nos caixas. - Disse Kay, andando até o final do corredor á direita.
Acompanhei e vasculhei as gavetas junto com ela.
- Jack, olhe. - Ela puxou uma pequena caixa de madeira.
Estava entalhada com aquele símbolo  que vi no hospital, do círculo com outros círculos dentro.
- Deve ser algo da Ordem. - Kay anunciou.
- Consegue abrir? - Perguntei.
Ela forçou a tampa.
- Não. - Disse. - Preciso da chave.
- Mas que droga... - Reclamei. - Tem certeza que viu em tudo?
- Absoluta. - Disse.
- Traga ela com a gente então. Vamos procurar em outro lugar. - Eu disse, tentando manter a calma.
- Já devemos estar perto do Gigastrore. Pode estar lá. - Disse Kay, botando a caixa debaixo do baixo.
- Calma. - Eu disse, notando algo no último caixa.
Andei até ele e, embolado numa sacola plástica, havia um mapa do local.
Estávamos no Silent Hill Town Center.
- O Gigastore fica logo atrás das escadas. - Eu disse, olhando o mapa. - Havia um corredor pra lá?
- Eu só lembro de um pra esquerda e outro pra direita. - Kay agitou os ombros.
Suspirei, impaciente e com medo.
- Vamos.

*  *  *

Retornamos silenciosamente pelo corredor, vendo um extenso corredor que simplesmente não era possível estar ali antes.
Alguns passos e uma grande fachada pintada de vermelho com o nome da loja surgiu.
Kay pegou a chave e a virou na fechadura.
O interior estava silencioso e algumas televisões, no canto, estalavam.
Nas prateleiras, descansavam vários tipos de cabos, fios, fones e rádios antigos.
Enquanto passávamos por um dos longos corredores, algo me chamou a atenção.
Havia um tipo de suporte do tamanho da caixa, com fios e pequenos plugues para liga-los.
Havia um fio azul, um vermelho e um amarelo, ligados e um tipo de gerador elétrico com uma pequena lâmpada vermelha ligada.
Logo acima dos plugues haviam etiquetas que diziam, respectivamente, "Mãe", "Pai" e "Filho".
Kay observava pesados fios de televisões antigas antes de se aproximar.
Eu não consegui tirar os olhos daqueles fios.
- O que é isso? - Ela perguntou.
- É a cor favorita dela... - Eu disse. - Ela sempre quis ser mãe.
- O que? - Kay indagou.
- Eu acho que é isso. - Eu disse, pegando um dos fios.
Liguei o fio azul no plugue "Pai", o amarelo - a cor favorita de Mercy - no plugue "Mãe", e sobrou somente o vermelho para o "Filho".
O gerador deu um estalo, mas não fez nada.
- Me entregue a caixa. - Pedi.
Ela o fez e a coloquei no suporte, tomando um pequeno choque na ponta dos dedos.
A caixa estalou, remexeu e abriu com um grande estrondo elétrico.
A tampa tombou para trás e eu desliguei o pequeno gerador.
Dentro da caixa havia um pequeno anel com uma esfera leitosa e vermelho-sangue, que reluziu quando o peguei.
Junto, uma nota pequena que dizia:

 Em descobertos de Dioscorides, entrego-lhe o segredo de tudo para que leve-me caso tudo dê errado ao final de nossa jornada.

Meu amor, eterno amado, eu prefiro salvar a tua vida do que ao do nosso Salvador, pois ainda posso me imaginar em teus braços e sentir teus lábios, enquanto só vejo fogo vindo do céu junto a ele.

Leve-a com você, mas não mostre a ninguém e não use-o. Só enfie na garganta daqueles que um dia quererem devorar teu coração.

Teu coração pertence a mim, e a mim apenas.

- O que é isso? - Kay arregalou os olhos.
- Eu não sei. Mas parece que deixaram isso para alguém amado. - Eu mirei o anel e o coloquei no bolso.
- Isso pode estar amaldiçoado! - Kay disse, em tom de urgência. - Jack, se sua esposa é mesmo uma bruxa, isso pode acabar metendo a gente em confusão.
- Eu vou levar. - Eu decidi, sem negociação, voltando a explorar a loja.
- Você está maluco. - Disse Kay, me parando. - Jogue ele fora antes que essa mulher encontre a gente.
- Ela pode ver independente do que façamos. - Neguei. - Vamos continuar.
- Você é um teimoso! - Ela disse, indignada. - Isso pode ser perigoso.
- Se ela quisesse ter nos matado, teria feito isso quando mandou o Feiticeiro me atacar ou quando aquele esqueleto esquisito te encontrou na Loja de Antiguidades. - Rebati, procurando nas prateleiras cheias de equipamentos eletrônicos ultrapassados.
- Não acredito que está arriscando a própria segurança e de sua parceira para conviver com essas maluquices. - Kay continuava a insistir. - Jack, ela não é mais sua esposa. Aquele livro dizia sobre sacrifício. E se ela sacrificou sua antiga persona? Eu já investiguei estranhas situações de assassinos com dupla personalidade.
- Ela não é uma assassina. Ela foi morta. - Eu parei.
Tentei segurar-me em não fazer besteira nenhuma.
Voltei a seguir o corredor, até o fim da loja.
Um balcão alto exibia uma grande máquina registradora, uma revista antiga, uma chave de fenda e uma grande escopeta.
Meu ânimo voltou e, apesar de não saber atirar direito de escopeta, não consegui conter a felicidade.
- Aqui. - Dei a Colt para Kay. - Agora pode se defender melhor.
Peguei a escopeta e engatilhei.
Devia haver uns quatro tiros ali.
Abaixei a arma e percebi algo impedindo a caixa registradora de fechar.
Puxei, abrindo a gaveta.
Era um tipo de símbolo entalhado no metal, sendo o mesmo que estava na caixa.
Um grande meio-círculo prateado, ostentando um círculo no canto e metade de um abaixo.
Parecia que era somente metade de outra metade.
Sorrindo, virei-me para Kay.
- Olha isso. - E mostrei a ela.
Sua expressão, porém, era de terror.
Engatilhou a arma e apontou para mim.
Levantei as mãos, mas ela gritou:
- Abaixa!
Eu obedeci e...
Dois tiros e os braços do monstro caíram sobre mim.
Piche grudento escorregou pelo meu ombro e logo vi um daqueles bichos cheios de braços debruçado e morto em cima do balcão.
- Obrigado. - Agradeci.
- Você já percebeu como as balas não acabam? - Kay perguntou.
- Não. - Levantei  uma das sobrancelhas.
Quando Kay retirou o pente...
Estava vazio.
Ela me olhou, esperando uma resposta, mas eu não soube responder.
- Não temos tempo para refletir sobre isso. Vamos embora. - Eu disse.
Saímos da loja, devidamente armados, e seguimos pelo corredor de onde viemos.
O mapa indicava uma saída em frente à escada, mas não me lembrava de ter uma porta lá.
Pois ali estava ela.
Calmamente fomos até a saída, mas estava fortemente trancada.
- Deve haver uma chave por...
Eu congelei.
Quando me virei, sua sombra olhou-me.
Por trás dos cabelos revoltosos e lisos, ela sorriu.
Mercy estava ali, perto da escada rolante parada, vestida com seu lindo vestido preto.
Estava limpa e sem sinais de esforço, diferente de todo ambiente sujo.
- Estamos orgulhosos de você, meu amor. - Ela disse, sorrindo. - Eu não conhecia este lugar tão bem, mas você me impressionou.
- Mercy...
Tentei falar com ela, mas Kay deu um passo a frente e engatilhou a arma apontada para o corpo maravilhoso da minha esposa.
- Tire-nos daqui. Já chega. - Ela estreitou os olhos em uma raiva escondida até agora. - Eu não confio em você.
- E não preciso de sua confiança, minha cara. Não estragarei nada do que virá. - Mercy respondeu, calma. - Agora aponte isso para outro lugar. Não irá me matar de uma maneira tão vil.
- Não quero saber. Terei o prazer de acertar você. - Kay aproximou o dedo do gatilho.
Mercy somente deu um fino riso e estendeu sua mão para o corredor a nossa esquerda.
- Leve-a. - Mandou.
Esperava ser novamente o Feiticeiro, o monstro do Hospital Alchemilla, mas o que apareceu fora um gigantesco esqueleto podre e fétido, armado com uma foice e retalhos pendurados pelos ossos.
Ele apareceu correndo como um louco; algo como um sorriso estampado na mandíbula mole.
Agarrou Kay antes que pudesse atirar e simplesmente sumiu com ela.
Eu não vi para onde foram.
- Eu não irei impedi-lo de ir para a igreja, meu amado. - Mercy continuou a falar. - Mas eu lhe aguardo no motel, nosso lugar especial.
- O que você...?
Novamente fui interrompido.
Das sombras atrás de Mercy, uma silhueta que me fez sentir medo surgiu de novo.
O Feiticeiro tirou sua vara com um crânio da ponta da faixa amarrada na cintura e a apontou para mim.
Senti o ar pesar e eu cair na escuridão profunda, ainda sem respostas da minha Mercy.

Silent Hill : SacrifícioOnde histórias criam vida. Descubra agora