A verdade terrível

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-  Jory  -começou  Madame  M.,  quando  seguíamos  para  casa  em  seu  velho  e    sacolejante  calhambeque.  -  Seus pais  não  lhe  fazem  muitas  confidências  sobre o    passado,    não é  mesmo? -  Falam  conosco  sobre  o  assunto  -  repliquei  rigidamente,  ressentindo-me    contra  a  maneira  pela  qual  ela insistia  em  fazer  perguntas  sobre  coisas  que  não  tinham  importância  -  realmente  não  tinham.  -    Sabem escutar  muito bem  e todo mundo diz  que  são  o  melhor  tipo de  pessoas  com  quem  conversar. Ela  fungou. -  Saber  escutar  bem  é o método perfeito de evitar  responder  perguntas que se    prefere  ignorar. -  Ora,  escute  uma  coisa,  vovó:  meus  pais  prezam  sua  privacidade.  Pedem  que    tanto  eu  como  Bart  evitemos conversar  sobre nossa vida  particular  com  os    colegas.    Afinal,  faz  sentido  que uma família seja  unida. -  É  mesmo...? -  Claro que é!  -  gritei.  -  Eu também  gosto de privacidade! -  Você  está numa idade que  necessita de privacidade;  eles  não. -  Madame,  minha  mãe  foi  uma  espécie  de  celebridade  e  meu  pai  é  médico;  Mamãe    casou-se  três  vezes.  Não creio que ela deseje  que  sua  ex-cunhada, Amanda, saiba onde  moramos. -  Por que  não? -  Minha tia Amanda  não é  uma pessoa muito agradável. Só isso. -  Jory, você  confia em  mim? -  Sim  -  respondi, embora não confiasse. -  Então,  conte-me  tudo  a  respeito  de  Paul.  Diga-me  se  ele  está  mesmo  tão    doente  quanto  ela  alega,  ou  se ainda  está  vivo,  pelo  menos.  Diga-me  por  que    motivo  Christopher    mora  com  vocês  e  é  quem  faz  o  papel  de pai  para você  e Bart.
Oh,  eu  não  sabia  o  que  dizer  e  me  esforçava  para  ser  um  bom  ouvinte,  de  modo    que  ela continuasse  a  falar  e eu  pudesse juntar  as  peças  do  quebra-cabeças.    Certamente,    eu  não  desejava  que  ela  visse  o  quadro  completo antes de  mim. Fez  um  prolongado silêncio  e, finalmente, ela falou. -  Você  sabe,  depois  que  Julian  morreu,  sua  mãe  morou  com  você  na  casa  de    Paul  e,  depois,  levou  você  e Carrie,  a  irmã  caçula,  para as  montanhas  da  Virgínia. A  mãe  dela  morava  lá,  numa  bela  casa.  Parece-me    que Catherine  estava  resolvida  a  estragar  o  segundo  casamento  da  mãe.  O  marido    da    mãe  de  sua  mãe  era  um homem chamado Bartholomew Winslow. Aquele  maldito  nó  me  voltou  à  garganta  e  ficou  doendo  ali.  Eu  não  diria  a    ela  que  Bart  era  filho  de  outro homem que não o Dr.Paul  -  eu não  diria! -  Vovó,  se  deseja  que  eu  continue  a  amá-la,  faça  o favor  de  não  me  contar    coisas desagradáveis  a  respeito  de minha mãe. Madame M. estendeu  a mão magra para apertar  a minha. -  Muito bem, admiro-o por  tanta lealdade. Só quero que tome conhecimento dos    fatos. A essa  altura, quase  saiu  da  estrada e  jogou o carro numa  vala. -  Vovó,  sei  dirigir.  Se  estiver  cansada  e  não  conseguir  enxergar  bem  as    placas  de  sinalização,  posso  tomar  o volante. Então, você  descansaria. -  Permitir  que  um  menino  de  quatorze  anos  me  sirva  de  motorista?  Ficou    maluco?  Quer  dizer  que  não  se sente  seguro  comigo  ao  volante? Toda  a  minha  vida,  sempre  tive  quem  guiasse  para  mim.  Primeiro,    carroças de feno, depois  carruagens,  táxis,  limusines... Então,  três  semanas  antes  de  vir  para  cá,  logo  depois  que  recebi  sua  carta    relatando  o  acidente  com  sua  mãe, tomei  aulas  de direção aos  setenta  e quatro    anos de    idade... e  agora você  está vendo como aprendi  bem. Finalmente,  após  escaparmos  por  milagre  de  quatro  desastres,  chegamos  à    nossa  alameda  circular  de  acesso à  casa.  E  lá,  no  jardim  da  frente,  estava  Bart,    à  espreita    de  algum  animal  invisível,  empunhando  o  canivete como um  punhal, pronto para    golpear  e  matar. Madame  M.  ignorou-o  ao  estacionar  o  carro.  Pulei  depressa  e  corri  para  abrir    a  porta  do  lado  dela,  mas minha avó já estava fora do  carro antes que  eu lá    chegasse.    E, logo atrás dela, Bart  feria o  ar  com  o punhal. -  Morte ao  inimigo!  Morte  a todas  as velhas  que usam  trapos negros e    surrados!  Morte, morte, morte! Calmamente,  como  se  não  visse  nem  escutasse,  Madame  M.  caminhou  em  direção  à    casa.  Empurrei  Bart para  um  lado e  murmurei: -  Se quer  passar  o  dia  inteiro trancado no quarto, continue a  comportar-se    assim. -  Negro...  detesto  negro...  preciso  eliminar  todos  os  demônios  vestidos  de    negro!    Mas,  depois  de  fechar cuidadosamente  o  canivete,  guardou-o  no  bolso  -  após    acariciar  o  cabo  de  madrepérola  que  ele  tanto admirava. E não era para menos,    pois    eu gastara sete  dólares  para lhe dar  aquele  canivete de  presente. Sem  esperar  que  viessem  atender  seu  impaciente  toque  de  campainha,  Madame  M.    entrou  na  casa  e  jogou  a bolsa  no  pequeno  sofá  do  vestíbulo.  O  martelar  da    máquina    de  escrever  chegava-nos  levemente  aos ouvidos. -  Escrevendo  -  comentou  Madame  M.  -  Aposto  que  ela  se  dedica  a  isso  com    tanta  paixão  quanto  se entregava à  dança... Não  respondi,  mas  tive  vontade  de  correr  à  frente  dela  e  prevenir  Mamãe.    Vovó  não  permitiu.  Mamãe ergueu os  olhos, muito  espantada  por  deparar-se  repentinamente com  Madame Marisha em  seu quarto. -  Catherine!  Por  que não me contou que o Dr. Paul  Sheffield morreu? O  rosto  de  Mamãe  ficou  muito  vermelho  e,  depois,  perdeu  a  cor.  Ela  baixou  a    cabeça  e  levantou  as  mãos para  cobrir  o  rosto.  Recuperando  quase  imediatamente  a    compostura,  tornou  a  erguer  a  cabeça,  lançou  um olhar  raivoso a  Madame Marisha    e, então,  começou a  arrumar  os  papéis  numa pilha. -  É  um  prazer  revê-la,  Madame  Marisha.  Seria  melhor  se  a  senhora  tivesse    telefonado  antes.  Entretanto, tenho  certeza  de  que  Emma  pode  arranjar  uma  nova    distribuição    das  costeletas  de  carneiro  e  reservar  duas para  a senhora... -  Não  fuja  de  minha  pergunta  com  essa  conversa  fiada  sobre  comida.  Pensa    mesmo  que  eu  poluiria  meu corpo  com  suas estúpidas  costeletas  de carneiro? Só  como comida natural, que  é saudável, e  mais nada. -  Jory  -  disse  Mamãe  -,  caso  Emma  tenha  visto  Madame  chegar,  corra  até  lá  e    diga-lhe  para  não  botar  outro lugar  à mesa. -  Para  que  toda  esta  tagarelice  idiota  a  respeito  de  costeletas  de  carneiro?    Vim  aqui  para  lhe  fazer  uma pergunta importante e você fica falando de comida! Catherine,  responda minha pergunta: Paul Sheffield morreu?
Mamãe  olhou  para  mim  e  fez-me  um  gesto  para  desaparecer  dali,  mas  não  pude.    Finquei  pé,  desafiando-a. Ela empalideceu ainda mais e pareceu mais abismada que eu, o seu querido, me recusasse a obedecer. Então, como se  resignada, murmurou de modo indistinto: -  A  senhora  nunca  me  perguntou  a  respeito  de  mim  mesma  ou  de  meu  marido,  de    modo  que  julguei  que  só se  interessasse  por  Jory. -  Catherine! -  Jory, faça o  favor  de sair  imediatamente deste quarto.  Ou precisarei    levantar-me  e empurrá-lo pela porta? Recuei  e saí  uma fração  de  segundo antes  que ela  chegasse  à porta  e a    fechasse  com  estrondo. Eu mal  conseguia  escutar  o  que era dito  no outro  lado  da porta, mas  colei  o    ouvido a ela e  prestei  atenção. -  Madame,  a  senhora  nem  pode  imaginar  o  quanto  preciso  de  alguém  com  quem  eu    possa  desabafar. Todavia, sempre se mostrou tão  fria,  tão  distante,  que  eu    julguei    que não conseguiria compreender-me. Silêncio. Alguém  fungou. -  Sim,  Paul  morreu,  anos  atrás.  Tento  não  pensar  nele  como  morto,  mas  como    ainda  vivo,  embora  invisível. Trouxemos  para  cá  suas  estátuas  de  mármore  e  seus  bancos  de  jardim,  tentando  fazer  com  que  nosso    jardim se  tornasse  igual  ao  dele.  Fracassamos.  Não  obstante,  quando  estou  no  jardim  à  hora  do  crepúsculo,  parece que consigo senti-lo junto a mim, ainda me amando. Fomos casados por tão pouco tempo. E ele nunca  teve realmente  boa  saúde...  de  modo  que,  quando  morreu,  restou-me  uma  sensação  de  não    me  ter  realizado, continuando  a  querer  dar-lhe  os  anos  de  vida  matrimonial  feliz    que  eu  lhe  devia.  De  algum  modo,  desejava compensá-lo por  Julia, sua  primeira    mulher. -  Catherine  -  disse  Madame M. baixinho    -, quem  é esse homem  que seus  filhos chamam  de Papai? -  Madame,  o  que  eu  faço  não  é  da  sua  conta  -  pude  sentir  a  raiva  crescendo    na  voz  de  minha  mãe.  -  Não vivemos  no  mesmo tipo de  mundo em  que a  senhora foi    criada.    A  senhora não viveu  minha vida nem  esteve dentro  de  mim.  Não  conheceu  a  espécie    de  privações  que  sofri  quando  era  jovem  e  mais  necessitava  de amor. Não fique aí  sentada, condenando-me com seus malvados olhos negros, pois é incapaz de compreender. -  Oh,  Catherine,  quão  pouco  crédito  você  dá  à  minha  inteligência!  Julga-me    imbecil,  cega  e  insensível?  Sei muito bem quem é o homem que meu neto chama de Papai. E não é de espantar que você jamais tenha conseguido  amar  Julian  o  suficiente.  Eu  costumava  pensar  que  era  Paul,  mas  agora    vejo    que  não  era  Paul quem  você  realmente  amava;  também  não  foi  aquele  tal    Bartholomew  Winslow...  era  Christopher,  seu irmão.  Pouco  me  importa  o  que  façam  você  e  seu    irmão.  Se  você  dorme  na  cama  dele  e  julga  que ali  encontra  a  felicidade  que  lhe  foi  roubada  há  tanto  tempo,  sou  capaz  de    racionalizar  e  dizer  que  todos  os dias  acontecem  coisas  muito  piores  que  um    irmão  e  uma  irmã    se  comportarem  como  marido  e  mulher.  Mas preciso  proteger  meu  neto.  Ele  está  em    primeiro  lugar.  Você  não  tem  o  direito  de  fazer  seus  filhos  pagarem por  seu  relacionamento ilegal. Oh!  ... O  que dizia  ela? Mamãe,  faça  alguma  coisa,  diga  alguma  coisa,  faça  que  eu  me  sinta  bem  outra    vez!  Faça  que  eu  volte  a  me sentir  seguro e  real...  faça  sumir  tudo  isto  -  esta    conversa    de um  irmão que  você  jamais mencionou. Agachei-me  ainda  mais,  escondendo  o  rosto  nas  mãos,  não  querendo  escutar,    mas  não  me  atrevendo  a  sair dali. A voz  de Mamãe  soou forçada  e muito  rouca, como se  ela  tivesse dificuldade    para conter  as  lágrimas: -  Não sei  como a senhora descobriu... Por  favor,  tente  compreender... -  Como  eu  disse  antes,  pouco  me  importa...  e  creio  que  compreendo.  Você  não    pôde  amar  meu  filho,  assim como  não  pôde  amar  qualquer  outro  homem,  mais  do  que    ama    seu  irmão.  Isso  me  causa  amargura.  Choro por  dentro  por  causa  de  Julian,  que  a    considerava  um  anjo  de  perfeição,  a  sua  Catherine,  a  sua  Clara,  a  sua bela  adormecida  que ele jamais conseguiu despertar. Eis o que você era para ele, Catherine: a personificação  de  todas  as  heroínas  do  balé,  virgem  e  pura,  doce  e  casta  -  e,  no    final,    você  não  é  melhor que  o  resto  de  nós.  -  Por  favor!  -  exclamou  Mamãe.  -  Tentei  fugir  de  Chris.  Tentei  amar  mais    Julian.  Tentei, de verdade. -  Não, você  não tentou. Se  tivesse  tentado,  teria conseguido. -  A senhora  não pode saber!  -  veio o brado desesperado de mamãe. -  Catherine,  você  e  eu  trilhamos  a  mesma  estrada  durante  muitos  anos.  E  você    deixou  cair  pelo  caminho pequenos pedaços de  informação. Além  disso, existe  Jory, que faz  o possível  para  protegê-la... -  Ele  não sabe!  Por  favor, diga que  ele não sabe! -  Ele  não  sabe  -  acalmou-a  Madame  M.  num  tom  suave  -  para  ela.  -  Mas  ele    fala  e  revela  mais  do  que  sabe. Os  jovens  são  assim  mesmo:  julgam  que  os  velhos  são  senis  e  incapazes  de  somar  dois  com  dois.    Pensam Mamãe  olhou  para  mim  e  fez-me  um  gesto  para  desaparecer  dali,  mas  não  pude.    Finquei  pé,  desafiando-a. Ela empalideceu ainda mais e pareceu mais abismada que eu, o seu querido, me recusasse a obedecer. Então, como se  resignada, murmurou de modo indistinto: -  A  senhora  nunca  me  perguntou  a  respeito  de  mim  mesma  ou  de  meu  marido,  de    modo  que  julguei  que  só se  interessasse  por  Jory. -  Catherine! -  Jory, faça o  favor  de sair  imediatamente deste quarto.  Ou precisarei    levantar-me  e empurrá-lo pela porta? Recuei  e saí  uma fração  de  segundo antes  que ela  chegasse  à porta  e a    fechasse  com  estrondo. Eu mal  conseguia  escutar  o  que era dito  no outro  lado  da porta, mas  colei  o    ouvido a ela e  prestei  atenção. -  Madame,  a  senhora  nem  pode  imaginar  o  quanto  preciso  de  alguém  com  quem  eu    possa  desabafar. Todavia, sempre se mostrou tão  fria,  tão  distante,  que  eu    julguei    que não conseguiria compreender-me. Silêncio. Alguém  fungou. -  Sim,  Paul  morreu,  anos  atrás.  Tento  não  pensar  nele  como  morto,  mas  como    ainda  vivo,  embora  invisível. Trouxemos  para  cá  suas  estátuas  de  mármore  e  seus  bancos  de  jardim,  tentando  fazer  com  que  nosso    jardim se  tornasse  igual  ao  dele.  Fracassamos.  Não  obstante,  quando  estou  no  jardim  à  hora  do  crepúsculo,  parece que consigo senti-lo junto a mim, ainda me amando. Fomos casados por tão pouco tempo. E ele nunca  teve realmente  boa  saúde...  de  modo  que,  quando  morreu,  restou-me  uma  sensação  de  não    me  ter  realizado, continuando  a  querer  dar-lhe  os  anos  de  vida  matrimonial  feliz    que  eu  lhe  devia.  De  algum  modo,  desejava compensá-lo por  Julia, sua  primeira    mulher. -  Catherine  -  disse  Madame M. baixinho    -, quem  é esse homem  que seus  filhos chamam  de Papai? -  Madame,  o  que  eu  faço  não  é  da  sua  conta  -  pude  sentir  a  raiva  crescendo    na  voz  de  minha  mãe.  -  Não vivemos  no  mesmo tipo de  mundo em  que a  senhora foi    criada.    A  senhora não viveu  minha vida nem  esteve dentro  de  mim.  Não  conheceu  a  espécie    de  privações  que  sofri  quando  era  jovem  e  mais  necessitava  de amor. Não fique aí  sentada, condenando-me com seus malvados olhos negros, pois é incapaz de compreender. -  Oh,  Catherine,  quão  pouco  crédito  você  dá  à  minha  inteligência!  Julga-me    imbecil,  cega  e  insensível?  Sei muito bem quem é o homem que meu neto chama de Papai. E não é de espantar que você jamais tenha conseguido  amar  Julian  o  suficiente.  Eu  costumava  pensar  que  era  Paul,  mas  agora    vejo    que  não  era  Paul quem  você  realmente  amava;  também  não  foi  aquele  tal    Bartholomew  Winslow...  era  Christopher,  seu irmão.  Pouco  me  importa  o  que  façam  você  e  seu    irmão.  Se  você  dorme  na  cama  dele  e  julga  que ali  encontra  a  felicidade  que  lhe  foi  roubada  há  tanto  tempo,  sou  capaz  de    racionalizar  e  dizer  que  todos  os dias  acontecem  coisas  muito  piores  que  um    irmão  e  uma  irmã    se  comportarem  como  marido  e  mulher.  Mas preciso  proteger  meu  neto.  Ele  está  em    primeiro  lugar.  Você  não  tem  o  direito  de  fazer  seus  filhos  pagarem por  seu  relacionamento ilegal. Oh!  ... O  que dizia  ela? Mamãe,  faça  alguma  coisa,  diga  alguma  coisa,  faça  que  eu  me  sinta  bem  outra    vez!  Faça  que  eu  volte  a  me sentir  seguro e  real...  faça  sumir  tudo  isto  -  esta    conversa    de um  irmão que  você  jamais mencionou. Agachei-me  ainda  mais,  escondendo  o  rosto  nas  mãos,  não  querendo  escutar,    mas  não  me  atrevendo  a  sair dali. A voz  de Mamãe  soou forçada  e muito  rouca, como se  ela  tivesse dificuldade    para conter  as  lágrimas: -  Não sei  como a senhora descobriu... Por  favor,  tente  compreender... -  Como  eu  disse  antes,  pouco  me  importa...  e  creio  que  compreendo.  Você  não    pôde  amar  meu  filho,  assim como  não  pôde  amar  qualquer  outro  homem,  mais  do  que    ama    seu  irmão.  Isso  me  causa  amargura.  Choro por  dentro  por  causa  de  Julian,  que  a    considerava  um  anjo  de  perfeição,  a  sua  Catherine,  a  sua  Clara,  a  sua bela  adormecida  que ele jamais conseguiu despertar. Eis o que você era para ele, Catherine: a personificação  de  todas  as  heroínas  do  balé,  virgem  e  pura,  doce  e  casta  -  e,  no    final,    você  não  é  melhor que  o  resto  de  nós.  -  Por  favor!  -  exclamou  Mamãe.  -  Tentei  fugir  de  Chris.  Tentei  amar  mais    Julian.  Tentei, de verdade. -  Não, você  não tentou. Se  tivesse  tentado,  teria conseguido. -  A senhora  não pode saber!  -  veio o brado desesperado de mamãe. -  Catherine,  você  e  eu  trilhamos  a  mesma  estrada  durante  muitos  anos.  E  você    deixou  cair  pelo  caminho pequenos pedaços de  informação. Além  disso, existe  Jory, que faz  o possível  para  protegê-la... -  Ele  não sabe!  Por  favor, diga que  ele não sabe! -  Ele  não  sabe  -  acalmou-a  Madame  M.  num  tom  suave  -  para  ela.  -  Mas  ele    fala  e  revela  mais  do  que  sabe. Os  jovens  são  assim  mesmo:  julgam  que  os  velhos  são  senis  e  incapazes  de  somar  dois  com  dois.    Pensam Deixei-me  cair  de  joelhos  e  encostei  a  cabeça  na  porta,  fechando  os  olhos  e    tentando  respirar  fundo,  para fazer  o  estômago parar  de  roncar  e conter  as    ameaças    de vômito. Mamãe  tornou a  falar.  Era  evidente  que  se  esforçava  muito para manter-se    calma. -  Perder  Bart  para  uma  instituição,  embora  por  poucos  meses,  está  quase  me    levando  à  loucura.  Todavia, perder  Jory,  também,  me  deixaria  louca.  Amo  meus    filhos,    Madame.  Ambos.  Embora  a  senhora  jamais  me tenha  dado  crédito  de  ter  sido  piedosa    para  com  Julian,  fiz  o  possível  por  ele.  Não  era  um  homem  fácil  de  se conviver.    A  senhora  e  seu  marido  fizeram  de  Julian  o  que  ele  era,  não  eu.  Eu  não  o    obriguei  a  dançar quando  ele  teria  preferido  jogar  bola.  Eu  não  o  castiguei,    forçando-o    a  praticar  balé  todos  os  fins-desemana,  de  modo  que  não  lhe  sobrava  tempo  para    divertir-se.  A  senhora  e  Georges  fizeram  isso.  Mas  fui  eu quem  pagou  o  preço.    Julian    queria  devorar-me  viva,  proibindo-me  de  ter  amigos  à  exceção  dele  próprio. Tinha    ciúmes  de  todos  os  homens  que  me  olhavam,  de  qualquer  homem  para  o  qual  eu    olhasse.    Tem  idéia do que seja viver com um homem que suspeita de que o traímos sempre que ele vira as costas? E não era eu quem  traía  -  era  ele.  Fui  fiel  a  Julian.  Nunca  permiti  que  outro  homem  me    tocasse,    mas  ele  não  poderia dizer  o  mesmo.  Desejava  toda  garota  bonita  que  avistava.    Queria  usá-las,  descartá-las  e  depois  voltar  para mim, a fim  de que  eu o    abraçasse  e    lhe dissesse  o quanto ele era maravilhoso... e  eu não conseguia dizer  que ele    era  maravilhoso  quando  o  seu  corpo  inteiro  fedia  com  o  perfume  de  outra  mulher.  Então,  ele  me espancava...  a senhora sabia  disso?  Tinha  que  provar  algo  a  si  mesmo.  Na  época, eu  não  sabia o  que  ele  tinha que provar,    mas  agora sei:  ele precisava encontrar  o  amor  que a  senhora  lhe negara. Senti-me  ainda  mais  fraco  e  doente  quando  vi  minha  avó  empalidecer.  Agora,    eu  perdia  também  meu verdadeiro pai, que eu  adorava como a  um  santo. -  Você  exprime  muito  bem  seus  pontos  de  vista,  Catherine,  e  eles  me  ferem.    Agora,  porém,  permita-me exprimir os meus. Admito que Georges e eu cometemos erros com Julian e que meu filho e você pagaram o preço disso. Pretende punir  Jory  da mesma  maneira? Deixe-me  levá-lo  de  volta  a  Greenglenna.  Uma  vez  lá,  providenciarei  um  teste    para  ele  em  Nova  Iorque. Tenho  ligações  importantes.  Consegui  projetar  dois    bailarinos    brilhantes,  que  se  chamavam  Julian  e Catherine.  Não  fui  totalmente  má.  Nem    Georges.  Talvez  tenhamos  permitido  que  nossos  sonhos  nos cegassem  em  relação  ao    que  os    outros  desejavam;  talvez  tenhamos  exagerado  na  tentativa  de  viver através  de  nosso  filho.  Era  isso  que  desejávamos,  Catherine:  viver  através  de  Julian.    Agora,  Julian  está morto  e  deixou  um  filho,  apenas  um  -  o  seu  filho,  Catherine.    Sem    Jory,  não  tenho  motivo  para  permanecer viva. Com  Jory, tenho todos os  motivos    para continuar. Pelo  menos  uma vez  em  sua  vida, dê, não  tire! NÃO, NÃO!  Eu não queria  ir  com  Madame M. Vi  Mamãe  baixar  a  cabeça até  que  seus  cabelos  caíram  em  duas  macias  ondas    douradas.  Sua  mão  trêmula  se ergueu para  tocar  a  testa,  como se  outra  daquelas    terríveis    dores de  cabeça  a atacassem. Pecadora  ou  não,  eu  não  queria  deixá-la.  Esta  era  a  minha  casa,  meu  lar,  meu    mundo;  ela  ainda  era  minha mãe  e  Chris  ainda era  meu padrasto;  além  disso, havia    Bart,    Cindy  e  Emma,  também.  Éramos  uma  família  - certo ou  errado,  éramos uma família. Afinal, Mamãe  pareceu  encontrar  uma solução.  A  esperança me brotou  no    coração. -  Madame,  entrego-me  à  sua  clemência  e  espero  em  Deus  que  a  senhora  tenha    alguma.  Entendo  que  a senhora  bem  poderia  ter  razão,  mas  não  posso  abrir  mão  de  meu  filho  mais  velho.  Jory  é  a  única  coisa  boa que    restou  de  meu  casamento  com  Julian.  Se  a  senhora  o  levar,  levará  parte  de  mim,  uma  parte  muito importante  de  mim,  da  qual  não    poderei  abrir  mão  sem  morrer. Jory  me  ama.  E  ama  Chris  tanto  quanto  seria capaz    de  amar    seu  próprio  pai.  Mesmo  que  tenha  que  arriscar  sua  carreira,  não  posso  arriscar    perder  o  seu amor,  permitindo  que  ele  se  vá  com  a  senhora...  portanto,  não  me    peça    o  impossível,  Madame.  Não  posso deixar  Jory  partir. Madame  M.  fitou  Mamãe,  dura  e  prolongadamente,  enquanto  meu  coração  pulsava    com  tanto  ruído  que  tive a impressão de  que elas poderiam  escutá-lo. Então,    minha    avó se  levantou, pronta para sair. -  Hah!  -  fungou  ela.  -  Agora,  vou-lhe  falar  com  franqueza,  Catherine,  e    talvez  pela  primeira  vez  dir-lhe-ei toda  a  verdade.  Desde  o  primeiro  dia  em  que    a  vi,    invejei-lhe  a  juventude,  a  beleza  e,  sobretudo,  o  genial talento  para  a  dança.  Sei  que  você  transmitiu  a  Jory  a  sua    extraordinária  perícia  e  capacidade.  Foi  uma soberba  professora. Vejo  em  Jory    muito  de  você.    Também  vejo  nele  muito  de seu  irmão  Chris.  A  paciência, o alegre otimismo, a  energia e dedicação de Jory são oriundas da sua família, não de Julian. Mas ele também  possui  algo  de  Julian.  Jory  se  parece  fisicamente  com  meu  filho.  Tem  o  fogo,  o    ardor  de  meu  filho e  também  seus  desejos  carnais  em  relação  às  mulheres.    Contudo,    se  eu  tiver  que  magoar  você  para  salvar Jory,  é  o  que  farei.  Não  pouparei  seu    irmão,  nem  seu  filho  mais  moço,  também.  Se  você  não  me  entregar Jory,  farei  tudo    que    estiver  ao  meu  alcance  para  destruir  seu  lar.  A  lei  me  dará  a  custódia  de  Jory  e  você nada    poderá  fazer  para  deter-me  depois  que  eu  apresentar  os  fatos  às  autoridades    competentes.    E  se  você me  obrigar  a  proceder  dessa  maneira,  que  não  é  a  que  eu  preferiria,    levarei  Jory  para  o  Leste  e  ele  nunca mais  voltará  a  vê-la.Mamãe  se  pôs  de  pé,  mais  alta  que  minha  avó.  Eu  nunca  a  vira  parecer  tão    alta, orgulhosa  e  forte.  -  Vamos,  faça  o  que  quiser.  Não  cederei  um  milímetro,  nem  permitirei  que    roube  de  mim o  que  me  pertence.  Jamais  abrirei  mão  de  um  filho  meu.  Jory  é  meu.  Dei-o  à  luz  após  dezoito  horas  de trabalho  de    parto.  Se  tiver  que  enfrentar  o  mundo  inteiro  e  sua  condenação,  manter-me-ei  de  cabeça  erguida e me agarrarei  a meus  filhos. Não    existe  força neste mundo  -  nem  a senhora, nem  a lei, nem  coisa  nenhuma  - que  possa  obrigar-me  a  abrir  mão  de  meus  filhos.    Virando-se  para  sair,  Madame  M.  correu  o  olhar  pelo quarto, demorando-se    mais a  contemplar  a grossa  pilha de  papéis sobre  a  mesinha  de trabalho  de Mamãe. -  Você  verá  as  coisas  a  meu  modo  -  declarou,  ronronando  maciamente  como  uma    gata.  -  Tenho  pena  de você, Catherine, e de seu irmão. Também tenho pena de Bart, por mais selvagem que seja aquele monstrinho.  Tenho  pena  de  todos  os  que  vivem  nesta  casa,  pois  todos  serão  feridos.  Mas  não  permitirei  que minha  compaixão  por  você,  nem    minha  compreensão  do  que  fez  de  você  aquilo  que  é,  detenha  minha  mão. Jory  estará  seguro  comigo,  usando  o meu nome e  não o  seu. -  SAIA  DAQUI!  -  gritou Mamãe,  completamente  descontrolada,  pegando  uma jarra    de flores  e  atirando-a  na cabeça de  Madame M.!  -  VOCÊ ESTRAGOU  A  VIDA  DE SEU    FILHO    E AGORA  QUER  ARRUINAR  A DE  JORY!  QUER  FAZÊ-LO  ACREDITAR  QUE  SÓ  EXISTE  VIDA  NO    balé,  NA  DANÇA,  EM DANÇAR... MAS  EU  CONTINUO  VIVA!  FUI  BAILARINA, MAS  CONTINUO  A  SOBREVIVER! Madame  M.  tornou  a  correr  os  olhos  pelo  quarto,  como  se  ela,  também,    desejasse  jogar  algum  objeto  contra minha mãe. Então, abaixou-se  vagarosamente    para pegar    a  jarra quebrada a  seus  pés. -  Fui eu quem  lhe deu  isto.  Que ironia você  atirá-la contra mim. Algo  duro  e  quebradiço  deu  a  impressão  de  partir-se  quando  ela  olhou  com  ar    suave  para  Mamãe  e  disse com  rara humildade: -  Quando  Julian  era  menino,  tentei  fazer  por  ele  o  que  era  melhor,  assim    como  você  tenta  fazer  o  que  é melhor  para os  seus... e se meu  julgamento foi  errôneo, também  foi  feito com  a melhor  das intenções. -  Tudo  não  é  feito  assim?  -  replicou  Mamãe  com  amargura.  -  As  intenções  são    sempre  tão  certas,  tão razoáveis...  e,  no  final,  até  mesmo  as  desculpas  flutuam    nas    ondas  de  indignação,  como  a  famosa  palha  que todos  tentam  agarrar  para não se    afogarem. Parece  que  passei  a  vida  inteira  agarrando-me  a  pedaços  de  palha  que  não    existem.  Todas  as  noites,  antes  de deitar-me  com  meu  irmão,  digo  a  mim  mesma  que    esse  é    o  motivo  pelo  qual  nasci,  e  para  cada  erro  que cometi  consolei-me  dizendo  que    equilibrei  a  balança  com  decisões  corretas.  Finalmente,  dei  a  meu  irmão  a única    pessoa    que  ele  é  capaz  de  amar,  a  esposa  que  ele  necessitava  tão  desesperadamente.  Eu  o    fiz  feliz  -  e se  isso  é  errado  aos  olhos  da  senhora,  aos  olhos  do  mundo  inteiro,    pouco  me  importa.  Pouco  me  importa  o que o mundo pensa! Minha  avó  permaneceu  de  pé  no  mesmo  lugar,  com  emoções  conflitantes    torturando-lhe  o  rosto envelhecido.  Pude  perceber  que  ela,  também,  estava  sofrendo.  Observei-lhe  a  mão  magra  e  cheia  de  veias grossas    pronta  para  acariciar  os  cabelos  de  Mamãe.  Contudo,  ela  recuou,  mantendo  o  rosto  inexpressivo  e  a Voz  controlada: -  Repito,  Catherine,  que  sinto  pena  de  você.  Tenho  pena  de  todos  vocês,  mas,    acima  de  tudo,  tenho  pena  de Jory, pois  ele é  quem  tem  mais  a perder. Recuei  depressa  e  me  escondi  quando  ela  saiu  violentamente  do  quarto  de    Mamãe  e  percorreu  o  corredor  a passadas  enérgicas,  passando por  Bart, que  a    ameaçou com    o canivete  aberto. -  Bruxa,  velha  bruxa  negra!  -  rosnou  ele,  franzindo  o  lábio  superior  numa    careta  medonha.  -  Espero  que nunca  mais  volte  aqui,  nunca,  nunca!  Eu  me  sentia  bastante  infeliz  para  desejar  encontrar  um  buraco  no  qual me      enfiar  para  morrer.  Minha  mãe  vivia  com  o  irmão.  A  mulher  que  eu  amara  e    respeitara    durante  toda  a minha  vida  era  pior  do  que  qualquer  mãe  de  quem  eu  já  ouvira    falar.  Nenhum  de  meus  amigos  me acreditaria;  todavia,  quando  se  convencessem  de    que  era  verdade, eu seria  tão envergonhado  e ridicularizado que nunca  mais me atreveria    a encará-los. Então, levei  um  choque. Papai  era meu tio. Não  só  de  Bart,  mas  meu  também.  Oh,  Deus,  que  faria  eu,  agora?  Para  onde  fugiria    ?  Não  se  tratava  de  um relacionamento platônico entre irmãos, de um casamento simulado para salvar aparências, mas de incesto. Eles  eram  amantes. Eu  sabia!  Eu vira! De  repente,  tudo  se tornou por  demais  sórdido,  sujo, chocante.  Por  que    tinham  permitido  que aquele  amor  se iniciasse? Por  que não tinham  evitado?
Tive  ímpetos  de  levantar-me  e  ir  perguntar,  mas  não  suportava  a  idéia  de    encarar  Mamãe  -  nem  Papai, quando  este  voltasse  para  casa.  No  meu  quarto,    atirei-me    na  cama,  a  porta  trancada  fazendo-me  sentir  um pouco  mais  seguro.  Quando  me    chamaram  para  jantar,  gritei  que  não  tinha  fome.  Eu,  que  estava  sempre faminto.    Mamãe    veio à porta  trancada e  implorou: -  Jory, você  escutou alguma coisa  do  que  sua  avó me disse? -  Não,  Mamãe  -  respondi,  rígido.  -  Acho  que  estou  começando  a  ficar  gripado.    Só  isso.  Amanhã  estarei ótimo. Ótimo. Eu precisava dar  alguma desculpa para minha  rouquidão. Em  algum  lugar  de  todas  as  lágrimas  que  derramei,  perdi  o  menino  que  eu  fora    naquela  manhã.  Agora, precisava  tornar-me adulto. Sentia-me  velho,  frio,  como  se  nada  mais  me  importasse.  Pela  primeira  vez,    compreendi  por  que  Bart  estava tão confuso e  se  comportava de modo esquisito  -    ele  também    devia saber. Esgueirei-me  para  observar  Mamãe  escrevendo  em  seu  diário  com  fina  capa  de    couro  azul.  Na  primeira oportunidade,  entrei  no  quarto  às  escondidas,  a  fim  de    ler    o  que  ela  escrevera,  por  mais  desonesto  que  fosse tal  procedimento. Eu estava    ficando  exatamente como  Bart.  Mas  precisava saber. "Madame  Marisha  veio  visitar-me  hoje,  trazendo  consigo  todos  os  pesadelos    que  me  perturbam constantemente  a  vida,  durante  o  dia.  Tenho  outro  tipo  de    pesadelos    para  as  horas  de  sono.  Quando  ela  se foi,  senti  o  pânico  pulsar  tão  alto  que  meu    coração  parecia  um  tambor  selvagem  batendo  o  ritmo  da  última batalha.  Desejei    fugir    e  me  esconder,  como  costumávamos  fazer  quando  vivíamos  trancados  em  Foxworth Hall.  Quando  Chris  chegou  em  casa,  corri  e  me  agarrei  a  ele,  desesperada,    incapaz  de    lhe  dizer  qualquer coisa. Ele não  notou meu desespero.  Estava cansado depois  de    um  dia  longo e exaustivo.” "Então,  beijou-me  e  saiu  para  a  ronda  noturna.  Fiquei  sozinha  em  meu    quarto,  ambos  os  meus  filhos silenciosos e  trancados nos  seus.  Já  saberão que    nosso  mundo    terminará  em  breve?” "Deveria  eu  permitir  que  Madame  M.  levasse  Jory  e  o  mantivesse  a  salvo  do    escândalo  e  da  humilhação? Fui egoísta  ao apegar-me a  ele?  E Bart? E quanto a    Bart? E o que será  de Cindy  se  nosso segredo for  revelado?” "De  repente,  senti-me  de  volta  em  Charlottesville,  com  Chris  e  Carrie,    novamente  a  caminho  de  Sarasota. Minha  memória  parecia  um  filme,  quando  aquela    enorme    mulher  negra lutou  para  embarcar  no  lento  ônibus com  todas  as  suas  sacolas  e    trouxas.  Henrietta  Beech.  Querida,  amada  Henny.  Faz  tanto  tempo  que  eu  não me    lembrava    dela.  Só  de  recordar  seu  largo  sorriso  animado,  seus  olhos  bondosos,  suas  mãos    carinhosas, sinto-me  invadida  por  uma  certa  paz,  como  se  ela  me  estivesse    levando    outra  vez  para  Paul,  que  nos salvaria  todos.”"Mas  quem  nos salvará  agora?” Eu  tinha  lágrimas  nos  olhos  ao  guardar  novamente  o  diário.  Fui  ao  quarto  de    Bart  e  encontrei  meu  irmão sentado no  chão,  no escuro  encurvado  como um  velho. -  Vá para a  cama, Bart  -  ordenei. Mas  ele  nem  se  moveu, parecendo  nem  me escutar.

OS ESPINHOS DO MAU ( Concluído) Onde histórias criam vida. Descubra agora