Antes da decisão - Cap:4

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Acordando as seis da manhã aos gritos de meu pai, me levanto colocando um moletom cinza com tênis, desço as escadas e vou para a sala de jantar tomar o café da manhã.

—Você não vai mais morar com sua tia Mara, ela morreu essa madrugada, cometeu suicídio.

—Como ela se matou? —Pergunto surpresa.

Tia Mara sempre foi alegre com as pessoas, se divertia, contava piadas. Ela só tratava bem os outros, comigo era só gritos, xingos, não sei por que ela era assim comigo... Eu não gosto dela, mas consegui sentir como ela estava. Desesperada, sozinha em uma casa velha deixada pelos meus avós — Parte de mãe —, nunca se casou e viveu sua vida nos bares, baladas e com homens que ao menos conhecia. Sinto uma inveja dela ter conseguido ir embora desse mundo, pelo menos ela está feliz, queria eu estar no seu lugar.

—Se matou com uma corda em seu pescoço, uma morte horrível... —Diz Márcia indignada —Eu não entendo, ela era tão alegre, por que fez uma coisa dessas?

—Essa atualidade esta cada vez pior, não aguentam nada que acontece em suas vidas e já querem se auto-mutilar ou se matar, precisam apanhar para aprender a ser gente de verdade, tudo isso para chamar atenção. —Diz Wagner olhando para mim.

—Oi?? Você acha que a morte é um ato de chamar atenção?? — Falo indignada parando imediatamente de comer.

—E o que você pode falar? Você é outra nesse mundo de jovens depressivos que só querem chamar atenção, a Mara foi só mais uma vítima fraca que não aguentou a vida de verdade, merecia ter apanhado mais em sua infância, assim aprenderia a ser mulher e gente.

—A morte nunca será para chamar atenção e sabe por que você não entende? Porque você nunca passou por ela, nunca teve depressão, por isso é um homem sem sentimento e ríspido. —Digo rangendo os dentes.

—Tenha mais cuidado quando fala comigo Kartnay, não me venha com sermão, porque você é outra fraca, inútil em meio a essa atualidade. Você morrendo ou não, não me faria falta. —Diz Wagner voltando a comer.

—Entao por que não acaba com o meu sofrimento de uma vez?

Deixo a mesa e subo para o meu quarto, troco de roupa colocando uma calça jeans preta junto de uma uma blusa regata branca, com um top rosa por baixo e um tênis, pego um caderno qualquer meu — para desenhar — e saio de casa as pressas, chorando.

•••••••


As vezes penso que a vida é um lixo, o sangue em minhas veias é feito de erros, nasci para os outros me rebaixarem, estou em pedaços, quebrada, sou aquela que vai embora no final para que tudo fique bem. Muitas vezes penso: a morte será a unica salvação, mas uma unica coisa me deixa em pé e me faz seguir em frente, minha mãe que me entendia, era a melhor, mas o mundo à tirou de mim. Todos levamos vidas difíceis, umas piores que as outras. De uma coisa eu sei, todos tem seus demônios, acordados ou sonhando.

O tempo rouba as coisas preciosas de cada pessoa, familia, amigos. Tudo um dia lhe deixa e o que acontece com você? Fica sozinho mais uma vez na escuridão e se sustenta da auto-mutilação para tentar aliviar um pouco a dor e esse pouco vai virando um vício. Uma coisa sem volta. O tempo aos pouco vos envenena, tirando cada pessoa aos poucos de sua vida, de sua história, de sua mente.

Muitas pessoas tem medo de cachorro, escuro...eu tenho medo da minha mente, cada minuto que estou aqui viva nesta terra é um minuto de pensamentos depressivo e agoniante que me prende aos meus demônios, que me consome pouco a pouco — a cada dia, a cada hora, a cada segundo —E ele vai me matando aos poucos até não sobrar mais nada de mim e eu morrer por completo.

Estou sentada no topo do meu edifício uma altura de 300 metros acima do chão, morte na certa? Quem sabe descobrirei algum dia, estou bem na beirada, podia acabar com a minha vida naquela hora, naquele momento. Subo na borda do edifício, fico em pé e sinto a brisa levando meus cabelos ao ar, aquilo era bom. Minhas memórias de quando minha mãe era viva passam como um flashback na minha cabeça. Tempo bom...

Olho para baixo e vejo pessoas andando — parecem formigas atrás de seus objetivos —, carros passando e um asfalto à minha espera, estou a espera da minha coragem para pular e ser feliz eternamente — Apenas um passo para ir embora desse sofrimento... — Tento dar meu último passo, mas sou interrompida por um garoto que me puxa para dentro do prédio, me jogando no chão junto à ele. Assim falhando mais uma vez de ter felicidade e de ter minha paz enfim.

Porque nem para me matar eu consigo?

O Grito Silencioso (Livro I)Onde histórias criam vida. Descubra agora