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Estava rodeada de pessoas, continuava deitada no chão em posição fetal a chorar. Sinto alguém a tocar no meu ombro e ajudar-me a levantar. Era um bombeiro. Ele levou-me para a ambulância, estava a entrar na ambulância quando vejo que os meus pais estavam a ser retirados do carro e a serem levados para duas ambulâncias, com um pano a tapar-lhes o corpo. Vi o braço da minha mãe, inerte, suspenso e só me lembro de ver tudo a escurecer...

Acordei ofegante e a soar, tinha voltado a sonhar com aquele dia. Levantei-me e fui lavar o meu rosto. Olhei-me ao espelho e estava com os olhos vermelhos, chorei durante o sonho. Parece que as minhas lágrimas querem sair mesmo quando não estou consciente do que estou a fazer.

Tomei um banho e vesti-me. Preparei o meu pequeno almoço e fui tomá-lo para o meu terraço. Não me canso de olhar para esta vista, foi um dos motivos da compra do apartamento.

Flashback on

Finalmente tinha as chaves do apartamento. O meu pai comprou-o ontem e hoje já estamos a fazer as mudanças. Abri a porta do apartamento e fui a correr até ao terraço que tinha vista para a foz. A união do rio com o mar é lindíssima. Senti dois corpos, um de cada lado do meu corpo e abraçaram-me. Sabia que eram os meus pais e abracei-os de volta.

- A vista é deslumbrante! - comentou o meu pai.

- Quando quiseres pensar este é um lugar bom, tal como a praia. Aproveita que tens estes dois lugares mesmo ao pé de ti Aurora!

- A tua mãe tem razão, e quando te sentires sozinha olha para as estrelas, seremos nós a olhar por ti, podemos não estar no mesmo lugar, mas estamos sobre o mesmo céu, por isso nunca estarás sozinha!

- Obrigada! Eu amo-vos muito! - Eles beijaram as minhas bochechas e fomos buscar as caixas para começar as mudanças.

Flashback off

A minha mãe tem razão, é um bom local para pensar.

Acabo de tomar o pequeno almoço e vou para dentro. Arrumo a louça que sujei e pego na bolsa e nas chaves do carro. Estava a precisar de fazer umas compras para a casa e foi o que fui fazer. Aproveitei e comprei umas coisinhas que estava a precisar. Quando olhei para o relógio já eram 13:14, tinha que estar na faculdade as 16. Fui para casa. Quando cheguei coloquei música e comecei a guardar as compras. Quando fui fazer o almoço, optei por uma salada, não estava com grande fome.

Estava a arrumar a cozinha quando tocam à campainha. Olhei para o relógio que tinha na cozinha e faltavam poucos minutos para as 3 da tarde. Não estava à espera de ninguém nem encomendei nada.... Limpei as mãos num pano e fui abrir a porta.

- Boa tarde! - diz um Afonso muito sorridente e entra pela casa a dentro.

- Boa tarde! Podes entrar, fica à vontade! - disse-lhe irónica.

- Desculpa entrar assim...

- Não tem problema!

Ele chegou à minha beira deu-me um abraço apertado e beijou a minha bochecha.

- Estás ocupada?

- Estou a acabar de arrumar a cozinha, daqui a pouco tenho que ir para a faculdade...

- Eu ajudo-te, assim arrumas mais depressa.

- Passasse alguma coisa?

- Não, porquê?

- Estás estranho, eu não te conheço ainda muito bem, mas o suficiente para saber que estás estranho.

Fomos para a cozinha e continuamos a arrumá-la.

- É que hoje é um dia muito especial para ti e estou feliz por teres conseguido o que tanto querias - respondeu-me enquanto limpava com um pano a loiça que eu lavava. - Por isso vim aqui para te levar à faculdade neste dia especial - concluiu após ter limpo a última coisa.

- Obrigada, a sério, tu não sabes o quanto esse gesto significa para mim. Mas não precisavas, ainda por cima tens que fazer um desvio...

- Mas eu quero estar lá contigo! Por isso sem mais discussões, vais comigo!

- Está bem, eu vou.

- Eu depois vou buscar-te.

- Eu posso vir de transportes públicos!

- Nada disso, eu levo-te eu trago-te.

- És tão chato!

- Não digas asneiras! Já estás pronta?

- Vou só lavar os dentes e podemos ir.

Fui à casa de banho, lavei os dentes e escovei o meu cabelo. Não cheguei maquilhagem, eu uso, mas sinto-me bem sem ela. Cheguei perfume e fui ter com o Afonso à sala e peguei na minha bolsa que estava sobre o sofá.

- Pronta!

- Então vamos!

Fomos para o carro dele e seguimos em direção à faculdade.

- Estou ansiosa...

- Porquê?

- Vou começar a estudar o que realmente gosto...

- E...

- E o quê?

- E mais! Eu sei que não me estás a contar tudo!

- É também a primeira vez que vou iniciar uma nova fase académica sem ter os meus pais comigo...

- Eih! Não gosto de te ver chorar! - falou quando as lágrimas começaram a cair, como tínhamos parado num semáforo ele olhou para mim e limpou as minhas lágrimas com as suas mãos - Posso não ser os teus pais, mas tens-me a mim e eu vou estar sempre aqui para te apoiar nesta tua nova vida.

Dei um pequeno sorriso, como ele ainda tinha as mãos no meu rosto, peguei numa e beijei-a.

- Obrigada! Por tudo!

Ele virou-se para a frente porque o sinal ficou verde e pegou na minha mão e levou-a até os seus lábios, passou ao de leve os mesmos pela minha mão e deu-lhe um beijo - Não tens que agradecer! Somos amigos e eu vou estar sempre aqui para te apoiar, ajudar, fazer rir e para qualquer coisa que precisares. - Ele pousou a sua mão com a minha junto na sua perna. Continuamos o caminho num silêncio confortável, apenas com o rádio como som de fundo.

- Chegamos! Estás bem?

- Isto já passa - respondi, respirei fundo e peguei na minha bolsa e abri a porta.

O Afonso saiu e veio ter comigo. Olhei para ele e sorri. Abracei-o - Obrigada! - ele deu um beijo na minha testa. Afastei-me dele e fui em direção ao edifício. Como hábito antes de entrar pelo portão olhei para trás numa tentativa de encontrar lá os meus pais, como sempre o fazia nestes últimos anos, mas eles não estavam lá, os meus olhos inundaram-se de lágrimas, o Afonso acenou para mim, fez um gesto com as mãos de que tudo ia correr bem e atirou-me um beijo. Sorri-lhe e acenei-lhe com a mão e entrei pelos portões. Limpei as minhas lágrimas enquanto me dirigia para a entrada e finalmente iniciei um novo capítulo na minha vida!

Lótus  (Afonso Silva)Onde histórias criam vida. Descubra agora