Durante o jantar falámos calmamente, sem conversas muito relevantes, apenas falar do dia-a-dia, das aulas, mas quando reparei que não queria mesmo falar sobre essas coisas com ele ali, saí da mesa e levantei os pratos, também para impedir o Harry de repetir novamente.
"Estava mesmo bom, acho que vais ter que me convidar mais vezes"- fiz um leve sorriso a mim própria ao ouvir as palavras dele. A minha resposta deveria ser "Claro, com todo o gosto!", mas mantive-me em silêncio.
"Queres sobremesa?"- perguntei após algum tempo, depois de ter pousado os pratos na banca. Abri o frigorifico e a única coisa que tinha era morangos mas sabia que também tinha gelado no congelador, não muito. "Só tenho morangos e gelado de baunilha, se quiseres"- avisei-o.
"Se comeres eu como, por mim tudo bem"- fui tirando bolas de gelado e pondo numa taça grande de vidro, em seguida coloquei morangos por cima e decidi pôr também um bocado de caramelo para misturar com o sabor do gelado de baunilha. Coloquei duas colheres na taça, uma de cada lado, e pousei a taça na mesa.
"Concordo, também não gosto de ser a única a comer"- disse-lhe, sentando-me novamente na cadeira e Harry faz uma cara de espanto olhando para a taça.
Enquanto o olhava pensei novamente que ainda não sabia o que havia por detrás daquela pessoa, que agora me parece outra completamente diferente e não é só fisicamente, é a maneira como ele fala agora, como me trata.
"Fala-me de ti Harry"- a minha curiosidade conseguia sempre vercer-me, e por mais que eu tente não pensar nesse assunto, eu não o conheço totalmente, não sei quem é. Ele olhou para mim e engoliu o gelado, de seguida tinha uma expressão de incerteza na cara.
"Como assim falo-te de mim?"- parecia-me zangado, ou magoado e uma sensação de culpa passou pela minha mente, mas eu não ia desistir agora.
"A tua vida, o teu passado"- a face dele tornou-se um pouco esbranquiçada e começei a ficar um pouco assustada, não queria este jantar a acabar mal.
"Sempre ouvi dizer que o que conta é o presente e não o que aconteceu no passado"- quando o ouvi arrastar a cadeira para trás e levantar-se, dirigi-me a ele rapidamente e pousei-lhe as mãos no peito cuidadosamente. Ele baixou a cabeça e deixou escapar uma grande baforada de ar, e depois de alguns minutos acalmou-se.
"Desculpa"- disse ainda junto a ele, levantando-lhe a cara para cima com a ponta dos meus dedos, mas ele virou a cara de lado.
"Não és tu que tens que pedir desculpa, percebes? O problema é meu!"- começei a sentir-me realmente mal por lhe ter feito aquela pergunta e conduzi-o até à sala dizendo que ele se senta-se no sofá.
"Não tens problema nenhum e vais-te acalmar porque não vais sair daqui nesse estado"- sentei-me também ao lado dele no sofá observando as suas atitudes, o seu estado de nervos. "Ouviste-me Harry?"- pus a, minha mão na perna dele e dei uma leve batida, só queria que ele esquece-se o que eu disse e que voltásse ao normal.
Passados uns longos minutos a voz baixa dele soou na sala.
"Eu falo-te de mim"- levantou a cabeça que estava apoiada nas duas mãos e puxou o cabelo para trás como fazia sempre.
"Não precisas, eu disse aquil.."
"Eu quero"-afirmou, não me deixando acabar de falar, e eu assenti com a cabeça. "O que queres saber?"- disse olhando-me vagamente.
"Fala da tua infância"- disse-lhe baixo não sabendo bem o que perguntar, também com algum medo que ele voltasse a entrar no estado que estava à minutos atrás.
"Não tive" respondeu apenas, acabando por não me dar uma resposta concreta. Queria mais que tudo pedir-lhe que me explicasse exatamente o que quis dizer mas uma parte de mim não queria mexer mais com ele.
"Ahn?"- disse pondo-lhe a mão na face para que olhásse para mim. "Toda a gente teve uma infância, boa ou má, não deixou de ser infância"- desviou o olhar novamente e logo de seguida voltou-se outra vez.
"Tu não percebes. Não percebes o que é não ter ninguém"- até agora ele sempre me pareceu uma pessoa rigida, até por vezes assustadora mas, pelo contrário, agora estava frágil.
"Então e a tua família?"- perguntei-lhe. Quando ele aqui chegou foi tão fácil falarmos, sem paragens, e agora parece que quase lhe tenho de arrancar as palavras, já não está animado e talvez já esteja farto de eu lhe estar sempre a fazer interrogatórios e por isso nunca mais quererá voltar a ver-me e muito menos falar comigo.
"A minha família?"- disse comprimindo os maxilares. "Foi-se"- afirmou com alguma indiferença levantando a sobrancelha.
"Desculpa, só queria saber"- disse um pouco a medo, não sabendo bem qual iria ser a reação dele.
"Eu sei perfeitamente que queres saber! Não sou burro caramba! Andas sempre a fazer perguntas! Se queres saber, pergunta tudo agora ou nunca mais perguntes!" - ele gritou.
De certa forma o medo surgiu em mim de um momento para o outro, não só porque não gosto que gritem comigo, nunca gostei, mas também não gosto quando Harry se descontrola, e as duas coisas juntas ainda se tornam piores. Eu sabia que ele estava a fazer aquilo porque sempre foi assim que ele aprendeu a reagir ao longo dos anos, é apenas uma forma de defesa, mas mesmo tentando abstrair-me encolhi-me mesmo sem dar conta. "Desculpa! Eu não queria gritar contigo, não tens culpa disto" - ele disse e eu apenas assenti com a cabeça, não confiando na minha voz agora.
"Eu não sou uma pessoa aberta para falar de passados e essas coisas, não consigo falar como tu falas-te comigo, eu simplesmente não sei se consigo!"- respirou fundo e eu resolvi encorajá-lo.
"Fala, deita a raiva cá para fora, eu vou estar aqui"- não tinha a certeza se resultaria mas passados alguns minutos ele começou a falar calmamente.
"Não, não tenho família. Disseram-me que os meus pais morreram mas eu sinceramente não acredito nessa merda. Vivi no orfanato até à dois anos atrás, algumas famílias tentaram adotar-me mas em média dois dias depois devolviam-me novamente, dizendo que não era a criança que procuravam acolher. Nunca tive visitas, detestava todos os rapazes que viviam comigo, enquanto ainda era pequeno batiam-me e tiravam-me a comida a quase todas as refeições. Quando comecei a crescer e a saber defender-me partia-lhes a cara ao mínimo que tentassem fazer contra mim, comecei a reparar coisas pela cidade aos 15 anos, pricipalmente carros, fui poupando muito dinheiro e ao fim de três anos, quando finalmente saí do orfanato, consegui comprar a minha casa e uns meses depois tive direito a uma bolsa para a universidade, porque fora o meu comportamento as minhas notas sempre foram as mais altas de todos os outros rapazes. No meu primeiro ano de caloiro as notas foram descendo, e comecei a aperceber-me do impacto que eu tinha no sexo feminino. Envolvi-me com muitas pessoas e a fama espalhou-se. Hoje, não me dou com ninguém, já pensei várias vezes em deixar a universidade, sou totalmente independente e não me arrependo do meu passado. E sim, isto é tudo o que sei sobre mim"
Escutei-o tão cuidadosamente, como se imaginá-se tudo o que ele estava a dizer, tudo o que ele sofreu. Sofrimento. Raiva. Ódio. Era tudo o que ele lembrava da vida dele. Agora consigo perceber a frieza e a pessoa maravilhosa que está no interior de uma que parece tão horrível. Naquele momento sentia-me feliz, contou-me e esforçou-se para isso, agora encarava-o de outra forma, já não tinha medo.
"Admiro-te pela pessoa que és"
(Desculpem imenso a demora! Nas férias do verão recompensamos! Gostaram do capítulo? Opiniões e ideias nos comentários (: 200 votos para o próximo go go go! Obg a todos os leitores!!)
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New Life
Fanfiction"Cada vida é uma história. Algumas têm finais felizes, outras não são tão boas como gostávamos que fossem" Para Harry e Catty não existe um conto de fadas, mas sim uma verdadeira história de amor. Copyright © 2013 Fanfictionone Todos os direitos r...