Eu poderia começar essa carta de infinitas maneiras.
Poderia começar com uma dedicação, uma frase bonita, com um vocativo antecedido de um “querido” ou “caro”... Mas escolhi uma confissão idiota que não tem a mínima relevância. Nem esse parágrafo.
OK, agora eu prometo que iniciarei o que tanto me sufoca neste exato momento! E me desculpe se outra confissão surgir na próxima linha… Só quero que entenda que ela não é idiota, não dessa vez.
Você não é a causa da minha morte. Você foi a causa da minha vida. E eu agradeço muito por isso. E peço desculpas por ir assim, sem avisar pessoalmente…
Em relação ao meu fim… Bem, eu já sabia há algum tempo que ele não teria mais como ser adiado. Há meses um peso mórbido vem pesando sobre meus ombros. E, agora, acho que ele deu um jeito de esmagar toda a força que nunca tive.
Eu estou cansada, amor…
Estou cansada de sofrer calada por algo que às vezes nem sei. Estou cansada de me sentir vazia, de me sentir um peso para as pessoas. Estou cansada da minha vida medíocre e da minha existência idiota. Estou cansada de mim!
Dói tanto falar isso pra você, mas me sinto tão mais aliviada de dividir com mais alguém o que tanto me afogava, e que me fez escolher o fim ao invés de continuar o meio.
As pessoas são más… Elas falam coisas que ferem, mas o pior é quando elas não dizem absolutamente nada com você. Confuso? Bem, deixe-me explicar: quando as pessoas nos ferem com palavras, machuca muito. Mas machuca mais ainda quando elas nos ferem com olhares ou até atitudes…
Ignorar ou fingir que não vê alguém é cruel. E eu sei disso como ninguém. Mas não sou santa (ou já fui santa, ainda estou confusa para referir a mim mesma) e sei que já fiz isso, ignorei pessoas. Umas por não ter nenhuma relação afetiva ou nenhum grau de amizade e outras por não ter coragem de falar o que ninguém tinha coragem de dizer ou vergonha. Mas eu não queria fazer isso, acontecia. Do mesmo jeito que acontecia de eu me trancar no banheiro por horas e ligar o chuveiro para disfarçar os gritos abafados em minha garganta enquanto as lágrimas caíam como chuva pelo meu rosto. Eu não conseguia evitar chorar, era o único jeito de me sentir menos pior. Mas parece que elas não foram suficientes, ainda me sinto mal. Tão mal que escolhi ir…
Eu estou chorando. Acho que nem de medo, mas de saudade. Estou chorando por não ser forte o suficiente para ficar aqui. Eu sei que você cuidaria de mim assim como eu de você. Eu sei que eu seria ajudada, que não estaria só…
Mas eu não consigo. Não consigo não ser egoísta nesse momento.
Eu preciso ir…
Preciso ir enquanto não desisto e fico aí com você.
Preciso ir pra algum lugar que eu não me sinta um fardo pra ninguém.
Preciso ir pra algum lugar em que eu tenha algum sentido, pois aqui não é.
Preciso ir…
Preciso ir, mesmo que isso signifique o nosso fim. E o meu também.
Preciso ficar em paz.
Mas eu sei que, de um jeito ou de outro… Eu ainda vou precisar de você. Lá no fundo eu queria ficar, mas não dá. Talvez nossa relação seja mais bonita se eu ficar longe… Se eu for embora.
Desculpa se você não é a paz que eu necessito, tá?
A paz que procuro não combina nada contigo. Ela é morta demais para toda a vida que você é.
Eu te amo, e espero que você também me ame para entender e me deixar ir.

VOCÊ ESTÁ LENDO
Cativo |✔
Poesia[POESIAS] [L] __________________ Contos independentes que apenas querem mostrar-se para o mundo. E pensamentos que apenas querem ser desabafados. E alguém que apenas quer ser livre, mas ainda é um cativo do próprio mundo...