Capítulo 3- Cauã

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Eu conheci uma menina muito diferente, bom, ela é bem diferente mesmo. Nunca tinha conhecido uma menina que não tivesse amigos, na verdade, ela tem um, o seu caderno inseparável. Quando eu entrei no ônibus, não vi ninguém com o mesmo uniforme que o meu, o que me causou estranheza, mas até aí tudo bem. Me desloquei até o fim do ônibus, até que vi uma menina com um moletom preto por cima de uma camisa que aparentava ser do mesmo uniforme que o meu. Como não tinha certeza, decidi não conversar nem puxar assunto, pois ela parecia concentrada na música que estava escutando e em um caderno que estava escrevendo.
Fiquei a observando de canto de olho, ela estava com o pé direito apoiado no banco da frente, dando suporte ao caderno. Sua cabeça balançava no que parecia ser o ritmo da música.
Quando fui mudar de banco, por conta da chuva que estava entrando no ônibus pela janela emperrada, o motorista passa muito depressa por um buraco. O que me fez cair sobre ela e derrubar seu caderno. Vi que o semblante calmo tomou um ar irritado. Me desculpei, ela pareceu furiosa. Peguei seu caderno no chão do ônibus e novamente me desculpei, falando que não havia sido minha intenção. Ela se desculpou por ter sido grossa comigo.

A conversa fluiu, e eu só reparava em seus traços, e na delicadeza e cuidado com um simples caderno. Com a conversa, acabamos passando da parada da escola, quando paramos tivemos de ir andando. No caminho ela se apresentou e eu também.
- Bom, você nem se apresentou. Vou começar então. Me chamo Vivian, tenho 15 anos e só.
- Eu sou o Richard Cauã, mas as pessoas me chamam mais de Cauã. Sou debutante também. -Rimos disso.
Eu pude ver aqueles lábios tão desenhados se abrirem em uma curvatura linda, ela sorriu. Não sei porque, mas aquele sorriso me deu um prazer que eu até então desconhecia.
Caminhamos o mais rápido possível para chegar a tempo na escola, atrasamos 7 minutos, o que foi tolerado, porque parece que Vivian é um pouco querida pela inspetora que só pediu para que ela não chegasse tarde novamente. Vivian estava apressada, nem sequer se despediu e foi em direção a sua sala.

Bom, eu era novo na escola, e acho que ela nem notou. Deve ser pelo fato de não ter tantos amigos, então desconhece a maioria dos alunos. Voltei ao portão da escola, onde estava a inspetora, a mesma já estava fechando o portão. Perguntei a ela:
- Com licença inspetora, é que eu sou o aluno novo. Me falaram que a diretora queria falar comigo hoje, é que é meu primeiro dia aqui. Só que não sei onde é a sala dela, a senhora poderia me informar? -Tentei ser o mais formal possível, sua aparência me dava medo.
- Bom, me acompanhe Sr. Richard.
- Não precisa do Senhor, pode me chamar de Cauã.
- Formalidade e respeito são palavras que regem uma vida escolar jovem.

Nunca senti tanta formalidade em uma pessoa só. Ela não falou mais nada e eu apenas a segui. A escola é bem grande, percebi isso enquanto ia a diretoria. Há uma grande quantidade de plantas, flores, a escola é bem verde e ventilada, acho que isso se deve as árvores. É uma escola linda, tem bancos de madeira por todos os lados, principalmente embaixo das árvores. Me distrai olhando e quando percebi a inspetora estava repetindo meu nome
- Sr Richard! Sr Richard! -Vi que ela aumentava o tom de voz.
- Ah, me desculpe. Estava olhando a escola e acabei me distraindo. O que a senhora disse?
- A sala da diretora é essa. Entre, ela está no seu aguardo. -Fala isso e sai.
- Obrigado. -Abro a porta e me deparo com uma senhora que aparenta ser mais jovem que a maioria dos diretores das escolas. Ela é alta, magra, tem um cabelo preso em um coque formal e está com uma roupa que lhe deixa com um ar autoritário e sério. Entro e me apresento.
- Bom dia diretora, eu sou o aluno novo, Richard Cauã.
- Sim, claro, já estava esperando. Mas não havia pedido para chegar um pouco mais cedo? Ou não avisei?
- Sim avisou, é que acabou ocorrendo um imprevisto no ônibus e me atrasei. Me desculpe.
- Bom, que fique claro que atrasos não são tolerados quando se tornam rotina. Mas depois falamos mais das regras da escola. Por favor, sente-se. -Falou isso também sentando.
- Prosseguindo, você entrará no 2° ano do ensino médio, certo?
- Sim. -Falei concordando com a cabeça.
- Bom, acho que você já viu um pouco da escola, a semana de provas será daqui uma semana, então aviso de antemão que o senhor corra atrás do conteúdo para não se prejudicar. Afinal, já adiei uma semana por conta da sua presença. Bom, a sua sala é o 2° Ano E. - Enquanto fala, ela pega alguém papéis que estão em sua mesa e procura algum específico.
- Bom, aqui está. -Ela me entrega alguns papéis que parecem ser horários e cronogramas. - Esses são os horários de aula da sua turma, o outro horário, o verde, são das aulas no horário oposto. Essas aulas não são obrigatórias, são facultativas e variam de acordo com o interesse individual. Disponibilizamos futebol, vôlei, basquete, handebol, tênis de mesa, xadrez, e para os mais interessados em aperfeiçoar seu intelecto, temos clubes de matérias isoladas. Dentre os papéis que lhe entreguei também tem o calendário anual da escola, com os eventos, dias letivos, e tudo mais. E por último, a tabela que está vazia é para que você organize seu horário de estudos em casa.
- Nossa, acho que vou gostar bastante dessa escola. Obrigado. - Eu estava tão empolgado.
- Bom, agora vamos para sua sala, os seus colegas de sala já estão em aula.
- Agradeço novamente sua atenção diretora.

Saímos da sala e ela me leva em direção a sala. Ao abrir a porta a diretora vai em direção ao professor e logo em seguida pede a atenção de todos.

Avisa sobre a minha chegada e de repente sinto os olhares curiosos em mim, fico com vergonha. Ao passar o olhar por todos, noto um moletom conhecido, era Vivian. Ela estava num canto perto da lousa, sozinha. A diretora pede para que eu me apresente.
- Bom, eu me chamo Richard Cauã. -Quando falei meu nome tive a certeza que era Vivian por baixo daquele moletom, pois ela virou e pude ver seu olhar cruzar com o meu.
- Bom, e eu sou debutante. -Todos riram, inclusive o professor. Mas eu só reparei no sorriso dela.

Então a diretora saiu e senti por uns instantes todo mundo me olhar novamente. Reparei que havia uma cadeira atrás de Vivian, fui em direção a ela quando escutei alguém me chamar do outro lado da sala.
- E aí Richard, senta aqui com a gente cara. - Não queria, mas acabei aceitando.

Pus minha bolsa na mesa e me sentei.
Haviam três meninos em uma rodinha, o que me chamou, Gustavo Benech era o capitão do time de futebol.
-Bom Richard...
-Me chame de Cauã, gosto mais. -Disse interrompendo ele.
- Ok. Esses são meus amigos. Daniel, que é atacante no nosso time. E Eduardo, o goleiro. Mas pode chamar eles de Dan e Edu.

O professor me chama e eu me dirijo a mesa dele.
-Bom Richard, como você chegou hoje, não sabe o conteúdo ainda. E eu não tenho como te explicar agora porque estou corrigindo os exercícios dos alunos. Então... Deixe-me ver quem pode lhe ajudar com isso... Eu acho que... Vivian! Vivian! -Ela olhou e disse
- Senhor?
- Faça um favor aqui.
Ela levantou e veio em direção a mesa. Ela é tão bonita, estava com as mãos nos bolsos do moletom.
- Pois não professor.
- Bom, eu tô muito ocupado corrigindo os exercícios, você poderia ajudar o Richard... - O interrompi assim como fiz com Gustavo.
- Cauã, prefiro Cauã.
- Ok, você poderia ajudar o Cauã com o conteúdo? E explicar pra ele o exercício? - Ela ficou meio desconcertada
- Mas professor, eu não sei tão bem o assunto. -Disse ela passando a mão no cabelo
- Mas você sabe o suficiente pra explicar a ele, e quando eu for corrigir no quadro, qualquer dúvida ele pode tirar. Mas pra isso ele tem que ter noção do conteúdo. Você pode ajudá-lo?
- Ok professor, se o semhor está dizendo.
- Confio em você. Cauã, pegue seu material e sente-se na cadeira atrás de Vivian, ela vai lhe ajudar.
- Tudo bem professor. - Fui até a cadeira onde estava minha bolsa e a peguei. Gustavo questionou:
- Vai aonde?
- Professor pediu pra Vivian me ajudar no conteúdo.
- Boa sorte com a nerdizinha. - Falou Gustavo rindo, e causando o riso de Edu e Dan. Não vi onde estava a graça, por isso só sai.

Dei meia volta e fui em direção a cadeira que estava atrás de Vivian.
- Que coincidência não? - Disse
- Você me pareceu bem feliz com seus amigos. - Não sei o que deu nela.
- Por que você tá falando assim?
- Não, nada. Só põe sua cadeira aqui pra gente acabar logo com isso.

Eu realmente não sei o que aconteceu. Não me lembro de ter dito nada de errado, e lá estava ela falando desse jeito comigo. Ela realmente é diferente, mas um diferente bom, que me faz querer conhecê-la cada vez mais, mesmo me dando essas patadas de vez em quando.



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