17. O fantasma de Seraphi

837 61 1
                                    

Simples e calmamente ergui e afastei os braços do corpo, enquanto as criadas que havia escolhido para mim, sete ao todo, passavam-me pela pele os ramos partidos do harbiscum à guisa de perfume antes de começarem a me vestir, sem que para isso eu movimentasse um dedo. Haviam-me trazido um vestido longo e armado como aqueles que me haviam oferecido no começo, mas muito mais luxuoso, todo recoberto de pequenas pedras e de flores verdes exóticas que, segundo soube, eram naturais e tinham sido mandadas trazer de um outro planeta por Balem, especialmente para mim, e deixei-me ser vestida como uma boneca, sem quase piscar os olhos. Colocaram-me as joias, passando-me depois um pequeno aparelho sobre a cabeça, ao qual vi pelo espelho ter o poder de deixar-me com o rosto colorido - maquiagem, me disseram. Estalei os lábios, em dúvida; não tínhamos isso em Zalar, mas, bem, até que não era mal, apenas ordenei para que trocassem a cor, e passaram-me novamente o aparelho pequeno, eu ficando agora com os lábios e as pálpebras num coral vivo, um cristal aplicado no centro do lábio inferior, e dessa vez agradei-me: Combinava com as flores verdes em meu vestido. Passaram-me um segundo aparelho que penteou-me e prendeu o cabelo de lado, e era estranho usar o cabelo daquela forma, e reclamei.

- Mas senhora. É a forma correta para que possamos fixar o arranjo - disse suavemente uma das androides ao meu lado.

- Deixe-me vê-lo - respondi, um tanto entediada.

Duas criadas retiraram-no de dentro de uma caixa, erguendo-no para mim. Era enorme e parecia pesado, com flores e cristais pendurados, e olhei-o com dúvida, enquanto me assentavam aquilo sobre a cabeça...apenas para que eu visse como era na verdade incrivelmente leve, e olhei-me pronta ao espelho. Inegavelmente eu estava belíssima, mas não consegui sorrir, porque na verdade jamais imaginara que seria dessa forma, nem sob tais circunstâncias, e muito menos para que propósitos. Mas na realidade jamais havia mesmo imaginado, então simplesmente pisquei e afastei tais pensamentos.

- Está na hora, senhora - disse a androide, curvando-se.

Movi-me em direção à porta e abriram-na para que eu passasse. Iam cada uma, três de cada lado, deixando cair ao chão de dentro de bandejas algo como pétalas de flores, uma delas abrindo o caminho à frente, e Greeghan seguindo-me na retaguarda. Voltei-me para olhá-lo, e em silêncio ele meneou a cabeça, com um leve rosnado em seguida, e isso arrancou-me um breve sorriso. Era bom saber que ele estava bem, apesar das cicatrizes que tinha agora em seu rosto e de um dente que lhe faltava de lado após a luta, e que continuava me protegendo, e voltei-me para o caminho.

Enormes portas abriram-se diante de mim, e as criadas estacaram, apenas a primeira delas entrando, para ajudar-me a subir em uma pequena plataforma. Olhei para baixo, onde via um grande abismo, o salão estendendo-se lá embaixo, enorme e repleto de pessoas, todas trajando branco, as roupas mais estranhas que se pudesse imaginar, e voltei-me para a criada, perguntando:

- Cinco, quem são essas pessoas?

- São apenas hologramas, senhora. Requisito para qualquer casamento da realeza. Não se preocupe. A plataforma vai guiá-la até Lorde Balem, que a aguarda lá adiante.

Voltei-me e olhei uma última vez para Greeghan, antes de aprumar-me e sinalizar que estava pronta, e a pequena plataforma começasse a deslizar no espaço, descendo muito aos poucos enquanto ia em frente, e eu, como de costume, pensava. Sim, estava-me casando, mas com um propósito bem claro: Longe de mim qualquer divagação romântica - os tempos e a situação não eram para isso. A moral dizia-me que eu me vendia ao carrasco de meu povo, mas enterrei-a na maior profundidade que consegui encontrar em meu espirito. Ouviria somente o que se pusesse ao meu lado de agora em diante: A lógica ordenava-me pensar racionalmente e procurar pela vantagem; o instinto mandava-me sobreviver, e era o que eu estava fazendo, simplesmente agarrando à vida com as unhas fincadas nela e, bem, não me seria em verdade um sacrifício casar-me com Balem, e isto também o instinto me ditava, porque, se isolasse as circunstâncias do total, e o visse de maneira isolada, eu o desejava. E decidi que essa era a forma de pensar. Era a forma lógica. A moralidade não cabia mais no meu mundo, nesse mundo novo. A moralidade fora colhida com o resto de Zalar.

A Escrava de Lorde Balem  (terminada)Onde histórias criam vida. Descubra agora