Capítulo 3-oito anos- 2

8 0 0
                                    

 Avançando um pouco, temos nosso segundo conto. As ferias de fim de ano passaram rapido e as aulas finalmente voltaram. O primeiro dia foi considerado tranquilo. Como todo inicio de ano, eu me sentei na ultima carteira e fiquei quieto, apenas fazendo a lição que me era proposta. As quatro primeiras aulas foram basicamente professores fazendo perguntas orais que eu respondia no caderno por não ser capaz de levantar a mão. Quando finalmente bateu o sinal para as ultimas duas aulas, um professor novo entrou na sala e se sentou na sua mesa.

-Bom dia alunos.-Ele era bonito, mas estava com uma cara amarrada. Suas sombrancelhas grossas estavam arqueadas, enquanto ele olhava a sala com seus claros olhos ambar. Seus labios grossos estavam contraidos e seus cabelos pretos estavam bagunçados.-Eu sou o professor Martins. Eu vou dar aula de historia para voces no decorrer do ano letivo.-Ele se levantou e começou a escrever no quadro negro.-Eu gosto de começar o ano com uma apresentação oral.-Meu coração disparou como um carro de formula 1.-O tema vai ser...-Ele escreveu uma frase no quadro negro e voltou a olhar para a sala.-Segunda guerra mundial. Voces tem o dia de hoje para preparar sua apresentação para a aula de amanha.-Hoje eu me pergunto que tipo de professor passa um trabalho oral para crianças de oito anos, mas naquela epoca tudo que eu fiz foi olhar para minhas mãos tremulas e roer as unhas de todos os meus dedos.

Eu passei o resto da aula escrevendo uma complexa e completa redação escrita, na esperança de ser o suficiente para ele. O sinal tocou e todos os alunos sairam rapidamente da sala, deixando apenas o professor que estava arrumando suas coisas.

-Com licença, professor.-Ele se virou para mim com um olhar cansado. Eu estiquei meu trabalho escrito para ele e abaixei a cabeça.-Eu queria saber se eu poderia fazer apenas um trabalho escrito?- Ele me olhou raivoso e bufou.

-Por acaso voce é mais especial do que os outros?-Eu queria muito falar que eu tinha um problema mental que me impedia de falar em publico, mas naquele momento como em tantos outros eu apenas fiquei olhando para ele, calado.-Voce vai fazer o trabalho igual os outros.-Eu peguei o meu trabalho escrito e sai da sala, sem dizer mais nada.

Eu passei o resto do dia preocupado com oque iria acontecer no dia seguinte. Mesmo com medo do que aconteceria, eu fiz uma apresentação e decorei o que eu precisava falar no dia seguinte. Quando amanheceu, eu me levantei assustado e me arrumei. Quando deu o horario eu corri para o colegio e entrei na sala de aula. O professor Martins ja estava la, esperando os alunos que riam e mostravam seus scripts uns para os outros. Eu fui para a ultima cadeira, como sempre, e esperei ele dar as instruçoes.

-Quem quer começar?-Varias crianças levantaram as mãos, mas ele apenas apontou para mim, que estava encolhido na carteira.-Voce!-Naquele momento meu coração parou.-Como é seu nome?

-Nicolas Montenegro.-Ele sorriu maliciosamente e apontou para a frente da sala.

-O publico te espera, Sr Montenegro.-Eu me levantei tremendo e fui para frente da sala. Meu olhar estava baixo, evitando ao maximo olhar para as pessoas.

-Bom, a Segunda Guerra Mundial foi um conflito militar global que...

-Sr Montenegro.-Eu olhei para o professor e ele voltou a dar aquele sorriso malicioso.-Olhando para os alunos, por favor.-Eu fechei os olhos e me virei para os alunos. Quando eu os abri, vi todos os alunos olhando para mim, e naquele momento minha mente desligou por completo. Não conseguia se mover ou falar, apenas conseguia ouvir os alunos cochichando uns para os outros e dando risada.

Eu abri a boca para falar, mas nada saiu. Como ultimo recurso eu sai correndo da sala e entrei no banheiro. Eu comecei a chorar como nunca antes, e a cada lagrima que caia eu me sentia pior. Eu fiquei la até tocar o sinal da terceira aula e todos os alunos sairem para o intervalo. Eu voltei para a sala, onde o professor guardava seu material na bolsa.

-Com licença, professor.-Ele me olhou com raiva e um malicioso sorriso.

-Olha só o Sr fugitivo.-Eu respirei fundo e dei um breve sorriso.

-Eu queria me desculpar...

-Por favor. Não precisa se desculpar.-Eu sorri esperançoso.-Claro que voce vai ficar com zero e uma advertencia por ter saido sem minha permissão.-Eu olhei espantado e abaixei a cabeça.

-Voce não entende...

-Voce esta doente, Sr Montenegro?-Definitivamente estava, mas naquela epoca eu sequer sabia o que era Sociofobia, então eu apenas acenei negativamente com a cabeça.-Então qual foi o motivo para voce ter saido daquela maneira?-Nunca quis tanto ser capaz de responder alguem, mas eu fiquei apenas la, calado.-ha, eu acho que sei o que voce tem.-Eu esperava que ele me dissesse o que eu tinha, mas ele apenas sorriu.-Voce tem complexo de querer ser o centro das atençoes.-Uma enorme furia cresceu em mim, mas que logo foi reprimida pela minha fobia social.-Até a proxima aula, Sr Montenegro.-Ele saiu da sala e eu comecei a chorar.

Eu não chorei por ter perdido a nota ou por ter levado uma advertencia, mas por sentir mais uma vez que ninguem era capaz de me entender. Parecia que todas as pessoas procuravam uma desculpa para dizer que o que eu sentia não era real. Que tudo não passava de algo que eu fazia para chamar atenção! Quem dera fosse...

Finalmente livreOnde histórias criam vida. Descubra agora