Advertência - 04

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                                                                                     Valentina

São cinco da manhã e não consigo fechar os olhos. Olho para o lado e vejo Camilla dormir de forma calma e despreocupada, sei que ela sabe que tem algo errado, mas não imagina a magnitude do problema.

Não se falava em outra coisa em Campo Verde, algumas casas receberam notificação de despejo e a única forma de evitar a fome era trabalhando e bajulando aqueles que tiraram tudo de nós. – ainda na parte da tarde recebemos nossa carta de despejo.

Gui tentou de todas as formas entrar em contato com o responsável pela mineradora na região o tal de Vincent Lipphaus, o homem sem coração que jurei odiar.

Nunca vi tamanha arrogância, tamanha prepotência e tamanho egoísmo. Posso listar todos os adjetivos ruins que se tem em um dicionário e ainda sim não estarei satisfeita, porque sei que não será suficiente para defini-lo.

Safira vira de um lado para o outro tentando pegar no sono. – mas prefiro permanecer em silêncio, não há muito o que falar. Me sinto responsável por nós e sei que cabe a mim resolver essa situação. Temos apenas três dias para sair. Para onde iremos? Como arranjarei alimentos para Camilla?

Levanto e abro a porta lentamente, mas Safira continua tentando dormir, sento na varanda me apoiando na coluna do meio. – lembro-me da conversa com Míriam e sinto náuseas.

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— É minha melhor opção – suspira com pesar.

— Nós não podemos aceitar! – falo quase gritando.

— Não temos escolha Valentina. Veja, faz três semanas que Bruno não arranja um bico descente, vindo para cá e arrumando trabalho na fazenda ele terá a oportunidade de ter um trabalho que ganha por quinzena. E eu também poderei trabalhar.

— Mas vão tirar sua casa!

— Mas vão nos colocar em casas mais próximas da Fazenda.

— Mas não será sua casa, eles podem apenas decidir te colocar na rua e você terá que aceitar. Ou você acha que eles passam muito tempo explorando um lugar? Quando essa água acabar eles irão embora e deixarão mais pobreza que quando chegaram.

— Não tenho escolha Val – fala em tom de lamento – minha mãe já não está em condições de se estressar. Você tem Carlos e seu pai na cidade, e eu só tenho ela e Bruno, para onde iremos se recusarmos a proposta? Soube que em outros lugares nem proposta como essa fazem! As pessoas ficam ao relento. Ao que tudo parece o filho do dono da empresa está sendo caridoso. – riu sem conseguir esconder o ódio que ainda agitava minhas veias. Caridoso.

Caridoso. Palavra engraçada para a pessoa que age daquela forma.

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Sei pouco da história do meu país e do mundo. O que é contado na escola é muito pouco, resumido. Guilherme diz que as pessoas normais não podem ter acesso a certas informações, que ele mesmo se incumbiria de descobrir em Cosmópoles para me contar. – mas o que sei é que, há dois séculos atrás as nações mais poderosas do mundo perderam o controle.

Criaram máquinas de guerra e as mesmas os destruíram, exploraram a natureza e os recursos minerais começaram a ficar caros, a população pobre começou a padecer com sede e fome. E com isso, guerras e conflitos se iniciaram, grupos contrários a era tecnológica vigente – que consistia em máquinas que substituíam muitos trabalhadores, os deixando desempregados – começavam a ganhar força e apoio popular, a pobreza causada pela alta taxa de desemprego, apenas aumentava...

Conjuga-meOnde histórias criam vida. Descubra agora