Capítulo 9 - Ele não tem espelhos em casa?

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- A Catarina voltou a perguntar por ti. – Comentei, vendo o Joel a sentar-se na cadeira junto à minha secretária com um café na mão. Estava a tornar-se uma rotina, para ele estar no estúdio era irritante.

- Este fim de semana cumpro a minha promessa, eles que preparem o monopólio! – Exclamou, bebericando o seu café.

- Não gostas mesmo de estar no teu local de trabalho. – Comentei enquanto procurava umas faturas que tinha de entregar na contabilidade.

- É um local cheio de mulheres coscuvilheiras... - Murmurou. – Olham-me como se fosse um extraterrestre.

- Não estão habituadas a homens bonitos. – Respondi, piscando-lhe o olho.

- Obrigada pelo elogio, mas duvido que não maquilhem modelos de topo, tendo em conta as capas de revistas. – Retaliou, atirando o copo do café para o lixo.

- Uma coisa é maquilha-los uma vez, outra é admirá-lo diariamente! – Exclamei, vendo-o a acenar a cabeça em tom de reprovação. Ele não tem espelhos em casa?

- Eu não nasci para isto.

- Que exagero, sabes bem o que vales. – Respondi, não percebendo o seu drama. Ele era um homem discreto, mas de certeza que durante toda a sua vida devia estar habituado demonstrações do género.

- Mas não gosto de ser tratado desta forma. Eu passo e são sempre burburinhos irritantes. – Resmungou. Sabia bem do que ele falava comigo era o mesmo, principalmente desde que ele chegara à revista, mas já antes comentavam a minha vida.

- Eu sei do que falas. – Respondi, e ele olhou-me com estranheza. – É verdade, sou neta do dono disto, fiquei viúva, órfã, com três filhos para criar... Estás a olhar para a coitadinha cá do sítio. – Contei. Em tempos preocupei-me com o que falavam nas minhas costas, mas com o tempo aprendi que não valia a pena ligar ao que elas comentavam, afinal vozes de burro não chegam ao céu.

- Orfã? – Perguntou confuso. Eu não lhe contei. Era verdade tinha-me esquecido de comentar, mas também numa se tinha proporcionado a ocasião.

- Sim, no mesmo acidente que fiquei viúva. – Respondi, vendo a sua cara de choque. Estava sem palavras, tal como todas as pessoas a quem contava. Depois vinha a pena, coitada não tem sorte na vida. – Já ultrapassei. – Falei, tentando amenizar o ambiente.

- Não sei o que dizer. – Respondeu, olhando para a minha secretária.

- Não tens de dizer nada, já vivi a pena de todos. – Falei. Era verdade, a pena e o sofrimento que os outros diziam ter por mim, apenas mentiras para se colocarem bem na sociedade.

- És a mulher mais forte que conheço. – Falou, olhando-me diretamente pela primeira vez, desde que lhe tinha aberto o coração.

- Obrigada. – Respondi. Ele puxou a minha mão e apertou-a.

- Quero que saibas que estou aqui para o que precisares. – Ofereceu, fazendo-me sorrir. Não eram apenas os meus filhos que me faziam ganhar forças, eram também os meus amigos.

***000***

- Não estás a perceber o que eu preciso para este artigo. – Repeti pela enésima vez ao Gonçalo, mas ele estava a leste daquilo que eu pretendia. – Volta a ler as minhas indicações. – Pedi. – Tu não estás nada bem, vê se acordas.

- Desculpa, tenho a cabeça noutro lugar. – Desculpou-se. Ele era bom rapaz, mas já há algum tempo estava bastante mais distraído do que costume.

- Isso já percebi eu. – Respondi. – Mas eu preciso que dês o teu melhor, este artigo é importante, e sabes bem disso. – Expliquei.

- Vou concentrar-me.

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