- Eu ouvi dizer que a doida da ex-namorada do Joel voltou a dar o ar da sua graça. – Comentou a Rute. Tinha-a convidado para jantar em minha casa, os miúdos adoravam-na e há muito tempo que não conversávamos longe das paredes do trabalho.
- Sim, foi uma cena infeliz. – Respondi. Estava a preparar um frango assado no forno, como batatas assadas. Era um dos pratos favoritos dos miúdos e também da minha prima. Enquanto eu preparava o frango, ela estava a descascar as batatas. – A mulher é um bocado louca e obcecada.
- Nunca ouviste a parte dela da história. – Avisou.
- É verdade, mas sei as cenas que a vi fazer, e não me parecem de uma pessoa normal. – Respondi. A relação podia ter acabado mal, ou até eventualmente o Joel tê-la traído, mas o facto de andar louca atrás dele é doentio.
- Sim, mas mesmo assim gostava de saber o que aconteceu pela boca dela. – Comentou. Ela era uma boa jornalista, talvez mais integra do que deveria ser para ter o sucesso desejado. Gostava de ouvir todas as versões dos envolvidos, e tinha a mania de publicar o que realmente lhe diziam, era essa a razão porque não exercia em pleno a sua profissão. – Nunca existe apenas uma história, principalmente quando são de amor, cada um vai sempre puxar a brasa à sua sardinha. – Comentou.
- Nem sempre, por exemplo, a minha separação com o Lourenço foi consensual, acho que a versão de ambos é igual. – Contestei. Afinal tinha sido um divórcio por vontade de ambos.
- Não sabes o que é que ele disse aos amigos. – Retaliou, fazendo-me abanar a cabeça em tom de reprovação. Ele não era capaz. – Não metas as mãos no fogo por ele. – Será que ela sabe de alguma coisa? – E não, não sei de nada. – Falou, lendo os meus pensamentos. – Mas já ouvi e vi muita coisa, e sei que nem sempre as versões combinam, para não dizer raramente.
- Eu acho que não, mas também já passaram tantos anos... - Suspirei.
- Voltavas atrás?
- Para mudar?
- Sim.
- Não. – Respondi de imediato. – Quer dizer, acho que não. Afinal se não tivesse feito o que fiz não teria a minha filha, mas se mudasse talvez evitasse a vergonha que os meus pais sentiram, as dores de cabeça do nosso avô. – Respondi.
- Mas não seria o que és hoje. – Completou a Rute. Era um cliché, somos o que somos hoje, devido ao nosso passado, mas não dava para negar, era mesmo verdade.
- Talvez não, podia ser uma pessoa melhor, porque outras coisas aconteceriam na minha vida. – Respondi. Poderias ter voltado a encontrar o Joel.
- Tudo acontece por uma razão, e o teu encontro com o Joel tem a haver com isso. – Atirou. Enlouqueceu.
- Não, o Joel faz parte do meu passado longínquo.
- E agora do teu presente, afinal ele passa a vida na tua secretária, vou almoçar quase todos os dias juntos e até já fazem programas em família. – Retorquiu sorridente.
- Somos amigos, apenas isso. – Respondi.
- Eu não acredito que o vejas apenas como "um amigo". – Murmurou.
- Porquê?
- Porque notasse que têm química, existe algo mais forte que vos une. – Será que ela tem razão?
***000***
- Porta-te bem, e cuidado para não te deixares levar pelo passado. – Aconselhou a minha prima, despedindo-se.
O jantar tinha sido animado apesar da ausência da Ana, que tinha ido jantar com os amigos. A Rute adorava os "sobrinhos", como ela fosse minha irmã, mas realidade era como se fosse.
- Eu porto-me sempre bem! – Resmunguei.
- Claro que portas. – Falou, num tom pouco credível. Quando ela abriu a porta para sair, a belíssima cara do Joel apareceu. – O que é que estás aqui a fazer? – Perguntou assustada.
- Vim falar com a Olívia. – Respondeu.
- Não podias falar amanhã? – Perguntou a minha prima, fazendo-me dar-lhe uma cotovelada. – Ai! – Exclamou.
- Não tinhas que ir para casa? – Perguntei.
- Sim, sim. – Respondeu contrariada. – Até amanhã. – Falou, saindo.
- O que se passa com ela? – Perguntou o Joel, sorrindo.
- Quem saberá! – Exclamei. – O que viesse cá fazer? O que tinhas para me dizer? – Perguntei, fazendo-lhe sinal para entrar, e ele assim fez.
- Estava a passar por aqui, vi a luz da sala acesa e resolvi ver se ainda estavas por aqui. – Falou. Notava-se que estava nervoso, algo que era estranho ver nele.
- Fizeste bem. – Falei, mesmo que não soubesse se realmente as intenções dele. – E o que fazias na rua a uma hora destas? – Já não era propriamente cedo, para se andar na rua.
- A tentar espairecer. – Confessou.
- O que se passa? – Perguntei, sentando-me no sofá, e fazendo sinal para ele também o fazer, afinal não ia estar ali de pé.
- A Camila já andou a falar com a minha mãe. Parece que lhe contou que ando metido com uma mulher casada. – Contou, suspirando.
- De onde é que ela tirou essa ideia? – Perguntei, não percebendo a quem ele se estava a referir.
- Da foto da tua secretária. – Respondeu. Calma, a mulher casada sou eu?
- Mas de onde é que ela tirou a ideia de termos um caso? – Perguntei chateada. – Já não basta a do trabalho, agora a tua ex-namorada também anda a inventar coisas?
- Ela não vida, então tenta infernizar a minha. – Respondeu. – Desculpa todas as confusões que te causei, afinal a culpa é toda minha. – Falou. A culpa não era dele, era das pessoas que não tinham vida própria e que preferiam comentar a dos outros.
- E o que é que a tua mãe disse para te chateares?
- O mesmo de sempre, que ninguém era tão bom para mim como a Camila, que ninguém gostava mais de mim do que a Camila. – Contou, suspirando. – Não dá para conversar com ela, mesmo eu já tendo saído de casa, a minha mãe controla sempre tudo. – Desabafou. – Parece que quer definir o meu destino, que obviamente é casar com a Camila.
- Não tens que o fazer.
- Eu sei que não, e nem quero casar com ela. – Respondeu de imediato. – Mas acho que por mais que tente fugir é o que vai acontecer. – Ele estava a conformar-se com um destino que não era o que queria e apenas o vai deixar infeliz.
- Já lutaste para teres a profissão que adoras, porque não voltas a lutar pelo teu amor? – Perguntei, fazendo-o rir.
- Não é assim tão fácil. Para a minha mãe este casamento é a solução para a minha profissão falhada, pelo menos para ela. – Contou. – Mas eu não amo a Camila, eu não quero nada com ela.
- Não te podem obrigar a casar.
- Mas podem conseguir encurralar-me. – Respondeu, cerrando o punho. – Se há uns tempos, eu até poderia considerar aceitar o destino que me querem impor, neste momento eu sei quem quero. – Falou. Quem será?
- Então vai à luta! – Exclamei.
- Não é assim tão fácil. – Retaliou.
- Tudo o que é bom, requer esforço. – Respondi, fazendo-o rir.
- Mas é preciso que a outra pessoa nos queira. – Falou, olhando-me diretamente nos olhos. – E isso muitas vezes nem com esforço lá vai.
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First Love
RomanceMuito dificilmente esquecemos aquele primeiro amor, os namoricos do tempo da escola. Queremos esquecer o que aconteceu, que pensamos que nunca mais nos vão aparecer há frente. Era esse o caso de Olívia, editora numa revista de moda, que nunca espera...