As marcas

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Estava verdadeiramente impressionada apesar de não entender completamente a necessidade da minha presença. O pátio principal e os arredores dos jardins haviam se transformado totalmente em poucos minutos, substituindo o verde das gramas pelo vermelho e azul dos uniformes fardados marchando em fileira. Os jardineiros teriam muito trabalho nos dias seguintes para recuperar toda a destruição do campo e me repreendi mentalmente por ter tal pensamento. Não deveria estar pensando na morte das folhas e sim na marcha organizada vindo até nós.
No início tentei contá-los, cheguei em algumas centenas e desisti quando observei por cima do ombro de Maxon que haviam ainda muitos mutirões para chegar. Nem sabia que esse palácio poderia comportar tamanha quantidade de funcionários. Talvez Clarkson estivesse mesmo desesperado depois de ter mandado embora metade dos nossos antigos guardiões, porque contratou o triplo de guardas poucos dias depois.
Olhei para meu noivo de relance tentando encontrar qualquer sinal de conforto e calma. Minha cabeça girava e meu estômago estava embrulhado, talvez pela perspectiva de ter finalmente algo para fazer que possa ser considerado como meu treinamento para princesa. Conhecia a pressão muito bem, sabia que Clarkson observava todos os meus passos e qualquer derrapada poderia me levar ao fundo do posso. Estava disposta a ser perfeita, compreendi os riscos quando aceitei me casar com Maxon, tinha total consciência de que seria difícil passar pelo rei, mas esperava que meu período de paz duraria um pouco mais. Então agora estou em pé no palanque, um microfone poucos centímetros à minha frente esperando para encontrar minha voz. Maxon segura minha mão, sabe como estou nervosa, mesmo assim não sorri.
_Acabará rápido, minha querida. –ele tenta me acalmar, mas sua voz não tinha qualquer traço de verdade ou consolo, pelo contrário, parecia perdido em outro mundo.
Imaginei que teria de sustentar um sorriso brilhante durante todo o trajeto, que teria de ser educada, gentil e amável com nossos novos funcionários, mas Maxon não parecia em nada com nenhuma dessas qualidades. Os estamos recebendo em nossa casa, esses serão os homens que salvarão nossas vidas em caso de emergência, então porque estávamos sendo rudes? Não entendo da cultura militar, o máximo que conheço é o momento em que botam uma das mãos na testa e batem continência, mas, além disso? Era um puro mistério para mim.
Imaginei Aspen entre a multidão e não consegui deixar de imaginar o que ele pensaria de nós. Se fosse um recém-chegado, gostaria que fosse assim que seus futuros soberanos o recebesse? Talvez Maxon só estivesse sendo cauteloso depois de tudo o que aconteceu durante a escolha, talvez ainda tivesse um pé atrás em relação aos recrutas e não confiasse completamente nos homens lhe fazendo reverências. Não sei se confiaria também se fosse eu em seu lugar, afinal ele foi baleado e viu a morte de perto, por pouco não sobreviveu, quem sabe o que esses homens podem fazer?
Podia não gostar de Clarkson, podia sonhar com sua morte secretamente, mas tinha de admitir que ele nunca deixaria qualquer homem suspeito ultrapassar as muralhas da propriedade. Ele foi cauteloso, tenho certeza, nada pode acontecer. Repeti esse mantra diversas vezes enquanto observava os novos soldados dirigindo-se aos seus lugares à nossa frente. Captei um rápido olhar de Aspen em nossa direção enquanto ele e alguns de seus amigos davam ordens e terminavam de acomodar os recém chegados.
Não havíamos tido uma conversa franca desde aquele dia. Fora poucos cumprimentos ligeiros não tínhamos nos falado. Entendia sua hesitação, Maxon nunca disse nada sobre perdoá-lo, na realidade ele não faz mais do que simplesmente tolerar meu ex-namorado. Nenhum dos dois quer instalar uma tensão que sabemos não poder controlar, e mesmo que eu não queira que isso aconteça, sentia falta de Aspen e não suportava a ideia de simplesmente não conversar mais com ele. Meu trabalho não era muito significativo, decorei as poucas palavras e as disse da melhor maneira possível em frente de todos. Maxon permaneceu segurando minha mão durante todo o processo, até mesmo quando terminou seu discurso e sorriu pela primeira vez diante às palmas recebidas. Senti um peso enorme desaparecer dos meus músculos e senti como se pudesse finalmente respirar livre. Foi um sentimento libertador, me senti poderosa, mesmo que por poucos segundos, afinal eu havia conseguido.
Clarkson nunca encontraria um defeito em minha ação, nem nas posteriores, garantiria isso. Pela primeira vez tive certeza de que, independente dos obstáculos, conseguiria atravessá-los. Então as coisas começaram a ficar estranhas. Não passou de um borrão preto, por um momento achei que tivesse visto coisas e deixei de lado. Parei de prestar atenção nesse pequeno detalhe até que ele praticamente se jogou para cima de mim.
Foram poucos segundos, milésimos se duvidar, para que todos eles levantassem as mãos direitas e as levassem até o topo da cabeça, mas nesses poucos segundos vi muita coisa. Escondi meu tremor de todos com um sorriso alegre enquanto estreitava os olhos para ver melhor. A estrela. Oito pontas com um único significado. Um objetivo que me apavorava completamente. Não entendia como August conseguiu infiltrar tantos homens e nem se poderia confiar neles. Estava prestes a chamar a atenção de Maxon para o assunto quando um deles levantou o braço para coçar a nunca e pude finalmente ver com clareza aquele mistério.
_O que é aquilo? –indico com a cabeça os homens ao nosso lado. Ele tem dificuldades em encontrar meu alvo por ser pequeno e fácil de ser escondido. Estava quase desistindo, já tinha aceitado minha loucura eminente. Provavelmente estava paranóica de medo, vendo ameaças onde não existiam, mas havia a pequena possibilidade de eu estar certa e tinha de apostar nela.
_Onde? –sussurra de volta enquanto caminhamos por entre os homens, cumprimentando-os.
_Suas mãos. Olhe as mãos. –ele rapidamente estende seu braço para o guarda ao seu lado, que com um sorriso a aperta forte. Não pude ver muita coisa já que a barulheira e a movimentação me tiraram completamente a concentração.
_Um dragão. –murmura de volta enquanto continua apertando a mão de todos. Ele queria saber quantos possuíam aquele estranho animal, nós dois queríamos principalmente entender o significado. Não era uma estrela do norte, sem rebeldes nortistas. Possuir um dragão tatuado na palma da mão é questão de gosto, não veria nada em uma pessoa tatuada, mas a situação torna-se outra quando são centenas deles. Todas exatamente iguais.
_Todos eles foram no mesmo tatuador? –era uma pergunta completamente retórica, mas ainda assim Maxon abriu um pequeno sorriso. –Sabe o que significa? –ele dá de ombros, pensativo. Observa por um momento os arredores antes de me seguras pelas mãos e me guiar escada acima.
_Não acho que sejam tatuagens. –inicia preocupado. Abro a boca algumas vezes, prestes a retrucar, porque não podem ser outras coisas, além disso. Só se eles pegaram canetas pretas e resolveram pintar as mãos essa manhã, o que acho muito pouco provável. Permaneço em silêncio enquanto espero que ele complete seu raciocínio. –O lugar estava marcado em relevo, todo vermelho ao redor. –não entendi a relevância dessa informação, mas não o interrompi. –Já vi tatuagens antes e depois de pronta não ficam desse jeito.
Não consegui deixar de lado a possibilidade de nós dois estarmos loucos, mas parecia suspeito demais que dois terços dos homens contratados possuíssem as mesmas marcas em seu corpo. Estava tão perdida em meus próprios devaneios que nem percebi a recente apreensão instalada no corredor. Desviei o olhar de Maxon, focado e receoso, para o outro lado da parede onde Aspen dava meia volta e fugia de nós. Novamente. Permaneci quieta enquanto o via se afastar. Queria movimentar meus lábios, dizer alguma coisa, mas nada parecia apropriado no momento.
_Não precisa me evitar, Leger, o passado está exatamente onde deveria estar. –Maxon coça a nuca, claramente ansioso, e se recompõe rapidamente quando o guarda se vira assustado por ter recebido a palavra. –Enterrado. –acrescenta rapidamente. Aspen sorri, timidamente, e se aproxima constrangido com toda a atenção.
_Então não vai me mandar para a Nova Ásia? –pergunta esperançoso. Estava radiante em vê-los finalmente conversando que praticamente esquecera todo o lance da tatuagem.
_Talvez. –os pequenos olhos verdes de Aspen arregalaram imediatamente. Com poucos milésimos ele tentou se recuperar do choque, mas não pareceu possível. Cutuquei Maxon com mais força do que pretendia e ele riu. –Não farei isso, não se preocupe. –pude claramente ver a tensão fluir do moreno assim que escutava as palavras do príncipe.
_Se vir Lucy pode avisar... –Aspen tenta quebrar o silêncio me dirigindo a palavra.
_Claro!- o interrompo. Ele sorri envergonhado novamente e volta a encarar o chão.
_America me contou que estão namorando. –Maxon coloca um de seus braços ao redor da minha cintura e sorri para o outro homem. –Quando é o casamento? –o moreno recua alguns passos com a pergunta e sorri nervosamente.
_No mundo real um casal não se casa com menos de três meses de namoro. –provoca. Maxon ri, uma risada de pura alegria. –Mas prometo que serão convidados. –acrescenta assim que param de rir.
_Leger, você esteve no exército, certo? –Aspen assente confuso. –Por muito tempo?
_O mínimo de tempo possível para me encarregarem até aqui. –dá de ombros sem entender o objetivo das perguntas de Maxon, mas sabia exatamente o que ele queria.
_Nós notamos algo nas mãos de alguns dos novos guardas recrutados. –digo direta. Ele assentiu, compreendendo o que queríamos. –Gostaria de saber se sabe o significado.
_São muito típicos entre as castas 7 e 8, principalmente nas províncias do leste e sul, que são as mais pobres, nos outros locais existem em menor proporção. Eles são uma comunidade separada dentro do exército, não deixam muitas pessoas entrarem.
_Como uma sociedade secreta? –Maxon pergunta verdadeiramente interessado e Aspen assente sem jeito.
_Não sei exatamente o porquê de ser um dragão, mas ouvi dizer que é uma homenagem ao fundador. É muito comum. –termina. O silêncio se instala enquanto digeríamos as informações.
_Como eles tatuaram um dragão na mão?
_É marcado a ferro quente, America, como o gado. –abro a boca diversas vezes, mas nada me vem em mente para dizer.
_Obrigada, Leger, foi de grande ajuda. –ele sorri satisfeito, mas parecia saber que escondíamos algo, porque se virou uma última vez antes de ir embora.
_Esses homens não fizeram nada de errado, só estão tentando salvar suas famílias com as poucas oportunidades que têm. –termina sem sorrir e se afasta não esperando uma resposta, sem antes fazer uma reverência para nós.
_O que fazemos agora? Ficamos de olho neles? –perguntei finalmente enquanto caminhávamos de volta para nosso andar.
_Não. Deixem-nos. –suas palavras pairam no ar. –Já basta ter de me preocupar com minha babá chegando amanhã. –seguro uma risada- não quero me tornar uma.
_Não será tão ruim. –minto. –Ele pode surpreender.

Notas Finais


Espero que tenham gostadooo pq no prox tem a super mega ultra apariçao de um ser maravilhoso vindo do céu pra fazer a vida de maxon um inferno

Royal or RebelOnde histórias criam vida. Descubra agora