- Ela se parece muito com você. - Arthur falou, enquanto observava a filha no berço, escondendo uma das mãos atrás das costas.
Era verdade.A bebê que adormecia no berço profundamente, era a cópia da mãe.
Enormes olhos azuis que brilhavam como duas joias. Os primeiros fios de cabelo que apareciam timidamente, eram escuros como a noite, assim como os que escorriam pelas costas da mulher. A pele branca, o suspirar doce. Tudo nela, lembrava Elizabeth.Arthur deslizou a mão que não escondia atrás do próprio corpo, pela bochecha da esposa, e ela suspirou, apreciando o seu toque.
- Ela será dona de uma beleza extraordinária... Assim como você. - os olhos dele quase pediam desculpas ao encará-la, e até marejavam. Analisavam-na com bastante força, como se não pudessem se esquecer de nada.
Elizabeth demorou os olhos na filha por mais alguns segundos.
Sentia a paz assolar dentro do seu coração e não queria que aquela sensação se esvaísse tão depressa. E então, virou de forma sutil o rosto para o marido, que insistia em manter uma das mãos atrás das costas.
- O que você está escondendo ai? - perguntou com um sorriso curioso.
- Eu sinto muito por isso. - o rosto encantado e coberto de uma felicidade genuína, deu lugar a sobrancelhas franzidas e olhos trêmulos que encaravam o nada.
- O que está dizendo querido? - ela aninhou sua mão no rosto rígido dele, tentando apaziguá-lo com um sorriso.
- Que sinto muito pela rainha dos Hadrias, já ela não pôde viver sua vida completamente. - os olhos cinzentos encontraram os dela quando ele endireitou sua postura.
Elizabeth sentiu como se milhares de agulhas penetrassem a sua garganta ao engolir completamente seco. Ele sabia.- Arthur... - sua voz saiu como um sussurro choroso. Balançou a cabeça, como se indicasse que o que ele estava falando era uma bobagem. Isso fazia com que os dentes dele rangessem. Ele viu tudo, ele sabia de tudo. E ela não conseguia sequer pensar no que dizer.
- Essa maldita rosa no seu braço, Elizabeth. Eu sei o que você é. - um frio percorreu a espinha dela.
Tentou calcular rapidamente onde tinha errado. Em que momento esteve tão desleixada e desprevenida, ou quando foi que ele a viu. Quando foi que baixou tanto a guarda ao ponto de deixar escapar algo tão importante e que tentou esconder durante todo esse tempo, com todas as suas forças.- Como... Como você sabe? - os olhos dele se encheram de lágrimas. Não era tristeza, disso ela tinha certeza.
- Eu vim para este mundo para matar você e os outros da sua raça. - cuspiu as palavras sobre sua esposa.
- Quando foi que... Você já sabia antes de me conhecer? - Elizabeth dava passos lentos para trás.
- Não. Eu me apaixonei por você sem saber disso. - os olhos dele derramavam um sentimento que ela não conseguia identificar - Desisti da guarda por você. E você nunca me contou quem era de verdade... - fechou a outra mão em punho, tentando descarregar toda a sua raiva.
- Você nunca me contou que fazia parte da guarda! - tentou se defender.
- Cale a boca, Elizabeth. - sua expressão emanava desgosto.
- Arthur, o que você está pensando?! - quando se deu conta, seu corpo encostava na beira da janela. - Arthur, por favor...
- Você é pior do que apenas vermelha. Você é a rainha deles. - ele revelou a mão escondia atrás de si. Empunhava uma faca afiada, recém-comprada. Elizabeth conseguiu ver o seu reflexo miserável nela.
- Como isso é possível? Você não é um azul. Você sequer tem uma marca no seu braço. Como você fazia parte da guarda? - insistiu, ao tentar sentir qualquer vibração azul no corpo dele e falhar.
- CALE A BOCA! - ele se enfurecia cada vez mais. A água escorria como um rio por suas bochechas, e ela podia sentir a fúria queimando nos olhos dele.
- Você é um... - não conseguiu terminar a frase. Sentia pena dele, e quase conseguia sentir a sua dor.
- Eles vão me adorar depois que eu levar o seu corpo para eles. - ele sorria. Elizabeth não conseguia mais encontrar seu marido, o homem por quem tinha se apaixonado por trás daquela pessoa cheia de sede por matá-la.
Não teve tempo de se despedir de Alice.
Ele sacou a faca afiadíssima e sem pestanejar ou pensar duas vezes, ele atravessou o objeto no pescoço de sua mulher.
Os olhos azuis estavam escancarados, surpresos, confusos. Um fio de água escorreu deles.
Ele retirou a faca da sua pele, ouvindo o barulho das dezenas de veias se romperem e da carne se rasgar.
O corpo dela caiu no chão, debatendo-se de dor, como um peixe que não consegue respirar.
Ele assistiu tudo em silêncio, sem ao menos piscar ou dar-se arrependido.
A expressão de espanto foi a última coisa que ele viu dela em vida, até que ela não conseguia mais lutar, nem respirar. Seus músculos imploravam para descansar. Para sempre.O som que acompanhou a cena trágica foi o choro da bebê que acordara no berço.
Ele continuou em pé, esperando que o poder que escorria no sangue dela e se empoçava no chão, ao lado do berço, o consumisse. Esperou ansioso para que algo acontecesse. Para que talvez, depois de tantos anos ele fosse finalmente reconhecido.
Mas assim que o relógio no seu pulso, manchado de sangue real, marcou meia-noite, tudo que ele presenciou foi o choro desamparado da filha se transformar em um choro de dor. Ele encarou o berço somente quando percebeu uma luz dourada vindo dele, refletindo no seu rosto.
A rosa se desenhava no braço dela. Arranhando a sua carne, percorrendo a sua pele. Ele assistiu tudo maravilhado. Era um processo que ele sonhou durante toda a sua vida, mas que nunca aconteceu e provavelmente nunca aconteceria com ele.
Assim que a figura se formou, o coração de Elizabeth finalmente parou de bater.Arthur deixou o seu próprio peso cair sobre seus joelhos. Ele os manchou de vermelho, mas não se importava. Não enxergava nada, pois sua visão estava coberta por lágrimas. Suas mãos estavam trêmulas e sem forças. Gritou, em desespero, implorando ao vazio para sentir alguma coisa. Para que algo acontecesse.
Mas estava fadado a permanecer naquela condição para sempre.
Estava condenado a nunca ser um deles.
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Alice [Completo]
Teen FictionAs aulas se passaram, entediantes como sempre, até o terceiro horário. Eu estava anotando qualquer coisa no caderno para parecer que eu estava ouvindo o que a senhora Delanay escrevia no quadro quando um aviãozinho pousou sobre a minha mesa. Franzi...