Capitulo um

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Houve um tempo que minhas vozes internas me atormentavam de uma forma perto de enlouquecedora. Hoje em dia, sei lidar com as mesmas. Às vezes, elas escapam e me deixam levemente transtornado, nada que eu não possa resolver.

Um rosto me encara no espelho, levo um tempo para notar que se tratava de mim mesmo. Um novo corte de cabelo. Novas roupas.

Depois de muito pensar com os meus botões, havia decidido que era disto que precisava para tocar minha vida em frente, voltar para a minha cidade natal. Meus olhos se tratavam de algo que me tornava único em grande parte dos lugares. Um acinzentado em tom castanho e outro esverdeado, meus cabelos loiros caiam levemente sobre minha testa, porém, estavam perfeitamente penteados, não sairia de casa se não estivessem assim. Meu corpo era algo perto de longe do padrão. Minha altura era a ideal para a proporção do mesmo.

A pasta pesava em meu ombro, ainda estava no banheiro. Teria de sair em algum momento e encarar meu novo ambiente de trabalho.

Meu relógio apitou. Não havia mais saída. Segui com passos lentos até o ponto que se encontrava do outro lado de uma recepção um tanto grande demais para o que havia ali, apenas uma mesa, uma escultura de águas atrás e uma cadeira, onde continha uma garota, não muito velha escrevendo algumas coisas e se distraindo. Passei o cartão e retirei o pequeno papel que avisava a hora da minha entrada, joguei o mesmo para o bolso da pasta e segui em direção aos elevadores. Assim que adentrei no mesmo, um cheiro forte de algum perfume que de fato não conseguia reconhecer tomou conta do ambiente. E assim segui, pelos vinte e dois andares até que a porta se abriu. Saltei para fora e segui na direção de uma das portas "ACS – Assessoria de Comunicação Social". Adentrei na mesma e algumas cabeças viraram de encontro a mim, graças a Deus havia posto minhas lentes castanhas antes de sair do banheiro. Sorri e acenei.

- Onde posso encontrar o senhor Ziemer? – Um dos homens próximos da porta, respondeu com uma voz extremamente calma, ele não parecia ser muito alto e em sua cabeça, já havia sinais de uma calvície precoce. Ele não era de fato bonito, mas assim que meu olhar encontrou o dele, gostei dele.

- Você pode adentrar naquela porta e seguir no corredor, e se não me engano você é Erik, certo? – Concordei com a cabeça e sorri novamente, segui em passos lentos até estar próximo e estendi minha mão para ele.

- Certo. Erik Mahasiah.

- Charles Druman, seja bem vindo. – As outras pessoas já haviam voltado aos seus afazeres, não eram muitos. Além de Charles, haviam duas mulheres, uma negra com cabelos escuros e olhos da mesma cor, um tanto gorda e exalando bom humor, em sua mesa uma placa indicava que ela era Elisa, editora. E outra alta, com cabelos puxados para o ruivo e olhos castanhos claros, cuja se tratava da revisora e repórter, Marta. Do outro lado, uma mulher mais esbelta e completamente alheia aos movimentos, cabelos presos em um rabo de cavalo e extremamente esbranquiçados, Rosa, repórter. Ao seu lado, um homem com uma câmera na mão, alto, com cabelos negros e olhos da mesma cor, e obviamente ele era o fotografo, Ramon. Charles também era repórter e ao lado de sua mesa, havia outra com uma placa indicando meu nome, estagiário.

Ao adentrar no corredor, dei de cara com uma máquina de Xerox. Não pude deixar de sorrir, passei meus dedos por ela e sussurrei: olá, nova amiga. Dei duas batidas leves na porta a minha frente e uma voz grave respondeu um sonoro entre. Abri a porta lentamente e encontrei com Ziemer. Ou melhor, Robert Ziemer, o coordenador chefe.

E o ar saiu do local.

Ele era lindo.

Os cabelos negros no topo de sua cabeça eram completamente bagunçados e meus dedos coçaram para arrumá-los. Assim como a sola dos pés que coçaram para se aproximar rapidamente. Sua pele era extremamente branca e livre de imperfeições, a barba rala lhe dava alguns anos a mais do que de fato teria. Seu corpo era musculoso e aparentava ter tudo no lugar, ele com toda a certeza passava muito tempo em alguma academia. E seus olhos, meu Deus, eram completamente azuis de uma forma que só havia visto uma única vez...

Breves segundos de constrangimento depois, segui com passos calmos, cuidadosos em sua direção e estendi minha mão ao seu encontro.

- Erik Mahasiah, o novo estagiário.

- Ah, sim. Robert Ziemer. Sente-se, por favor.

No seu colo? Respirei fundo e sentei-me a sua frente, deixando minha pasta ao lado do pé da cadeira.

- Erik, se não me engano o senhor se encontra no segundo semestre de Jornalismo?

- Isto, eu sei que é um pouco cedo para começar um estágio. Mas a moça da RH abriu uma exceção, pois a função não caberá bem ao Jornalismo.

- Estou ciente disto. – É claro que ele estaria, mas meu cérebro nem ao menos estava funcionando direito. – Pois bem, eu só preciso que você auxilie os jornalistas com suas funções a mais e atenda aos telefonemas para repassá-los, com o tempo, vamos lhe dando mais confiança e funções melhores. O bom, é que você pode aprender com todos. – Ele sorriu e dentes brancos foram emoldurados por aqueles lábios... "Erik, comporte-se", obrigado voz, você é muito útil às vezes. Voltei minha atenção para a conversa e percebi que deveria de fato responde-lo. Puxei as mangas da minha camisa de botões para ajeitá-la de forma que ficasse mais confortável.

- Eu considero uma oportunidade ótima, obrigado. Posso começar? – Arqueei minhas sobrancelhas e ele tornou a sorrir.

- Claro.

- Com licença. – Levantei meu corpo da cadeira e estendi minha mão para ele, apertando a mesma. E sai, puxando uma quantidade maior de ar do que precisava e assim, acabei tossindo de forma leve. Quando voltei para o meu lugar, o telefone começou a tocar e ao atender, sabia que havia recomeçado da melhor forma.

O dia passou voando. Quando vi, meu horário havia sido cumprido. O lado bom de ser um estagiário, é que a carga horária é menor. Despedi-me de meus novos colegas, não há o que reclamar de nenhum deles, atenciosos e completamente pacientes. Robert havia saído para uma reunião então, apenas desci com o elevador até o térreo e sorri para a recepcionista, bati o ponto e finalmente respirei o ar puro da nova cidade.

Porto Alegre era um dos melhores lugares para se morar. Isso é uma das coisas que aprendi com o tempo. Em alguns passos, encontrei uma cafeteria precisava suprir meu vicio antes de ir para casa. Ao me escorar no ponto de ônibus, pude perceber que havia poucas pessoas passando por ali naquela hora da tarde, pelo menos isso indicava que o trem não estaria tão lotado como pela manhã.

Ao chegar à frente do meu prédio, uma voz atingiu os meus ouvidos.

- Erik. – Virei meu corpo repentinamente deixando cair às chaves e uma mão as pescou antes que tocassem o chão. Seu sorriso atingiu meu coração, como uma ligação direta o disparando.

- Pedro. – Envolvi meus braços em torno do seu pescoço e o apertei. – Quanto tempo.

- Como estava Los Angeles? – Ele sorriu ainda mais, e meu corpo praticamente derreteu.

- Graças a Deus que estou de volta, é incrível, mas não estava aguentando mais.

- Longe de todos. Está morando aqui novamente? – Ele apontou para o prédio.

- Sim, mas meus pais moram em outro bairro agora.

- Eu imaginei, fico feliz que esteja de volta. Eu vou indo nessa, tenho treino. – Eu sorri para ele e nos abraçamos, ele seguiu e não pude deixar de notar como os anos o estavam fazendo bem, havia se livrado do aparelho e estava mais definido. Seus olhos continuavam com o mesmo brilho de sempre, castanhos e seus cabelos ruivos davam um toque único.

Ele foi meu primeiro namorado.

Hoje em dia, somos tão amigos que tal fato se tornou um detalhe.

Havia duas cartas na minha caixa de correio. Uma se tratava de uma propaganda, uma bobagem.

A outra fez meu coração gelar.

"Erik, não abra a porcaria desta carta", desculpe voz, mas não posso lhe escutar no momento.

Sei que ler uma carta do hall de entrada não era algo tão normal assim, mas pouco importava, era uma carta dele. 

MOLETOM (+18)Donde viven las historias. Descúbrelo ahora