Capítulo 3

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Que droga sua mãe aparecer logo hoje com esse problema, mas só Deus sabe o que teria acontecido se ela não chegasse nesse momento.

Encostada no batente da porta se põe a pensar. Tantos anos juntos numa amizade prazerosa e amena. Carina já perdeu a conta de quantas mulheres já passaram pela vida de Théo.

Algumas duraram algum tempo, outras só uma noite. E ela curiosa que é, sempre insistiu para saber detalhes, mas Théo galante como poucos, não gosta de se gabar de suas conquistas evitando citar nomes.

E agora esse mal estar, essa vontade de socá-lo cada vez que anuncia um novo encontro. Antes se divertia com a situação, agora se irrita.

Suspira pensando do beijo. Adorou o amasso no sofá. O coração dispara diante da lembrança.

A maior parte do tempo de Carina é dedicada à filha, o restante de sua vida é o trabalho e agora aos estudos.

Não está preparada para essas emoções. E nem sabe se quer. Já se acostumou com a solidão.

Seus devaneios são interrompidos por Fátima que continua exasperada.

—Não volto para aquela casa Carina. Isso é um fato.

—Mãe você e o pai precisam sentar e conversar. Afinal são quase trinta anos de casamento e não sei quantas separações...

—Mas agora é pra valer. Seu pai não me ouve, não me vê como pessoa. Para ele sou como um móvel naquela casa velha.

—Aquela casa velha é seu lar, mãe.

—Não. Lar é um lugar onde somos felizes. Até você foi embora de lá!

A voz chorosa de dona Fátima não engana a filha. Carina sabe bem do que essa língua ferina é capaz.

—Meu caso é diferente mãe. Eu preciso do meu espaço.

—Você tirou minha princesinha de mim. Depois de todo apoio que te dei.

As coisas não foram bem assim, mas agora não é hora para se voltar a essas questões. O importante no momento é convencer a mãe a voltar para casa. Seja qual for o motivo da briga, nada como uma boa noite de sono para colocar as coisas nos eixos.

Tentando segurar um bocejo exagerado, Carina dá seu apoio filial:

—Tudo bem dona Fátima, pode dormir aqui hoje e amanhã com a cabeça leve vocês resolvem tudo!

—Não tem nada a resolver, já me decidi. Vou pedir o divórcio e pronto.

A moça coça a cabeça, quantas vezes já não ouviu esse discurso?

Percebendo a impaciência da filha, Fátima trata de esclarecer:

—Não precisa se preocupar não vou atrapalhar sua vida, só preciso de guarita aqui por uns dias, já tenho tudo planejado.

E continua:

—Sou jovem ainda, vou refazer minha vida, não quero mais me desgastar neste casamento perdido.

—Mas e o meu pai. O que ele pensa disso tudo.

—O que ele pensa? Se você conseguir arrancar alguma coisa daquela múmia, me avisa que te darei um prêmio!

Realmente Crispim é um homem estranho.

Calado, sempre na dele, não participa da vida familiar, na verdade parece nem participar da própria vida.

Fátima não se cansa de lamuriar:

—Além disso, agora ele tem a filha queridinha cuidando dele. Natália se apoderou da casa como se dela fosse. E tem seu irmão também. Realmente não me cabe mais naquela casa.

Então está explicado, pelo menos em parte, todo o estardalhaço.

Fátima nunca soube lidar com as diferenças e singularidades dos filhos. Queria ter uma família como as dos comerciais de margarina que se vê na TV, bonita e perfeita.

Sonhara para os filhos as melhores profissões, os melhores casamentos e nada saiu como planejado. Afinal eles são pessoas, seres humanos com vontades e atitudes próprias.

A vida dessa mulher se resume em decepção e Carina tem pena da mãe, mesmo que às vezes tenha que lutar para que esse sentimento se sobreponha a outros menos dignos.

—Olha mãe vamos dormir. Vou fazer uma cama no quarto de Bárbara. Nada como um dia após o outro. Amanhã verá tudo isso sob novas perspectivas.

—Bem faz você minha filha que não se deixa levar por esses homens. Por que tudo que eles fazem na vida da gente é isso: bagunça.

Se Fátima soubesse! Não fosse por sua intromissão provavelmente estaria metida numa bagunça sem tamanho agora mesmo.

Com certa dificuldade consegue colocá-la na cama. Está louca para pensar, refletir no que aconteceu antes da chegada da mãe.

***

O sono não vem e já perdeu a conta de quantas coisas se passaram por sua cabeça.

Ainda não consegue formar uma opinião sobre o assunto e não sabe o que esperar de tudo isso.

Talvez o que viu nos olhos de Théo seja apenas imaginação de uma mulher solitária e carente louca por atenção.

Afinal, foi ela que se jogou no colo dele, sem maldade é claro, mas ele é homem, de repente se sentiu na obrigação de demonstrar masculinidade.

Suspira pela enésima vez. O toque do sinal de mensagem a tira do suplício, ou melhor, aumenta-o.

Será ele?

Não. É sua irmã Natália que teve um compromisso desmarcado e que saber notícias da mãe:

Natália: E aí mana, como está a megera indomada?

Carina: rsrsrs Não fale assim da mãe, sua louca! Ela está péssima, diz que não volta mais para casa. Acho que dessa vez é pra valer.

Natália: É nada! Amanhã estará novinha em folha.

Carina: E o pai, como está?

Natália: Normal. Às vezes, só às vezes, tenho pena da megera. Não deve ser fácil viver com tanta indiferença.

Carina: Você é má. Eles são nossos pais, não acho legal falar assim deles.

Natália: Você é boa demais. Eu tenho esperanças de um dia descobrir a verdade, que sou adotada.

Carina: rsrsrs Vá sonhando... É melhor me ajudar a arrumar um jeito de resolver essa questão.

Natália: EU NÃO! Pior para você que ficou com a ela. O pai está ótimo pra mim.

Carina: haha Vá se ferrar irmã! Vou dormir, pois o sábado é o dia mais movimentado naquele salão e em todos do mundo! Conto com vc para ficar com a Babi. Nem imagino como estará o humor da mãe.

Natália: tudo bem, sem problema. Estarei de folga. E o caio está pra chegar a qualquer momento.

Carina: Ótimo! Não vejo a hora de o termos de volta. E o encontro que melou foi com o tal advogado?

Natália: Ainda não, mas esse não demora. Melhor irmos dormir bjos.

Carina: tchau. Boa noite.

Ela percebe que a irmã continua desconversando sempre que o assunto recai sobre o seu novo 'affaire'. E tudo que ela espera é que não venha mais confusão por aí.

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