O garoto mais corajoso

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Fui eu que ganhei o melhor presente do mundo. De todo o mundo! Eu só fiz um desenho para o Céu, mas ela fez a coisa mais perfeita de todas: me abraçou. Os braços pequenos me envolveram e me puxaram com força. O corpo do céu ficou colado ao meu.

Aquilo era muito, muito, muito bom.

— Droga! — A reclamação de Lydia fez com que eu a soltasse. Não queria soltar. Queria continuar perto. Muito perto. Mas tive medo de irritar o Paraíso.

— O que foi? — Sussurrei confuso.

— Eu gosto de você.

Sorri.

— Também gosto de você, Céu!

Ela abaixou a cabeça e negou com o rosto. Mas não consegui me importar, ficar preocupado. Ela me abraçou e disse que gostava de mim! Não tinha como me incomodar com nada.

— Não é desse jeito que você está falando... — Sua voz era tão linda, que não conseguia encontrar sentido em suas palavras — Eu gosto mesmo de você. — Tentei responder, porém, ela negou com a cabeça e falou antes de mim: — Vem ler para mim!

Mais uma vez, sorri. Era raro viver momentos como aquele, em que me sentia totalmente feliz. Por isso, continuei sorrindo enquanto a observava ir até a cama e se ajeitar ali, com o cabelo ainda molhado do banho.

— Está com sono? — Perguntei mesmo já sabendo a resposta.

Ela concordou com a cabeça e sorriu sem mostrar os dentes. O Paraíso ficava ainda mais perfeito quando sorria daquela forma. Por isso, demorei tempo demais para pegar um livro para ler. Fiquei muito tempo só olhando para o Céu. Admirando.

Quando peguei o livro, hesitei por um instante, sem saber se sentava no chão ou se ficava ao lado do Céu, na cama. Ela percebeu minha dúvida, pegou minha mão e me puxou. Puxou para que eu ficasse ao lado dela. Bem perto. Muito perto.

Lydia amava que eu lesse para ela antes de dormir e eu amava ler.

Ficamos bem espremidos na cama apertada, deitados um de frente para o outro. Comecei a ler, continuando a história de onde tinha parado e só larguei o livro ao lado da cama quando ela dormiu.

Dormi.

Nunca gostei de sonhar. Nunca! Sonho é aquilo que você vê enquanto está dormindo. É horrível! Eu sempre tenho sonhos ruins. Sempre. Amo quando durmo e não lembro de ter sonhado nada e odeio quando lembro. Odeio.

Daquela vez, eu lembrei e foi tão horrível que quando acordei, não consegui mais voltar a dormir. Foi um sonho muito, muito real e apavorante. Daqueles tipos de sonho que mais odeio.

Alex diz que o nome disso é pesadelo. Ele briga quando eu choro por causa de um pesadelo.

O Céu não acordou. Então levantei com cuidado da cama. Muito, muito cuidado. Não fiz barulho, fiquei quietinho. Desenhei e esperei que ela acordasse sozinha. Isso demorou demais, no entanto, quando o Paraíso acordou, escondi os desenhos e fingi que tinha acabado de acordar.

Isso aconteceu muitas vezes seguidas. Quase não conseguia dormir. Acordava sempre e esperava, impaciente, o Céu acordar. Olhar como ela dormia ajudava um pouco, porém, não impedia os sonhos. Pesadelos.

O pesadelo era quase sempre o mesmo. Horrível. Muito horrível. Tenho pesadelos parecidos desde... sempre. Sempre tive.

Lydia perguntou uma vez porque eu estava com tanta olheira. Não respondi porque não sabia o que dizer. Não queria que ela soubesse que eu tinha medo de dormir.

Alex diz que sou medroso. Burro. Só gente estupida tem medo de pesadelo. Acho que ele tem razão. Afinal, existem três pessoas no mundo e eu sou o mais medroso, mais burro.

Eu estava tentando ser forte. Escondendo do Céu e sem nunca chorar. Não queira deixá-la com mais medo ou mais triste. Ela parecia melhor, não chorava tanto, nem brigava tanto. Não podia estragar isso.

Mas não aguentei quando tive o pior pesadelo. O mais real.

Acordei com o som de gritos, sentindo a pele melada. Abri os olhos, assustado e demorei para reconhecer os olhos verdes do Céu bem próximos de mim. Demorei ainda mais para perceber que os gritos eram meus.

— Desculpe — Sussurrei perdido, aflito — Desculpe.

Havia um som agudo em meus ouvidos que me impedia de ouvir qualquer coisa. Sentei na cama, desajeitado. Sempre desajeitado. Ergui os braços trêmulos e vi o brilho de suor que me cobria.

Mãos pequenas, perfeitas, foram até meu rosto. Eram as mãos do pequeno pedaço do Céu. Encolhi os ombros e abracei a mim mesmo com força. Tentei olhar para baixo, mas as mãos do Paraíso me impediram.

— Stiles... — Meu nome só parecia bonito quando ela o pronunciava — Com o que você sonhou?

Fechei os olhos. Neguei com a cabeça. Senti meus lábios se projetarem em um biquinho e por isso, deixei as lágrimas escaparem dos olhos. As imagens do pesadelo não me deixavam e ainda por cima, o Céu ia me achar ridículo. Medroso.

— Stiles? Por favor, não chora!

Mesmo ouvindo aquele pedido na voz mais linda no mundo, continuei chorando. Suas mãos não saíram de mim. Pelo contrário, o aperto de seus dedos aumentou.

O toque era muito bom. Maravilhoso. Era horrível desperdiçar algo tão bom por causa de um maldito pesadelo. No entanto, o que mais me assustava era que o pesadelo não era apenas minha imaginação. Era uma lembrança.

Eu fechava os olhos, tentava dormir e então, via repetidas vezes Alex fazendo coisas horríveis.

— Ei, shh, Stiles! — Tentei focar os olhos nela, no entanto, era difícil por causa das lágrimas.

— E-está com raiva de mim? — Perguntei com receio, ainda me encolhendo.

— Não, claro que não! Por que eu estaria com raiva?

A voz do Céu era tão linda, fina. Queria poder ouvi-la para sempre.

— Porque eu sou medroso — Respondi fungando e considerando a ideia de sair cama.

Lydia começou a enxugar minhas lágrimas. Senti suas mãos pequenas esfregando nos lugares em as lágrimas grossas escorriam. Nunca ninguém tinha feito isso comigo.

— Você é o garoto mais corajoso que eu conheço! — Apesar das palavras impossíveis, ela parecia tão sincera. Lydia não mentiria, não é? Ela veio do Céu.

— Jura? — Perguntei incrédulo. Era difícil acreditar naquilo.

— Juro!

Meu corpo parou de tremer, mas ainda não conseguia parar as lágrimas que desciam sobre o rosto. Confuso, vi Lydia aproximar o rosto de mim. Fiquei parado, vendo o quanto ela era linda. E isso me distraiu do pesadelo.

Não entendi porque ela aproximou tanto, tanto o rosto. Porém, gostei disso. Gostei da sensação de vê-la tão de perto e de sentir o cheiro suave de sua pele.

Então, enquanto ainda chorava e a observava, o Céu fez algo ainda mais confuso: encostou a boca em meus lábios.

O Pequeno pedaço do céuOnde histórias criam vida. Descubra agora