DIÁRIO DE UM URSO || PARTE 2

285 35 2
                                    

Algumas horas mais tarde, Olioti já estava em seu posto no telhado de um prédio próximo ao hospital onde o senhor Feuerschütte estava. O prédio era bem do lado do hospital, então ele tinha uma visão previlegiada da janela do quarto do doutor, que coincidentemente tinha uma larga janela de vidro. Ele xingou baixinho enquanto se estabelecia em seu posto. Claro que era uma vantagem para ele já que tendo uma boa visão de quem ele precisava proteger, seu trabalho ficaria mais fácil, mas isso também significava que quem quer que venha atrás do rapaz também o avistaria facilmente.

— Claro que nada é fácil nessa vida — resmungou baixinho, observando o rapaz finalmente se mover na cama e acordar assustado. — Oh-oh.

Doutor Feuerschütte permaneceu imóvel por um tempo até que veio o momento que Olioti mais odiava presenciar. O rapaz começou a chorar, e depois de poucos segundos o choro ficou tão alto que ele conseguia ouví-lo de onde estava no telhado. Sentiu um aperto terrível no peito e teve que juntar todas as suas forças para não dar meia volta e sair dali. Se sentia um intruso assistindo aquele momento de vulnerabilidade daquela forma clandestina, e o seu desconforto só foi amenizado pelos pais do rapaz entrando no quarto e correndo para reconfortá-lo. Enfermeiras logo os seguiram e começaram a averiguar os aparelhos que estavam enlouquecidos devido ao seu desespero. Isso seguiu por longos minutos até que sedativos foram aplicados à medicação e ele voltou a dormir.

Isso se repetiu diversas vezes durante a semana. Feuerschütte acordava e começava a chorar, e as vezes sedativos não eram usados para se evitar sobredosagem, mas Olioti preferia que pudessem colocá-lo para dormir como nas outras vezes. Chorar era a única coisa que ele fazia. Não comia, não falava, e durante aquela semana, Olioti passou a pensar que o dano fora irreversível.

Até que no fim da semana, tudo mudou.

Doutor Feuerschütte não chorava mais. Passou a aceitar as refeições que lhe eram trazidas e a conversar com seus pais, que estavam tão confusos quanto Olioti. Isso o preocupou. Ninguém supera algo assim tão rápido, principalmente da forma que aconteceu, então estava claro que o psicólogo estava fingindo; provavelmente para não preocupar os pais. Olioti não conseguiu evitar a inquietação que passou a sentir perante aquilo, se sentia culpado pelo que tinha acontecido. Se ele não tivesse enrolado com Scarlett e tivesse a matado antes que ela pudesse fugir, aquele rapaz não estaria passando por nada disso agora. Sempre fora tão competente... era difícil engolir uma falha dessa, principalmente quando acabou afetando outra pessoa de uma forma tão devastadora.

Continuou a observá-lo pelo resto daquela semana até que ele recebesse alta, e durante esses dias a sensação que tinha alguém o observando passou a pertubá-lo. Se manteve alerta — apesar de que as vezes ele se distraía enquanto observava Doutor Feuerschütte, não entendendo bem o por quê — e assim que ele saiu do hospital com os pais, Olioti os acompanhou de longe.

A viagem não foi muito longa e o caçador tentou ser o mais cauteloso possível para que não parecesse que ele os seguia — afinal de contas, seu carro era branco e chamava um pouco de atenção.

Minutos depois, chegaram em um prédio e desceram. Olioti logo arrumou um lugar para estacionar e manter vigia. Nessa quadra residencial seria mais difícil ele ficar em cima de outro prédio e não ser notado, então optou apenas por prestar atenção por fora. Tirou equipamentos que o permitiriam identificar qualquer intruso que tentasse dar uma de espertinho fora de seu campo de visão e se aconchegou no banco. Seriam longas e entediantes horas, mas era o mínimo que podia fazer pelo doutor depois de tudo o que tinha acontecido.

Algumas horas se passaram e tudo parecia tranquilo, até que ele avistou os pais do Doutor Feuerschütte saindo do prédio e entrando no carro. O caçador franziu enquanto assistia o casal dirigir para longe. Achava que eles ficariam com o filho, mas pelo pouco que tinha visto, imaginou que Feuerschütte tinha os assegurado que estava "bem" e que precisava ficar um pouco sozinho. De certa forma era uma coisa boa já que caso acontecesse algo seriam menos pessoas para ele se preocupar, mas também era algo arriscado.

Guardião por DestinoWhere stories live. Discover now