Capítulo 1

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- No seu próximo aniversário, vamos para um lugar melhor, eu juro – meu pai disse.

- Tudo bem – murmurei, com um sorriso brincando no canto dos lábios. Tudo aquilo estava irreverente demais. Se nos primeiros dias, eu estava achando tudo muito estranho, a essa altura as coisas que eu via só me faziam rir. Era uma cidade no interior de Minas Gerais, conhecida por ser um lugar "místico". O que de mais místico eu tinha visto até o momento eram pessoas com roupas bregas que pareciam ter saído da revolução hippie. – Olha aquilo ali.

Apontei para um casal com calça boca de sino e bandanas na cabeça. Bandanas! Eles estavam de frente para uma árvore aparentemente inofensiva, circundada pelo que pensei serem esculturas de anões. Meu pai riu, estacionando o carro logo em seguida.

- Vai lá, vamos tirar uma foto sua! – ele disse, muito empolgado pro meu gosto. Permaneci parado, com a porta fechada, olhando para ele como se ele tivesse me chamado pra assaltar um banco.

- Não me olha com essa cara. – Ele disse. – Amanhã você completa 21 anos. Este é oficialmente seu ultimo dia como um adolescente de verdade. Vamos aproveitar hoje e amanhã a gente finge que isso nunca aconteceu.

Eu relutei, mas meu pai abriu a porta e puxou-me pelo braço. Assim que o casal hippie deixou a árvore, me posicionei de joelhos ao lado de um anão pavoroso. Mais de perto, percebi que não eram anões. Eram gnomos, com orelhas pontudas e olhos vermelhos.

- Credo – murmurei.

- Olha pra cá e dá um sorriso... Ou o que for.

Encarei a lente das câmeras e coloquei meus dois braços na frente do corpo, como se estivesse assustado com a criatura ao meu lado. Vou me arrepender disso mais tarde.

- Ficou ótima – ele disse, olhando a foto e rindo.

- Sua vez – falei, indo até ele e pegando a câmera.

- Minha vez? Não, você está...

- Vai lá! – exclamei. A contragosto, ele foi até a árvore e estacou ao lado do gnomo. Apenas franziu a testa e fez uma expressão divertida com o rosto. Tirei a foto. Voltamos para o carro e prosseguimos em nossa volta pela cidade. Aquela viagem tinha sido meu presente de aniversário. Me arrependi um pouco de não ter escolhido um destino mais... Mais comum, como Porto Seguro ou talvez o Rio de Janeiro, mas escolhi uma viagem por algumas cidades históricas no interior de Minas Gerais. Já estávamos na estrada há três dias. Passamos por duas cidades e naquele momento estávamos em São Tomé das Letras, conhecida por seu misticismo. Pense que seria um destino interessante, e eu não estava errado. A maioria das construções na cidade era feitas de pedra, o que causava uma aconchegante sensação de que a cidade havia se perdido no tempo.

Seguimos por mais alguns quilômetros desbravando a cidade. O sol estava alto no céu quando nos deparamos com o que parecia ser uma excursão pela cidade. Uma pequena van branca com alguns decalques com o nome da cidade. Eles pararam em frente a uma Igreja de Pedra, pela qual nós ainda não tínhamos passado. Uma quantidade inacreditável de turistas saiu de dentro da van e correu até a igreja. Meu pai e eu resolvemos nos juntar àquela improvável multidão. Caminhamos até a igreja e nos misturamos, tirando foto de tudo o que víamos. A Igreja era realmente um lugar impressionante, completamente feita de pedra, o que não deveria ser nenhuma surpresa devido ao nome. Parecia uma construção saída diretamente dos recônditos da Escócia para uma cidade no interior de Minas.

Estávamos tirando fotos da entrada da igreja quando o guia turístico nos informou que o local era trancado e não poderíamos entrar. A multidão reclamou em uníssono, o que foi quase engraçado de se assistir. Olhando melhor para aquela multidão, percebi que parecia ser uma grande família. Eram cerca de dez pessoas, seis adultos e quatro crianças que não paravam um segundo quietas em um mesmo lugar, correndo e empurrando umas as outras. Tão logo a decepção de não poder entrar no lugar sagrado passou, já estavam se empurrando novamente.

TRAVELLER - Além do TempoOnde histórias criam vida. Descubra agora