A última poderosa
Queimados - Rio de Janeiro, 2038.
Eram meio dia e quarenta e cinco. Já passava muito do tempo estimado que sua mãe dera a Margarida para voltar para casa. Sua mãe era extremamente possessiva, e Margarida havia saído para ir ao mercado às dez da manhã, e por mais que o único mercado do bairro estivesse completamente lotado por causa do feriado do dia das mães essa desculpa não colaria com sua mãe. Até porque Margarida já havia saído do mercado a tempo.
- Ah droga! - Margarida estava correndo com as bolsas pesadas de compra.
Ela achava que era obrigação de seu padrasto ir fazer as comprar e trazer o peso, mas este não movia uma palha em relação a isso, e sua mãe, que namorava com o homem em uma relação conturbada a mais de quinze anos achava isso perfeitamente normal. Ele já trabalhava e trazia o dinheiro, Margarida não podia reclamar, deveria fazer algo para ajudar, arrumar a casa, cuidar do irmão e ir fazer compra várias vezes ao dia eram uma "pequena" ajuda que a garota, já acostumada com o trabalho pesado, fazia para ajudar sua mãe.
- Ah não, ela vai me matar! - A garota parou em baixo de um bar para descansar os braços marcados pela alça da sacola e secar o suor da testa.
A única coisa que fazia ela ficar menos cansada, ou no mínimo esquecer que estava cheia de peso era o celular que ganhara de seu namorado, o qual baixou várias músicas novas para ela ouvir. Então sempre que estava nessa adrenalina ela colocava deus fones e ouvia sua banda antiga favorita, Supercombo.
Com os fones no ouvido, sacolas no braço e suor na testa ia Margarida, atravessando as ruas para chegar logo ao morro de sua casa, neste havia uma árvore onde poderia descansar na sombra antes de subir o morro.
Quando finalmente chegou à sombra da tão esperada árvore ela largou as bolsas esquecendo da briga que compraria com sua mãe por causa da demora.
- Margarida! - A jovem agora praticamente adulta estremeceu ao ouvir a voz de seu irmão menor achando que sua também estaria com ele.
- Jorge... O que você está fazendo aqui rapazinho? - Disse Margarida aplicando uma bronca tentando contornar a situação.
- Mamãe mandou eu ir na casa da minha outra avó.
- Até parece, sozinho?
- Não, era para eu ir com você, mas você está a um século na rua... Estava na casa do Matheus mocinha? - Disse o pequeno garoto de dez anos fazendo um olhar de um dos clássicos da época de sua mãe, Sherlock Homes.
- Não seu bocó, eu estava na casa da Lali.
- Fazendo o quê? Você deveria ter ido direto para casa!
- Ela acabou de ser operada! E eu tinha que visitar ela, somos amigas a anos! Mas mamãe jamais entenderia...
- Claro que não, ela não deixa você ir a lugar nenhum... - Disse o garoto terminando a frase com uma risada gostosa que com certeza Margarida sentiria saudade - A conversa está boa, mas eu tenho que ir na minha avó!
- Jorge você deveria subir e esperar eu voltar pra te levar comigo.
- Não, de boa, tudo sob controle! - Disse o garoto dando um joinha para a irmã - Eu tenho que pegar o liquidificador emprestado, mamãe vai fazer suco, lembra que eu quebrei o outro sem querer?
- Lembro, cadê seu pai? Por que ele não vai?
- Ele acabou de chegar do trabalho, e você sabe que ele não vai ir buscar nada.
- Quer saber, se você me ajudar com as compras eu vou com você, aí na volta você só trás o liquidificador.
- Tá legal! - Disse o pequeno grande rapaz abraçando a tão amada irmã.
Ela dividiu as bolsas com a criança e foram na avó do pequeno, mas no meio do caminho algo mudaria completamente a vida dos dois.
Na hora de voltar a jovem estava com as compras nos braços novamente e o pequeno estava com o liquidificador. Eles pararam para esperar os carros passarem antes de atravessar.
- Mag, vamos logo, estamos aqui à horas!
- Calma, está cheio de carros passando nessa rua, deve ser por causa do dia das mães.
- Eu vou atravessar! Não aguento mais esperar!
O rapazinho colocou o pé na rua e Margarida não o conseguiu segurar por causa das bolsas. Ela quase teve uma parada cardíaca.
- Seu ridículo, eu vou matar você! - Disse a irmã furiosa vendo o irmão intacto do outro lado da rua.
- Viu, eu sei atravessar.
O garoto ia passar novamente pela travessia perigosa, mas dessa vez foi surpreendido, um ônibus que vinha com muito mais gente do que suportava perdeu o controle e capotou.
- JORGE! - Margarida perdeu o chão.
Só teve tempo de correr até onde o ônibus havia parado de capotar, e viu seu irmão agarrado nas ferragens do que sobrou do ônibus.
E pela primeira vez, sentiu dentro de si uma dor muito mais profunda do que tudo que já havia sentido.
- NÃO! - Em um desespero, em um misto de lágrimas e pânico ela gritava - Não... Por favor... Jorge, me responde bebê!
Nem o abandono de seu pai, nem a traição de seu ex que tanto amava e nem a morte de sua tia que era como a própria mãe havia abalado tanto a moça quanto esse choque.
A chocou tanto a ponto de movimentar suas células mais escondidas, as células que haviam sido adormecidas assim que nascera estavam agora à flor da pele, trazendo à tona o poder.
Sua dor era tão grande que Margarida nem se deu conta de tudo que começou a acontecer em sua volta, seus olhos começaram a soltar raios verdes de poder, suas mãos queimavam mas ela achava que era de tanto pressionar o corpo gelado de seu pequeno irmão.
Mas claro que não era esse o motivo, ela estava despertando seus poderes. Em volta dela criou-se uma enorme bolha de luz e poder atômico. Essa bolha foi crescendo e acabou por explodir.
Fazendo uma grande cratera em volta dela, do ônibus que agora não passava de restos de ferragem e corpos, mortos e queimados, os que não foram pulverizados claro.
Ela continuou chorando, agarrada ao irmão, eram de pais diferentes, mas se amavam como se o mesmo sangue corresse nas veias dos dois, em meio ao caos que era sua vida o pequeno irmão era o seu porto seguro.
- Jorge, me responde... Por favor irmão, responde... - O menino estava molhado por suas lágrimas.
De repente os moradores do bairro começaram a se aglomerar em volta por causa do acidente e viram a garota, com lágrimas e raios saindo dos olhos. Emanava fogo de seu corpo e todos estavam vendo.
- Por favor, chamem os bombeiros! Meu irmão está morrendo! - Ela gritava enquanto todos apenas olhavam.
- Ela é perigosa, não cheguem perto! - Disse uma mulher pegando seu pequeno filho no colo.
- Chamem a polícia! - Dizia outra - Ela causou o acidente!
Não, a culpa não era dela. Ela apenas teve o infortúnio de ter uma grande explosão genética.
- Por favor me ajudem... Meu irmão está ferido... Por favor me aju... - Antes de terminar de falar uma bola de fogo feita pela desintegração dos átomos que emanavam de seu corpo foi lançada em uma das pessoas que estavam à sua volta.
Ela era uma bomba humana, na hora que outra enorme bola de fogo saiu de sua mão atingindo um poste e derrubando-o ela entendeu a gravidade da situação.
Seus olhos estavam arregalados e seu coração disparado. Ela estava com medo... De si mesma.
As pessoas a volta com repulsa a deixavam com ainda mais medo.
- Por favor, eu preciso de ajuda! - Ela continuava implorando por ajuda, de repente sentiu o mundo todo girar e desmaiou.
Um homem qualquer acertou a cabeça dela com um pedaço de madeira.
Ela ficou com a visão apagada, igual a sua memória que foi perdida.
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Poder
Science FictionOlhe para nós, mas olhe nos mínimos detalhes, repare em nossos pêlos, veias, artérias e células. Veja não só nossa aparência, veja nossa genética, e nela encontrará poder.