V. Laços Familiar

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Eu estava instavelmente instável. As semanas trancada em meu quarto aumentaram-se para tantas que eu mal pude lembrar-me de quanto tempo passara ali, apenas observando os desenhos sobre as paredes brancas. Meus olhos cercavam lentamente cada detalhe de meus rabiscos, uma arte oculta, sem valor algum. Tão desatenta, não reparei o momento em que minha mãe havia entrado no quarto para recolher algumas roupas sujas jogadas pelo quarto.

— Hatter, mas que bagunça absurda. — Disse enquanto retirava minhas meias de cima da cômoda bagunçada. Ela não estaria assim a algumas semanas atrás, eu simplesmente havia deixado de me importar de arruma-la a pouco tempo. Sinceramente, eu já não me importava com mais nada.

— É Hayden... — Murmurei, com os olhos centrados ao carpete cinza, combinando com a decoração dos móveis do quarto.

Vi a mesma continuar sua inspeção sobre o quarto, abrindo algumas gavetas de minha cômoda e retirando algumas roupas sujas de lá. Estranhei no momento em que ela minimizou seu tempo, pegando algo delicadamente atenta. Queria eu saber o que era, porém, tudo que já se encontrava na minha gaveta havia sido colocado lá por mim. Eu sorrateiramente sabia.

Arregalei então os olhos assustada, e segui até ela. Reparei em suas mãos um pacote pequeno com algum tipo de planta em pedaços pequenos como se houvesse sido esmagada. Sua atenção sobre a planta esvaiu-se no momento em que em ela olhou enraivecida para mim.

— O que isso faz na sua gaveta, Hayden? — Agradeci pela primeira vez ela dizer o meu nome da maneira certa, mas aquele não era um bom momento.

— E-eu não sei. — Falei com tanto medo que mal pude escutar minha própria voz. O que seria algo naquele pacote?

Percebi Dylan encostado no batente da porta de meu quarto, com os braços cruzados e um sorriso vingativo ao canto dos lábios. Teria sido ele, com toda certeza.

Após o acontecimento, minha mãe levou-me para algum lugar que mais parecia uma clínica. Sentei-me diante de uma mulher que dizia ser confiável. Minha mãe disse que eu deveria me abrir com ela e que ela seria uma boa mulher, mas eu não via nada de bom em seu olhar. Àquela altura, ninguém mais era confiável, pois todas as pessoas me pareciam ruins.

Escutei elas dizerem algo sobre os acontecimentos de todos esses dias e principalmente sobre o que minha mãe havia encontrado em minha gaveta. Ela dizia a todo instante o nome "maconha" para nomear a planta dentro do pacote. Tudo era muito estranho pra mim. E eu apenas queria voltar ao meu quarto onde eu me sentia segura.

— Tudo bem, Hayden? — A moça perguntou gentilmente.

Permaneci em completo silêncio. Na sala continha apenas eu e ela. Aquele local se não me engano era chamado de psicólogo. Ouvi falar que as pessoas se expressavam e diziam tudo o que estavam sentindo, e então, eles te ajudavam. Mas eu não queria ser ajudada, eu não precisava.

Ou talvez, imaginei que não precisasse.

— Tudo bem, eu sei que é complicado. Você não me conhece. As pessoas costumam ser ruins, não é? — Ela parecia ler minha mente, mesmo assim, permaneci em silêncio. — Sua mãe me contou sobre os incidentes na escola, você quer falar a respeito? — Fiz que não com a cabeça. Parecia que as pessoas queriam sempre estar me lembrando daquilo, em uma tentativa constante de tentar me magoar. — Hayden, para que eu possa te ajudar você precisa me contar o que está sentindo.

— Eu não preciso de ajuda. — Falei friamente. Eu não era assim, aquela Hayden não era eu. Eles haviam me tornado daquela maneira de algum modo que nem mesmo eu entendia.

— Por que você acha que não precisa? — Em momento algum ela alterou seu tom de voz.

— Quando você percebe que o mal já te consumiu, você não pode lutar contra isso. É um abismo sem fim, e as pessoas se submetem àquele tipo de situação. Todo sorriso esconde uma grande dor, seja ela grande ou pequena, ela deve de alguma maneira ser respeitada. Você, me perdoe, como todas as outras pessoas, não esta respeitando minha dor.

— Acredita mesmo que não há alguma maneira de ser ajudada? — Ela era sempre serena e gentil. Porém, não me convencia.

— É difícil subir à superfície quando você já está se afogando. Assim como é difícil se recuperar quando está ferido. Eu não posso ser ajudada. Tenho que salvar à mim mesma.

Ela se manteve em silêncio, escrevendo sempre em sua prancheta. Parecia anotar tudo o que eu dizia, mas porquê? Reparou cautelosamente em minha inquietude, enquanto eu balançava minhas pernas rapidamente. Ou quando pressionava minhas mãos contra o sofá, e por muitas das vezes sentava sobre elas. Eu apenas não queria estar ali. Eu não estava confortável.

Após a sessão finalmente acabar, fui direto para casa. No caminho eu e minha mãe não trocamos palavras como de costume. Aquele silêncio antes poderia parecer estranho e sensato, mas naquele momento, o silêncio era tudo no qual eu precisava.

Assim que cheguei em casa, subi as escadas depressa. Reparei minha mãe observando-me decepcionada e aquilo não poderia doer menos. Eu simplesmente era o mal da família, o principal motivo de tudo ser como era. As brigas, o distanciamento... Todo o conflito entre eles eram causados pela minha existência de uma maneira ou outra.

Ao invés de ir direto ao meu quarto, onde havia passado a maioria dos meus dias, segui até o escritório do meu pai por uma curiosidade ao encontrar a porta aberta.

Abri lentamente a porta entreaberta ouvindo o grunhindo alto e alarmante. Meu pai estaria em seu trabalho, e provavelmente avoado e atarefado, esqueceu de trancar seu escritório como sempre fazia. Entrei lentamente ouvindo meus passos cautelosos sobre a madeira encerada do chão, fazendo um ruído baixo.

Aproximei-me de uma estante de madeira - combinando com todos os moveis ali presentes -, e passei as mãos delicadamente sobre os livros e pastas que haviam guardados ali. Entre eles, uma pasta dourada chamou minha atenção, fazendo minha curiosidade falar mais alto. Retirei a pasta de lá, e coloquei-a sobre a mesa grande e cheia de gavetas que se encontrava próxima à estante.

Sentei-me sobre a poltrona alta de coro do meu pai, a apoiei-me sobre ela de joelhos para poder alcançar a mesa alta. Abri lentamente a pasta e com pouca dificuldade, consegui ler algumas coisas que estavam escritas. Palavras difíceis invadiram minha mente dificultando minha compreensão, mas com o pouco, podia entender.

Coloquei meus dedos em frente a cada palavra que lia para acompanhar a leitura e não me perder em meio a tantas outras palavras. E assim que meus olhos cercaram uma certa frase, semicerrei o olhar depressa. O que estaria escrito ali, não parecia real. Não poderia ser.

O que você pensaria à respeito de uma leitura na qual identificaria ser sua vida? E me diz o que você pensaria se essa leitura dissesse que tudo o que você antes viveu foi uma verdadeira mentira?

Naquele dia, eu havia descoberto que meu pai, não era verdadeiramente meu pai. Eu não sei como, onde e quando, mas todos eles sabiam disso e ninguém me contou. Talvez esse fosse o motivo para Dylan me odiar tanto, eu não era sua família. E ali tudo passou a fazer mais sentido, eu era o mal por ser fruto de algo ruim. Eu era o motivo da minha família estar em catástrofe. A dor que invadiu meu peito foi ainda maior do que eu esperava. Eu simplesmente senti como se o único chão ao qual ainda me sustentava, havia caído sobre meus pés. Pois ele realmente havia desmoronado sobre mim.

A propósito, eu era mesmo a Hayden?

Uma Chance Pra Recomeçar [CONCLUÍDO]Onde histórias criam vida. Descubra agora